Se a estratégia global da multinacional francesa Legrand fosse comparada a uma instalação elétrica, poderia ser um quadro de força, com disjuntores que mantêm a corrente funcionando e só desarmam em caso de curto-circuito. É esse o caso da operação da companhia na Rússia, que está sendo desligada devido a invasão de Vladimir Putin à Ucrânia. Em outros mercados, porém, os botões estão alternando on e off de acordo com a voltagem dos negócios. A companhia que registrou faturamento de 8,4 bilhões de euros no ano passado (alta de 20% sobre 2021) vai apagar as luzes de sua fábrica em Diadema, na Grande São Paulo, e redistribuir a produção que era feita ali para a planta de Caixas do Sul (RS), uma das quatro da que funcionam no País — as outras são em Manaus (AM) e em Aracaju (SE).

Em paralelo a esse liga e desliga, a empresa acaba de adquirir a Clamper, fabricante mineira líder no segmento de proteção contra surtos (com equipamentos voltados para prevenir danos em sistemas elétricos), cujo faturamento anual é da ordem de 40 milhões de euros. Oficialmente, o valor do negócio não foi divulgado, mas fontes próximas à empresa afirmam que foram pagos R$ 180 milhões por 69% do capital da Clamper. Especializada em sistema para placas fotovoltaicas, a empresa emprega 600 funcionários em Lagoa Santa (MG), a 35 quilômetros de Belo Horizonte. Presidente da Legrand Brasil, o italiano Fabio Sala afirmou à DINHEIRO que a compra está alinhada à estratégia global de aquisições. Foram sete no último ano. “Assim o grupo fortalece ainda mais sua liderança no mercado brasileiro em segmentos de rápido crescimento e canais de distribuição”, disse. Com a aquisição da Clamper, a Legrand estima superar a marca de R$ 1 bilhão em vendas pela primeira vez no Brasil.

PATENTES O apetite por aquisições se deve à estratégia de ampliar o portfólio que já inclui as marcas Bticino, HDL, Lorenzetti Eletric e Daneva, além das linhas de produtos Pial, Cemar e Cablofil. Com atuação em 23 países, a francesa acumula 30 mil clientes em carteira, 50 milhões de itens no portfólio e mais de 900 produtos desenvolvidos — de iluminação ao setor de óleo e gás. Suas 4 mil patentes requeridas até o ano passado cobrem 1.450 sistemas e tecnologias para infraestruturas prediais.

Segundo Sala, as mudanças da Legrand Brasil são no sentido de otimizar os recursos industriais. “Estamos investindo em aquisições no País há duas décadas. A lógica é de nacionalizar ao máximo os recursos produtivos”, disse o executivo. “Em Diadema nós temos uma fabricação específica de aparelhos nobreaks, cuja produção será absorvida pela planta gaúcha por razões de ganho de eficiência”, afirmou.

Atualmente, a venda de nobreaks representa 30% do faturamento da Legrand no Brasil, operação que hoje responde por apenas 2% da receita global do grupo. Há duas décadas, o País estava no top 10. “Vivemos um ano de instabilidade política interna e de instabilidade econômica no mercado global, o que aliado ao câmbio desfavorável impactou o resultado”, disse Sala ao comentar o resultado de 2022, apenas 0,2% acima do obtido um ano antes.

Voltar aos patamares do início dos anos 2000 está no horizonte da Legrand, que vê com bons olhos a retomada do programa Minha Casa, Minha Vida pelo governo federal. Em paralelo ao possível aumento da demanda de produtos para moradia popular, a empresa aposta em itens de maior valor agregado a partir de inovações tecnológicas e soluções digitais. “Assim compensamos a redução em termos de volume e executamos um alinhamento com a filosofia global da Legrand que é investir na venda e no posicionamento de produtos mais caros. Além de crescer organicamente e expandir com aquisições”, disse o presidente.