Decorridos doze meses do maior escândalo corporativo ocorrido no país, envolvendo as Lojas Americanas, as investigações sobre como a fraude foi gestada e quais os envolvidos seguem sem respostas conclusivas. Recentemente, o atual presidente da empresa em recuperação judicial, Leonardo Coelho, declarou em entrevista que os três acionistas de referência – Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira – nada tem a ver com a crise, que teria sido deflagrada por irregularidades cometidas pelos executivos da companhia, principalmente os ligados à área financeira.

Apesar da veemência da defesa (e acusações) de Coelho, ainda há numerosos pontos em aberto nas investigações. Tais lacunas demonstram que a atribuição de responsabilidades é muito mais complexa do que suas declarações. Revelações ocorridas no decorrer das apurações da fraude apontam que bancos recentemente incorporados como sócios da empresa, por meio do acordo de credores, foram parte em pelos menos um episódio altamente controverso.

Em abril, o jornal Valor revelou trechos de um relatório dos administradores judiciais da varejista onde se apontava que ao menos dois bancos (Itaú Unibanco e Santander) teriam alterado as informações prestadas aos auditores externos sobre a existência de operações de “risco sacado” da varejista a fornecedores em 2016. São justamente essas operações estão por trás da crise em que a empresa embicou, após a revelação, em janeiro de 2023, de “inconsistências contábeis”. Confrontados na época, os bancos negaram as alterações e disseram que todas as informações a respeito da companhia foram disponibilizadas a instituições responsáveis por esses controles.

Em outro episódio polêmico, revelado em junho, em meio a uma das sessões da CPI que investigou o caso (e que foi encerrada sem apresentar nenhuma conclusão efetiva), apontou-se
operações duvidosas ligadas a fornecedores envolvendo contratos de promoção de produtos nas lojas (VCPs). Nas manobras, os valores eram inflados artificialmente como forma de maquiar os prejuízos da rede de varejo. Na CPI, Carla Bellangero, sócia da KPMG no Brasil, que obteve todas as confirmações diretamente com os fornecedores.

Nova fonte de polêmica foi o episódio da delação premiada de dois ex-executivos da Americanas, o ex-diretor financeiro Marcelo Nunes e a ex-superintendente de Controladoria da companhia Flavia Carneiro. Ambos tiveram um regime de demissão da empresa bem mais vantajoso que seus pares, todos desligados em regime de justa causa e sem direito a indenizações. As delações dos executivos feitas ao Ministério Púbico Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ), têm como foco principalmente a participação do antigo CEO da empresa, Miguel Gutierrez, e outros executivos na fraude.

A conexão entre a varejista e o processo de delação de Nunes e Carneiro chegou a ser alvo de uma interpelação do Banco Safra à diretora de relações com investidores da varejista, Camille Loyo Faria. Com base em informações divulgadas em um comunicado ao mercado em setembro, o banco perguntou se a empresa estava tendo acesso indevido a informações sigilosas do processo de delação.

Além dos procedimentos de apuração conduzidos pelo MPF-RJ, seguem em andamento investigações um comitê independente de auditoria constituído pela empresa, na Polícia Federal e na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Um ano depois de virem à tona revelações que abalaram para sempre o capitalismo brasileiro, a fraude das Americanas ainda está muito longe de ser completamente esclarecida.