A venda de café solúvel brasileiro para a Malásia tem avançado nos últimos tempos, a ponto de chamar a atenção de Roberto Ticoulat, presidente do Conselho Brasileiro das Empresas Importadoras e Exportadoras. Ao tentar descobrir o porquê, Ticoulat deparou-se com um acordo de livre comércio entre os malaios e os chineses. Assim, o café brasileiro segue a granel para a Malásia, onde é embalado por distribuidores, para então ser revendido mais caro na China. Em tese, o Brasil deixa de ganhar com mais “valor agregado” ao café, nessa triangulação asiática. Na prática, é a única forma de revender o produto a preço competitivo, uma vez que o País não tem acordos de isenção de tarifa com seu principal parceiro comercial.

 

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A cada dia que passa, mais exemplos do gênero vêm confirmar que o País está jogando dinheiro fora por não ousar nas parcerias estratégicas com outras nações. O setor privado não esconde a ansiedade de ter um posicionamento mais claro do governo nesse sentido. É uma mudança de postura louvável, diga-se de passagem, pois, no passado, muitos preferiam manter o mercado fechado para evitar a competição. Outros ainda preferem ter como única bandeira a necessidade de manter o real desvalorizado, para garantir competitividade aos exportadores. Trata-se de um argumento raso diante dos enormes desafios que o País tem pela frente. 

 

Há setores que já alcançaram padrão de excelência, investindo em inovação. A cadeia de celulose, por exemplo, tem tecnologia reconhecida no mundo inteiro por garantir um produto final mais limpo, conectado com os compromissos de sustentabilidade das grandes nações. Ao mesmo tempo, já se fala em acordo de livre comércio para microempresas, o que demonstra que o consenso é praticamente geral. O Brasil, na verdade, está como aquele jovem que cresceu e ainda não comprou roupas novas, de acordo com o seu tamanho. E como todo adolescente, ainda guarda receios do que vem pela frente. Uma maior abertura, certamente, poderia criar um desequilíbrio inicial, com o aumento das importações. 

 

Mas os ganhos no médio prazo tendem a ser maiores. Forçosamente, o investimento em inovação deixará de ficar restrito às grandes multinacionais, para tornar-se uma cultura no País. Ao mesmo tempo, vai ser preciso ter equipes preparadas para negociar em todas as línguas e ser capazes de vender o Brasil lá fora. Padrão de excelência global, internacionalização e financiamento de exportações serão temas tão corriqueiros na pauta brasileira, que em nada vão lembrar os vacilos do café solúvel na Malásia. Há um prazo considerável para se chegar a esse ponto. 

 

O tempo é necessário para o País adaptar-se a novos tempos, inclusive para a melhoria da infraestrutura e da logística. Nas negociações para um acordo com a União Europeia, por exemplo, o Brasil teria uma década até que as tarifas de 75% dos produtos que compõem o comércio bilateral fossem reduzidas. Uma década também para que o governo modernize as instâncias burocráticas a fim de incentivar o ambiente de negócios. Mirar acordos de livre comércio já não é uma questão que deve ser mais ou menos defendida por este ou aquele partido. É um assunto de Estado que definirá o futuro das próximas gerações.