AS FORTES QUEDAS DO MERCADO DE ações nos últimos meses provocaram um fenômeno interessante na BM&FBovespa. Muitas empresas estão valendo menos do que o registrado em seu balanço contábil, numa verdadeira liquidação pré-natalina. Das 66 companhias que fazem parte do Ibovespa, o índice das mais negociadas, 30% estão cotadas abaixo do valor patrimonial, segundo estudo realizado pela Economática para a DINHEIRO. No saldão da Bolsa, estão pesos-pesados do porte de Usiminas, Gerdau, Votorantim, Aracruz, Braskem e a própria BM&FBovespa. Os descontos chegam a 68%, como no caso da Eletrobrás PNB, em que bastam R$ 0,32 para comprar R$ 1,00 de patrimônio contábil. Depois de seis anos de ganhos, a desvalorização de 44% do mercado de ações neste ano faz o investidor ficar faminto para comprar um papel barato. Seriam essas que estão a preço de banana?

Primeiro, é preciso entender o significado do indicador conhecido como P/VPA. É o resultado da divisão do preço (P) da ação pelo valor patrimonial (VPA) que ela representa. Quando está abaixo de 1, significa que a companhia virou uma pechincha. Isso, por si só, não é sinônimo de bom negócio, mas é um bom indicador de quanto uma empresa está sendo subavaliada e, portanto, qual seria seu potencial de valorização no futuro. Em tese, as boas empresas são cotadas acima de seu valor patrimonial contábil, pois os investidores pagam um prêmio quando acreditam que os resultados serão crescentes e compensadores. Geralmente, sidequando o P/VPA estiver próximo de 1,5, é sinal de que o papel está barato. Mas se ficar abaixo de 1, como acontece em momentos de grande tensão nos mercados ou quando a companhia passa por dificuldades, a ação ganha status de ‘preço de banana’. A arte de investir, ensina o megainvestidor americano Warren Buffett, também passa por escolher boas empresas que estejam cotadas a preços de liquidação e que, no longo prazo, tenham boas perspectivas de crescimento. Não foi por outra razão que o Mago de Omaha investiu US$ 3 bilhões em papéis da GE e US$ 5 bilhões no banco de investimentos Goldman Sachs, em plena crise de confiança. As ações estavam sendo negociadas, respectivamente, a 1,42 e a 0,62 do valor patrimonial que representam.

Entre os 20 papéis do Ibovespa com o indicador abaixo de 1 em 14 de novembro passado, a Eletrobrás aparece com seus dois tipos de ação. A ordinária, uma das poucas sobreviventes no ano com alguma valorização, tem uma das mais baixas relações com seu valor patrimonial: 0,32. Isso acontece porque a rentabilidade da empresa é de apenas 5% sobre o patrimônio líquido, muito abaixo de suas concorrentes, como a AES Tietê, que oferece 95% de retorno para o investidor. “A Eletrobrás teve um ótimo balanço no terceiro trimestre, mas a margem operapacional é baixa”, diz Fernando Campello, gerente de contas da Hera Investments. Esse é um dos motivos para nunca se analisar a divisão do preço sobre o patrimônio líquido de maneira isolada. A sugestão é ter também em mãos a projeção de preço sobre o lucro futuro e a margem operacional da companhia.

ESTUDO DA ECONOMÁTICA MOSTRA PAPÉIS COM INDICADOR P/VPA (PREÇO SOBRE VALOR PATRIMONIAL DA AÇÃO) MENOR DO QUE 1

O P/VPA também serve como uma espécie de termômetro do pessimismo, principalmente quando caminha no sentido oposto ao de outros indicadores que fazem a projeção de lucros e sugerem a valorização que o papel pode alcançar no futuro. Apesar de não projetar os ganhos, ele pode antever as perdas. “Muitas vezes o mercado está antecipando os prejuízos jogando o preço da ação para baixo”, alerta Ricardo Almeida, professor de Finanças da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP). A conseqüência é naturalmente o valor patrimonial se ajustar ao preço da ação se o cenário pessimista se confirmar. Como não vai mais crescer o previsto em 2008 e 2009 é uma incógnita, a BM&FBovespa vale hoje no pregão pouco mais da metade do que calcula seu contador.

Em períodos de muitas incertezas como o atual, com a recessão assumida por Japão, EUA e alguns países da Europa, fica a expectativa ruim para companhias dependentes do mercado externo. As siderúrgicas, que se aproveitaram do crescimento global nos últimos anos, podem ver seus balanços caírem nos próximos trimestres. Talvez por isso Usiminas e Gerdau Metalúrgica estejam entre as empresas em liquidação na Bolsa. É o mesmo caso das elétricas, que com a economia em desaceleração teriam menos receita da retração no consumo de energia. Além da Eletrobrás, Cesp, Celesc e Copel têm P/VPA abaixo de 1. Companhias afetadas pela alta do dólar no terceiro trimestre, como a Braskem, a Gol e a Aracruz – que perdeu US$ 2 bilhões com derivativos de câmbio – também fazem parte do saldão. A Rossi Residencial e a Gafisa estão sendo punidas devido às perspectivas ruins para as vendas do setor imobiliário. Nesse grupo, nem todas as ações podem ser um bom negócio com certeza, mas certamente há algumas que podem fazer parte de uma carteira de investimentos mais ousada e propensa ao risco. Se a recessão mundial estiver corretamente refletida nos preços e o Brasil continuar a crescer em 2009, mesmo que a metade dos 6% previstos para 2008, essa pode ser uma boa oportunidade para escolher as melhores “bananas” deste cacho. “Se o investidor imagina que o mercado vai continuar aquecido, as empresas estão baratas, sim”, conclui Almeida.

Enquanto isso, algumas companhias dão mostras de resistência. Dentre todas as companhias do Ibovespa, somente dez ainda mantinham desempenho positivo no ano até a terça- feira 18 (veja tabela “As resistentes”).

Isso, em cima de uma desvalorização média do mercado de 46,6%, segundo o Ibovespa. A campeã desse grupo é a Nossa Caixa Nosso Banco, com alta de 126,7%. A negociação de venda da instituição paulista para o Banco do Brasil, por estimados RS 7 bilhões, impulsionou os papéis, para alegria dos investidores, dentre os quais o empresário Lirio Parisotto, dono da Videolar e um de seus maiores apostadores. A Eletrobrás é a única da turma com P/VPA abaixo de 1. A mais bem avaliada, por esse indicador, é a Natura, com cotação 10,3 superior ao valor patrimonial e valorização de 26,8% no ano – se fosse banana, seria da variedade ouro.