24/12/2008 - 8:00
Quarenta anos depois, o histórico ano de 1968 continua influenciando a política, a moda, o comportamento e as artes de vários países. Algo semelhante deve acontecer com 2008, pelo menos no mercado financeiro. O ano que termina com a eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Barack Obama, também será lembrado pelo rompimento de paradigmas econômicos, cujos efeitos irão durar por várias gerações. O Brasil, quem diria, deixou de ser caloteiro e virou porto seguro para investidores internacionais ao receber selo de grau de investimento. A descoberta de petróleo no pré-sal colocou o País no panteão das potências energéticas do século XXI e a bolsa refletiu esse prêmio. Mas a crise imobiliária nos Estados Unidos acabou com a festa, dizimou bancos de investimento e se espalhou pela Europa, colocando os países ricos na maior recessão desde a crise de 1929. O preço do barril de petróleo passou de US$ 150 no primeiro semestre e deverá fechar o ano a menos de US$ 50. Derivativos, que forneciam proteção, viraram veneno para as empresas brasileiras. Da euforia ao pessimismo, uns ganharam fortunas, outros perderam tudo. Que lições este ano deixa para o futuro?
Lehman Brothers, dois símbolos do poder monetário que simplesmente desabaram. Investidores americanos viram suas economias virar pó, mesmo tendo investido em empresas sólidas como GM, Citigroup e Merrill Lynch. Os brasileiros descontentes com o ano negativo do Ibovespa podem tirar dessa experiência uma das mais importantes lições: nenhuma empresa é tão sólida que não possa quebrar. Não existe gestão perfeita nem vacina anti-risco. Empresas com alto nível de governança corporativa levam vantagem, mas isso não significa que terão bons resultados para sempre. O exemplo mais recente aconteceu com Votorantim, Sadia e Aracruz. Essas e outras empresas perderam mais de R$ 3 bilhões com derivativos cambiais mal-explicados.
Nos últimos cinco anos, o Ibovespa sofreu alguns tombos, mas não demorava muito a se reerguer. Por essa razão, quando a bolsa começou a refletir os primeiros sinais da desaceleração global, muitos investidores pensaram que isso seria passageiro. Mas o otimismo trazido pelo grau de investimento não foi suficiente para estancar a fuga de capital no mundo. “É preciso sempre desconfiar dos exageros, tanto do otimismo excessivo anterior à crise como do pessimismo aparentemente exagerado que estamos experimentando hoje”, pondera Rubens Sardenberg, economista-chefe da Febraban. O ser humano, imperfeito e impulsivo como é, muitas vezes não consegue dominar seu ímpeto e acaba seguindo o efeito manada e vendendo suas ações na baixa. “Cada investidor deve sempre ter em conta o seu perfil e a sua aptidão de correr riscos. A maioria deixou esse ensinamento básico de lado nos tempos recentes”, diz Sardenberg.
EMPRESAS PERDERAM MAIS DE R$ 3 BILHÕES COM
DERIVATIVOS DE CÂMBIO MAL-EXPLICADOS
Talvez a maior lição deste ano paradoxal seja a consciência. Estar ciente do que se compra, da situação das empresas, do cenário macroeconômico e dos objetivos traçados para aquele investimento são preceitos básicos quando se opta por aplicar em ações. Atribuir a outros essa tarefa pode custar caro. “É preciso duvidar sempre. Duvidar das empresas de rating, que erraram muito, e também dos analistas, que só previam bons retornos”, aconselha o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes.
Outra lição é nunca baixar a guarda, mesmo nos cenários mais otimistas. Achar que o risco diminui em momentos de estabilidade e otimismo é um dos erros mais graves que um investidor pode cometer. “É justamente nos momentos de exuberância que precisamos dobrar nossa vigilância ao tomar risco”, adverte Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Investimentos. Portanto, prepare-se. Da mesma forma que os jovens mergulharam nas obras de Herbert Marcuse e Karl Marx para construir o movimento de 1968, será necessário o mesmo afinco estudantil para entender as minúcias dos balanços e os prospectos das empresas. Boa sorte.