Houve uma época nos grandes centros urbanos brasileiros que era o máximo usar peruca como acessório de moda. Qualquer álbum de casamento dos anos 70 pode comprovar isso. As noivas quase sempre aparecem com esplendorosas melenas artificiais. Existiam até lojas especializadas, como a Le Postiche (O Postiço, em francês), do cabeleireiro Antonio Rastaíno. Num espaço amplo na Praça da República, em São Paulo, ele atendia a nata da sociedade paulistana. Mas tão rápido quanto chegou a onda da peruca foi embora. Para não perder dinheiro, Rastaíno, que fabricava os próprios produtos, aproveitou o maquinário para fazer bolsas e carteiras de couro. Nascia ali a maior rede brasileira de lojas desse setor, com receitas anuais de R$ 130 milhões. Nos últimos 25 anos, no entanto, a clientela da Le Postiche nada teve a ver com as senhoras refinadas que compravam as perucas de seu fundador, em passeios vespertinos pelo centro da cidade. O grupo moldou sua história sendo essencialmente popular, devoto da filosofia do ?bom e barato?. Mas isso está ficando para trás. Na quarta-feira passada, a empresa que um dia vendeu bolsas amontoadas em bancas, apresentou a sua coleção de verão num badalado desfile à la SP Fashion Week.

?Os nossos planos de expansão passam necessariamente pela mudança do perfil do cliente. Queremos vender para a classe A e B?, diz Alessandra Restaíno, diretora comercial da Le Postiche. A virada começou quando ela e a irmã Daniela tomaram a frente dos negócios, três anos atrás. O primeiro passo foi rever o conceito arquitetônico das lojas. Saíram as bancas eternamente desarrumadas e entraram prateleiras de vidro e manequins. Com os produtos organizados por categorias (masculino, feminino, jovem, infantil e viagem), os espaços ficaram mais clean e ganharam uma cara moderna. Em seguida, para fazer o novo público ao menos entrar nas lojas, as irmãs foram buscar grifes do setor, como Benetton e Samsonite. Depois, reduziram o número de fornecedores. Menos parceiros, só que mais comprometidos com a empresa ? esta foi a receita para aumentar a qualidade dos itens à venda. Por fim, Daniela esboçou o projeto de um tímido departamento de estilo, cuja única funcionária era ela mesma, encarregada de buscar em revistas estrangeiras ?inspiração? para produtos atuais e exclusivos. ?O tíquete médio de compra já saltou de R$ 50 para R$ 80, descontando a inflação. E o faturamento cresceu 128% de 2000 para cá?, comemora Alessandra. ?E só percorremos a metade do caminho.?

A outra metade é um tanto ousada. A empresária pretende abrir 600 lojas licenciadas nos próximos seis anos (atualmente existem 113, das quais 51 são próprias) e ampliar o mix para calçados, óculos e relógios. Haja fôlego para tamanha empreitada. Alessandra não diz quanto o plano vai custar, mas garante que está bem preparada. Prova disso, diz ela, foi o desfile da semana passada. A produção ficou a cargo do estilista Lorenzo Merlino, que assina uma coleção de bolsas vendidas somente nas lojas da marca. Para ele, a Le Postiche é a prova de que mesmo as empresas bem-sucedidas não podem achar que o jogo está ganho e relaxar. ?Perdendo dinheiro eles não estavam. Mas descobriram que podiam ganhar muito mais se deixassem para trás aquela imagem popular?, afirma, orgulhoso
por ter vendido 100 peças para a tradicional Barney?s, de Tóquio. Além de Merlino, Alessandra e Daniela contrataram os serviços da consultora de estilo Christiana Francini. Ela será responsável pela consolidação da linha de produtos com a marca própria da Le Postiche. Para isso, ao lado de Daniela, viaja para os principais centros da moda mundial (Nova York, Londres, Paris e Milão) buscando tendências. ?Também paramos de comprar coleções prontas dos fabricantes. Agora, nós é que dizemos o que e como eles devem fazer?, conta Alessandra. Vovô Antonio, que aos 92 anos continua dando as suas tesouradas na cabeleira alheia, não cansa de repetir: ?Essas minhas netas vão longe?.