O Líbano entrou nesta quinta-feira (24) em sua segunda semana de manifestações contra os líderes políticos, em uma agitação sem precedentes que não dá sinais de calma, apesar de o presidente do país ter se disposto a se reunir com os manifestantes.

Em um discurso televisionado à nação, Michel Aoun, um general reformado de 84 anos, propôs reunir-se com os “representantes” da mobilização, mas sem anunciar qualquer medida concreta para acalmar os protestos.

Os manifestantes, que criticam dirigentes corruptos e protestam contra a pobreza e a precariedade dos serviços públicos, ouviram Aoun ao vivo do local onde se reuniam. “Não nos contentaremos com palavras vazias!”, gritou uma mulher, após o discurso.

Nesta quinta-feira, após uma noite de protestos maciços e essencialmente festivos em várias cidades do país, barricadas ainda bloqueavam vários acessos de Beirute.

Em algumas avenidas, os manifestantes montaram barracas, dando a entender que não vão se retirar.

Bancos, escolas e universidades seguem fechados até segunda ordem e alguns médicos começam a reclamar nas redes sociais que não podem ir ao trabalho. O dinheiro também está começando a faltar nos caixas eletrônicos.

“Estou disposto a me reunir com seus representantes para ouvir suas demandas”, afirmou Aoun, embora não haja nenhuma figura representativa da mobilização que se destaque.

“Ouvi muitos pedidos pela queda de regime. Mas o regime, queridos jovens, não pode ser mudado em praça pública”, acrescentou, em seu primeiro pronunciamento desde que a crise.

“O povo quer a queda do regime!” é uma das frases mais ouvidas nos protestos, que surpreenderam as autoridades em 17 de outubro, após o anúncio de uma nova taxa sobre as chamadas pelo aplicativo WhatsApp.

O governo rapidamente recuou e anunciou na segunda-feira um plano abrangente de reforma econômica. Mas não conseguiu convencer a população que, quase 30 anos após o fim da guerra civil (1975-1990), sofre dificuldades econômicas significativas em um país considerado um dos mais corruptos do mundo.

– Direitos essenciais –

Aoun deixou entrever uma possível mudança ministerial, mas também demonstrou seu apoio às reformas econômicas do governo, rejeitadas pelos manifestantes.

“Estamos aqui para paralisar o país. Alguns acreditam que isso é um jogo, mas se equivocam. Pedimos direitos essenciais: água, comida, eletricidade, saúde e educação”, explicou um homem sentado na calçada, com um kufiya, um tradicional pano vermelho e branco, sobre os ombros.

Em frente à sede do Banco Central do Líbano, onde dezenas de jovens se reúnem para manter a mobilização, Mohammad, um arquiteto de 27 anos, explica: “Normalmente, no Líbano, protestamos aos domingos e voltamos ao trabalho na segunda-feira. Mas desta vez é diferente”.

Seu rosto, contudo, demonstra preocupação pelo choque entre o poder e as ruas. “Se não acontecer nada nos próximos três dias não sei, de verdade, aonde vamos chegar”.

Na quarta-feira, o exército apareceu nas ruas e as imagens de manifestantes e soldados, frente a frente, irmanados na maior parte das vezes, ocuparam a primeira página dos jornais nesta quinta-feira.

– Atenção voltada para o Exército –

Apesar do clima quase festivo das manifestações, houve incidentes em algumas cidades libanesas.

No centro de Beirute, partidários do Hezbollah xiita, cujo líder também foi vaiado nos protestos, entraram em confronto com manifestantes. A tropa de choque da polícia teve que intervir.

Em Nabatiyeh, ao sul, onde a maioria da população é xiita, quinze manifestantes ficaram feridos em confrontos com a polícia. Outros confrontos ocorreram em Bint Jbeil, uma cidade próxima.

No Monte Líbano, região cristã a leste da capital, alguns manifestantes disseram que foram atacados por militantes do partido do presidente Michel Aoun. O exército teve que intervir para protegê-los, segundo eles.

O papel do exército, a única instituição respeitada por unanimidade no Líbano, será crucial. “Todo mundo está de olho no exército”, resumiu o jornal The Daily Star.

Segundo a publicação, os comandantes do exército teriam recusado desde o início uma intervenção por força exigida pelo governo.