01/09/2004 - 7:00
Cássia D?Aquino é a única representante da América do Sul na Internacional Association for Children?s Social and Economics Education, entidade com sede na Inglaterra voltada para a educação financeira de crianças e adolescentes. A mineira, que atua como consultora independente em São Paulo, é categórica: para quem não sabe lidar com o dinheiro, não faz diferença ganhar R$ 400, R$ 4 mil ou R$ 4 milhões. Os erros cometidos num pequeno orçamento serão repetidos com grandes quantias. Segundo ela, o remédio para o problema é simples: antes de qualquer decisão, conheça a si mesmo. Encare o modo como você é, quais são suas influências e imponha limites. E lembre-se: a hora certa de pensar em dinheiro é quando as coisas vão bem, depois é tarde demais.
DINHEIRO ? Uma das maiores dificuldades das pessoas em relação ao dinheiro é manter-se dentro do orçamento, não importa qual seja o nível de renda. Como alguém pode detectar se está cedendo demais à ansiedade consumista?
CÁSSIA D?AQUINO ? Não podemos ignorar que consumir é, de fato, inebriante. Por isso, é fácil se perder. Quando é a hora de acender o sinal vermelho? Quando a pessoa se dá conta de que ela deslocou seu eixo de interesse das próprias realizações e do que ela quer ser. É o momento perigoso em que se age, a rigor, tentando reproduzir no cotidiano financeiro doméstico a imagem que os outros fazem de você. Isso faz toda a diferença no modo adequado de conduzir os cuidados com o dinheiro.
É possível inventar um falso estilo de vida?
As pessoas pensam que, com apenas alguns sinais exteriores, conseguirão enganar os outros sobre sua real condição. Mas, no fim das contas, elas descobrem que ninguém acredita na mentira. Todo mundo percebe quando uma pessoa não tem dinheiro algum e insiste em pagar o jantar para todos.
Mas ainda há a crença de que, se você disfarçar com competência, no final conseguirá se dar bem na vida e atingirá seus objetivos.
Uma pessoa se dará muito mal pensando dessa maneira. Se alguém decide viver num certo padrão e é bem-sucedido, tenha certeza de que esse sucesso não resultou de aspectos exteriores, como roupas, carros, viagens e restaurantes. O que garantiu esse sucesso foi apenas a determinação dele. O resto é superstição.
Como equacionar adequadamente o poder do dinheiro sobre a sua felicidade pessoal?
Dinheiro existe para dar prazer. Mas, se você está ?pendurado? no cartão de crédito ou mesmo sem condições de alimentar uma poupança, não conseguirá desfrutar desse prazer. É preciso saber se organizar.
Mas e se houver urgência?
Lembre-se de que nem todos os prazeres precisam ser satisfeitos imediatamente. Há desejos para serem realizados daqui a 10, 15 ou 30 anos. Programar-se para realizar cada um desses desejos é que se chama planejamento.
Se é assim tão simples, por que tantas pessoas têm dificuldade em planejar suas finanças?
Há uma visão moralista sobre o dinheiro. ?Eu tenho de ter uma poupança porque sou uma pessoa adulta e responsável e preciso pensar na minha previdência?. Isso é muito chato e não serve de estímulo nenhum. O ideal é pensar: ?Quero me dar o prazer de, futuramente, não depender de família ou pensão do governo; quero viajar e morar bem?.
Muita gente sente culpa ao lidar com dinheiro…
Se a gente se organiza em função dos prazeres da vida, as coisas tendem a ficar mais fáceis. Porém, ainda se pensa, sim, no dinheiro em termos de certo ou errado, devo ou não devo. E, assim, a pessoa se culpa. Então esconde o que faz, suborna, engana-se e evita tocar no assunto, sobretudo no casamento, num comportamento muito comum e ruim.
O exemplo dos pais nas finanças é decisivo. O que fazer se você foi educado num modelo equivocado?
Quanto mais nova a pessoa aprende, mais fácil será mudar seus padrões. Claro que esse é um processo inconsciente, o que torna o aprendizado difícil para todos. Há que se considerar também que o mundo inteiro empurra as pessoas para o consumo. Até a metade do século 19, a ética predominante era a da produção. Quem era dono dos meios é quem mandava. A partir do fim do século 19, surge a ética do consumo. ?Consumo, logo sou.? Ou ainda: ?sou o que consumo?. Isso é uma revolução global que está apenas começando.