13/03/2015 - 8:00
O mundo da moda gira devagar. Uma peça de roupa leva décadas, às vezes séculos, para sair do “underground” e se tornar popular. É o caso, por exemplo, das calças jeans. A ideia para criar a veste, conhecida por sua durabilidade e resistência, surgiu durante a Corrida do Ouro americana, em 1853, com o jovem alemão Levi Strauss, que a vendia aos garimpeiros envolvidos na empreitada. Quase 100 anos mais tarde, na década de 1950, a sensual Marylin Monroe apareceu em público com a peça – e ajudou a consolidar, em definitivo, o jeans no cenário da moda.
As bermudas tiveram uma história de aceitação semelhante. Originada na ilha caribenha de Bermudas, a veste, antigamente, era utilizada somente na praia. Com o tempo, foi ganhando espaço, não apenas no dia a dia, mas também em eventos mais formais, nas passarelas e, mais recentemente, no mundo corporativo. Atualmente, as pernas de fora fazem parte do dress-code de grandes companhias, como a brasileira Totvs, dona de um faturamento de R$ 1,8 bilhão em 2014, e da operadora italiana TIM, cuja receita atingiu R$ 19,5 bilhões, no País.
Será que a bermuda é realmente apropriada para o ambiente empresarial? A julgar pela quantidade de empresas – de áreas de atuação e portes distintos – que têm adotado a vestimenta, não seria exagero dizer que a indumentária chegou para ficar no guarda-roupa social. Alguns exemplos são o Groupon, o Walmart.com, o grupo Newcomm, que reúne agências de propaganda comandadas pelo publicitário Roberto Justus, e outras empresas de menor porte, como a desenvolvedora de softwares Emphasys e a Radix, que fornece soluções de tecnologia e engenharia.
As bermudas também chegaram ao serviço público. No começo do ano, o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, sancionou uma lei que permite a todos os funcionários estaduais trabalharem mais à vontade, devido às altas temperaturas registradas no Estado. Em 2015, capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre bateram recorde de calor, com temperaturas acima de 37ºC. “Com todo esse calor, já estava mais do que na hora de as empresas adotarem a bermuda”, diz Claudia Matarazzo, consultora de etiqueta empresarial.
Segundo ela, o brasileiro precisa adaptar sua realidade térmica ao seu ambiente corporativo. “Somos um país continental e podemos criar nossa própria moda de escritório, assim como fizemos com a nossa moda praia.” A novidade está agradando, principalmente, por descontrair o ambiente de trabalho. O vice-presidente da Totvs, Alexandre Mafra, diz ter sentido uma melhora significativa desde que a empresa adotou a bermuda no ano passado. “Os funcionários estão mais bem-humorados”, diz.
“O turnover, desde então, caiu 10% e, todo ano, nossas pesquisas de satisfação obtêm resultados melhores.” A ideia de flexibilizar o dress-code da empresa, segundo o executivo, surgiu após uma pesquisa interna, na qual muitos empregados se manifestaram a favor da bermuda no escritório. Na TIM, sediada no Rio de Janeiro, onde as temperaturas normalmente chegam aos 40ºC, a iniciativa surgiu logo depois de uma campanha que agitou a internet neste verão, batizada de #bermudasim. A iniciativa já possui mais de 20 mil fãs no Facebook desde sua criação no início de 2014.
O site propõe uma brincadeira, na qual o internauta digita o e-mail de seu chefe que, em seguida, recebe uma mensagem com um pedido para liberar o uso da veste no trabalho. “Eu mesmo recebi e-mails do movimento”, diz Rodrigo Abreu, presidente da TIM Brasil. “A intenção é oferecer mais conforto aos colaboradores, para que possam trabalhar mais dispostos.” Com a flexibilização do dress-code, também surgiram regras. “Na TIM, recomendamos bermudas discretas, sem estampas florais, de surfe, de times de futebol ou demais agremiações”, diz Abreu. “Quando há reuniões externas, a roupa deve ser mais formal.”
A consultora Claudia Matarazzo recomenda que a peça seja mais comprida e que esteja na altura dos joelhos, além de apresentar um caimento mais justo e bolsos frontais no mesmo estilo verificado nas calças jeans. “Uma camisa por dentro e um cinto criam um visual bonito e sóbrio”, diz. A tendência, de acordo com Claudia, é que cada vez mais as companhias sigam esse movimento – justamente porque o calor é uma realidade inegável do País. “O que é bonito no Palácio de Buckingham, na Inglaterra, não é necessariamente apropriado para o Brasil”, diz. “Bonito é estar confortável.”