09/04/2008 - 7:00
QUANDO BUSCAM OS ensinamentos de um sábio dos mercados, os investidores americanos recorrem a Warren Buffett.
Homem mais rico do mundo no mais recente levantamento da revista Forbes, o Oráculo de Omaha é o mais bem acabado exemplo do acionista ativo, o homem que compra participações em empresas sólidas e exerce, nelas, mais do que o papel de conselheiro, a função de um farol, guiando seus gestores pelos caminhos da administração em favor da geração de valor para aqueles que apostaram suas economias no futuro dessas companhias. O Brasil não tem o seu próprio oráculo. Teria, caso Jorge Paulo Lemann fosse mais afeito a aparições e, principalmente, a declarações públicas. Por isso, cada vez que o fundador do Banco Garantia ? e, posteriormente, da GP Investimentos, outro ícone do capitalismo brasileiro-se pronuncia, suas palavras circulam como ensinamentos sobre gestão nas empresas e visão de mercado. Ele mesmo um admirador declarado de Buffett, Lemann foi o responsável por algumas das mais espetaculares transações de fusão e aquisição de empresas no Brasil ? pelo seu portfólio já passaram companhias como Brahma, Artex, Gafisa, ALL, Lojas Americanas, entre outras ? e no Exterior ? como a associação da brasileira Am- Bev com a belga Interbrew, criando a InBev, a maior fabricante mundial de cervejas. Além disso, ajudou a moldar um modelo de administração hoje estudado em todo o mundo. No início deste ano, Lemann falou. Em entrevista a José Salibi Neto, diretor editorial do Grupo HSM, publicada na revista HSM Management, ele analisa o atual momento do mercado de capitais no País e faz revelações sobre os bastidores de seus negócios. Confira alguns trechos:
SOBRE OS SÓCIOS:
?Um fator que nos distingue (ele e os sócios Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles) de outros empresários e que serviu para nos manter juntos foi a aptidão comum para correr riscos. Quer dizer, nós jamais teríamos feito o que fizemos se não tivéssemos topado juntos correr alguns riscos.?
SOBRE RISCO E CORAGEM:
?Corajoso é o covarde sem opção. Não acho que tenhamos coragem, porque foi uma coisa que veio gradualmente. Em 83 decidimos comprar as Lojas Americanas no primeiro takeover que houve na Bolsa de Valores de São Paulo. Gastamos US$ 20 milhões nisso, era muito dinheiro para nós na época e entrávamos num negócio que não tínhamos a menor idéia do que era? (…) ?Em 89, decidimos comprar a Brahma, 15 dias antes da eleição Collor-Lula. Os mais racionais entre nossos outros sócios ficaram apavorados com essa compra, não queriam andar para a frente. E nós três dissemos: ?Nós vamos andar, quem quiser que venha, quem não quiser não precisa vir.??
SOBRE A ONDA DE ABERTURAS DE CAPITAL NA BOVESPA:
?O que está acontecendo é uma das melhores coisas dos últimos anos na economia brasileira. Esses IPOs todos, essas aberturas de capital, o fato de que isso está levando várias empresas, de setores que jamais pagavam impostos, a se formalizar. Acho isso um espetáculo também para atrair mais empreendedores a fazer negócios grandes, porque estão vendo que quem faz isso bem e dá certo pode ter um resultado extremamente favorável em termos financeiros.?
?Acho que tem muita gente que vem abrindo capital só porque está vendo um pote de ouro ali. Isso é ruim, porque o pote de ouro pode desaparecer. Acho que é preciso acreditar realmente que uma empresa aberta é um animal mais saudável do que a empresa fechada, que ela tem mais possibilidade de sobreviver e crescer.
E é necessário descobrir ainda quais são as regras básicas que fazem uma empresa aberta funcionar bem e ter sucesso, e abraçá-las.?
SOBRE A ANÁLISE DE UM NOVO NEGÓCIO:
?Ao longo do tempo, eu comecei a confiar e depender mais de estudos, projeções e várias opiniões, num processo decisório mais formal. Mas jamais dispenso o feeling. Corremos riscos mais baseados em sentimento do que em análises muito profundas. Eu diria que antes agíamos com 80% de feeling e 20% de estudo e, hoje em dia, esse mix talvez seja de 50%-50%, mas eu não gostaria de ir na direção de ser 90% de estudo e 10% de feeling. Acho que aquilo que você sente na barriga vale tanto quanto o que está no papel.?
?No caso da Brahma, se tivéssemos feito o due diligence adequadamente, nunca a teríamos comprado. Logo depois da aquisição, descobrimos grandes problemas financeiros, especialmente no fundo de pensão. Mas nós compramos. Por quê? Porque nosso feeling dizia que somos um país de população jovem, com muito calor, e acreditávamos que cerveja era um bom negócio mal tocado aqui.?
?Se eu vou investir em uma empresa e você me disser que aquilo vai fabricar ouro em pó ou pimenta, não me interessa. Tenho muito mais interesse em ver quem está lá tocando a gestão, o que essas pessoas pensam, em que acreditam. Eu sou uma pessoa que acredita muito no ativo humano, essa é minha prioridade, sempre.?
SOBRE A EMPRESA IDEAL:
?Nós basicamente achamos que a empresa ideal é uma que tem acionistas públicos e também acionistas trabalhando dentro da empresa, porque estes certamente estão interessados em perpetuar o negócio.?