Luciano Coutinho aparenta estar de bom humor. Cercado por repórteres, o chefe do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) responde às perguntas do dia, uma sexta-feira. Ele está em um hotel de luxo de São Paulo e acaba de falar a dezenas de executivos financeiros que vieram almoçar com o – quem sabe – futuro ministro da Fazenda ou presidente do Banco Central de um eventual governo Dilma Rousseff. 

 

Está com pressa e tenta caminhar enquanto conversa com os jornalistas. Em poucos minutos, acelera o passo e rompe o cerco. Sem olhar para trás, solta quatro palavras que revelam seu estado de espírito depois de semanas ouvindo críticas sobre a atuação do banco de fomento nos últimos meses: “Me deixem em paz!” 

 

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Ele resmunga, mas aceita posar para um fotógrafo, desde que seja rápido. “Só uma foto. E pronto!” Apesar do tom jocoso com que reclama do assédio da imprensa, como se estivesse se divertindo com isso, Coutinho fala sério. Este homem, tão tímido quanto poderoso, cansou de apanhar.

 

O BNDES tem sido alvo de questionamentos sobre os critérios de concessão de crédito subsidiado a grandes grupos empresariais, com alto custo financeiro para o Tesouro, que repassou ao banco R$ 180 bilhões nos últimos dois anos. Além disso, acusa-se o banco de eleger poucos vencedores, deixando de lado milhões de pequenas e médias empresas, que arcam com empréstimos mais caros. Mas também tem tido uma boa defesa. 

 

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, chefe de Coutinho, entoa o coro em favor do BNDES, sendo seguido pelo presidente Lula. Ambos têm se empenhado em blindar a instituição. “Os dividendos cobrem os subsídios”, diz Mantega. Para o presidente Lula, “o BNDES existe para financiar a indústria e quanto mais baixos os juros, melhor”.

 

Também não tem faltado apoio do setor produtivo às políticas anticíclicas conduzidas por Coutinho. Os industriais elogiam o papel do BNDES em incentivar o investimento. Não foi por acaso que 12 entidades empresariais assinaram um manifesto de apoio ao banco. 

 

E que algumas promoveram eventos propícios a elogios no mês passado, como a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base e o Instituto Brasileiro de Executivos Financeiros. Faz sentido. Quem é que não gosta de dinheiro barato, especialmente em tempos de escassez de crédito privado? 

 

“O BNDES é o único emprestador de recursos de longo prazo. É um banco chapa-branca e ponto”, diz o presidente do conselho do Ibef São Paulo, Walter Machado de Barros. “Grande parte do crescimento do PIB, de 7% em 2010, se deve ao BNDES”, diz o diretor financeiro da IBM, Rodrigo Kedi de Freitas Lima.

 

Respaldado dentro e fora do governo, o acadêmico Coutinho, um dos expoentes desenvolvimentistas da Unicamp, se diz tranquilo, mas admite que o atual peso do BNDES na economia é insustentável. 

 

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O banco oferece dois terços do crédito acima de cinco anos de prazo no Brasil. “Depender só de banco público não é bom”, diz ele. São declarações sensatas, mas que parecem estranhas na boca de quem tem sido o executor do crescimento do banco estatal. 

 

Que diretrizes dará ao banco, caso Dilma Rousseff vença as eleições e ele seja eleito para chefiar de fato seu próximo sucessor (o BNDES é subordinado ao Desenvolvimento, mas quem manda na prática é a Fazenda)?

 

A agenda de Coutinho, baseada no fortalecimento do crédito privado, já está em gestação no atual governo. Sua ideia é estimular o crescimento da poupança interna, da bolsa de valores, do mercado de títulos de dívida privada, como as debêntures, e dos papéis ligados ao setor imobiliário, entre outros ativos de longo prazo. 

 

Mudanças regulatórias têm sido discutidas e devem ser anunciadas após as eleições de outubro. “É a agenda possível”, defende. Enquanto isso não ocorre, o governo reforça ainda mais o capital do BNDES, a quem acaba de destinar um reforço de R$ 4,5 bilhões em ações da Petrobras – o que permitirá ao banco ampliar seus empréstimos em mais de R$ 30 bilhões. 

 

“Para nós, está muito bom. O banco tem crescido e precisa reforçar o capital de vez em quando para não ficar sob estresse”, diz Coutinho. Como se vê, ele pode apanhar bastante, mas é duro na queda e continua com a chave do cofre.