03/10/2022 - 20:00
O primeiro turno das eleições presidenciais mostrou que o bolsonarismo, movimento de ultradireita nascido há poucos anos com seu líder, Jair Bolsonaro (PL), está bem implantado no país, avaliam analistas.
Contrariando as pesquisas, o presidente ficou bem perto do favorito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ao obter 43,20% dos votos, contra 48,43% para o rival de esquerda. Além disso, seus aliados obtiveram resultados inesperadamente elevados nas eleições legislativas e para os governos estaduais.
Bolsonaro obteve 1,7 milhão de votos a mais do que no primeiro turno de 2018, marca que o presidente declarou nesta segunda-feira no Twitter que conquistou “contra tudo e contra todos”.
Essa eleição “mostra o quanto o conservadorismo está enraizado no Brasil”, destacou em coluna publicada na “Folha de S.Paulo” a socióloga Angela Alonso, da Universidade de São Paulo. Mesmo que Bolsonaro não seja reeleito, o bolsonarismo irá se manter”, previu.
– ‘Mais à direita do que o previsto’ –
As eleições de 2018 já haviam sido marcadas por uma onda ultraconservadora, atribuída principalmente à rejeição ao Partido dos Trabalhadores de Lula, manchado por escândalos de corrupção, embora também a fatores mais conjunturais, como a circulação em massa de informações falsas ou a facada que Bolsonaro levou durante a campanha, que fez sua popularidade disparar.
Os resultados de ontem, no entanto, mostram que o bolsonarismo “não foi apenas um raio em céu azul, ou seja, alguém que ganhou por circunstâncias de todo tipo”, disse o cientista político da Fundação Getúlio Vargas, Jairo Nicolau, ao portal Nexojornal.
Bolsonaro conseguiu muito mais do que enfrentar as crises que marcaram seu mandato, como seu negacionismo diante da pandemia, que matou 686 mil pessoas no Brasil, ou a disparada da pobreza e da fome no país.
Quase metade dos senadores eleitos neste domingo (15 de 27) são do Partido Liberal (PL) de Bolsonaro ou aliados. Entre eles estão vários de seus ex-ministros, como Tereza Cristina (PP-MS), ex-titular da Agricultura, e o ex-astronauta Marcos Pontes (PL-SP), que chefiou o ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. O vice-presidente, Hamilton Mourão (Republicanos-RS), também conquistou uma cadeira no Senado.
Também foram eleitos ex-membros bastante polêmicos do governo Bolsonaro, como Eduardo Pazuello (PL-RJ), que chefiou o Ministério da Saúde nos piores dias da pandemia, de maio de 2020 a março de 2021. Muito discreto durante a campanha, Pazuello beneficiou-se do forte apoio do presidente e obteve a segunda melhor colocação nas eleições para deputado federal pelo Rio de Janeiro.
– ‘Deus, pátria, família’ –
Jairo Nicolau disse à AFP que “uma pequena parte dos brasileiros é extremista, mas o bolsonarismo é, sobretudo, um movimento de expressão do conservadorismo do país”, em substituição a partidos tradicionais de centro-direita, como o PSDB, do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2001).
“O PSDB era um partido de elites, com muito pouca penetração no tecido social. Ali é onde Bolsonaro faz a diferença: é um verdadeiro líder popular, como a direita brasileira não tem há tempos”, completou Mayra Goulart, professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O bolsonarismo está particularmente arraigado no eleitorado evangélico, sensível ao seu discurso ultraconservador e a seu lema de campanha: “Deus, pátria e família”.