Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) – Depois de enfrentar críticas por suas recentes declarações sobre a guerra na Ucrânia –em que acusou Estados Unidos e Europa de incentivarem o conflito–, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai usar a visita a Portugal e Espanha, nos próximos cinco dias, para recalibrar o discurso e deixar claro que condena de forma inequívoca a invasão por parte da Rússia, disseram à Reuters fontes do governo.

No Palácio do Planalto e do Itamaraty admitem que as últimas falas de Lula trouxeram um “ruído desnecessário” e desequilibraram a posição que o Brasil tenta manter, de equidistante dos dois lados do conflito para ser capaz de se sentar à mesa como um dos negociadores da paz.

Segundo um auxiliar muito próximo do presidente, ele mesmo admite ter passado do ponto e ter passado uma ideia que não é sua posição real.

A viagem à Europa servirá para ajustar o discurso, em uma sequência do que começou já na terça-feira quando, ao receber o presidente da Romênia, Klaus Iohannis. Ao fazer o brinde na recepção, Lula condenou claramente a invasão e defendeu a integridade territorial da Ucrânia.

“Em Portugal e na Espanha ele vai reafirmar essa questão da paz, ajustar um pouco a fala. Não nos interessa passar a ideia de que ele é favorável ao que a Rússia fez ou que ele tem algum lado em um conflito”, disse a fonte. “Vai ajustar um pouco a fala, vai reafirmar a questão da defesa da paz. O Brasil não tem lado nesse conflito.”

As reações à fala do presidente, vindas especialmente dos Estados Unidos, foram estridentes. Na segunda-feira, o porta-voz do Conselho de Segurança da Casa Branca, John Kirby, acusou o governo brasileiro de “repetir como papagaio” a propaganda russa e soviética.

No dia seguinte, a porta-voz da Casa Branca afirmou que o governo norte-americano fora “surpreendido” pelo tom do governo brasileiro, que não parecia ser de neutralidade.

Fontes diplomáticas e do Planalto ouvidas pela Reuters admitem que as falas do presidente na China e depois em Abu Dhabi, e o fato dele ter considerado que a Crimeia possa ser mantida em poder da Rússia, causaram um ruído desnecessário. O que foi potencializado pela presença do chanceler russo, Sergei Lavrov em Brasília, na segunda-feira.

Ao lado do chanceler brasileiro, Mauro Vieira, Lavrov aproveitou para afirmar uma similaridade entre Brasil e Rússia nas visões sobre a guerra, o que causou mais incômodo aos europeus e norte-americanos. O Itamaraty se apressou a confirmar que o chanceler da Ucrânia, Dmytro Kuleba, havia sido também convidado por Vieira para vir ao Brasil antes mesmo do convite a Lavrov, mas ainda não havia marcado uma data. O estrago, no entanto, estava feito.

“O timing não foi bom”, diz a fonte palaciana.

Às vésperas de embarcar para a Europa, explicou a fonte, o presidente fez questão de participar da Cúpula Virtual de Grandes Economias sobre Energia e Clima, chamada pelo presidente norte-americano Joe Biden, para demonstrar que não há, do lado do Brasil, nenhuma mudança na relação com os Estados Unidos, apesar das críticas recentes –mesmo sem ter sido avisado com antecedência da doação de 500 milhões de dólares em cinco anos ao Fundo Amazônia anunciada por Biden.

Do lado norte-americano, de acordo com uma fonte, apesar das surpresa com as falas de Lula – e de até ter-se questionado internamente se o Brasil poderia de fato ser um mediador na crise –, a avaliação é de que a relação dos dois países é maior que isso. A crise momentânea teria sido um “tropeço” que não irá abalar o restante da relação.

(Reportagem de Lisandra Paraguassu)

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