O questionamento foi feito em tom de brincadeira. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu um grupo de nove dos principais banqueiros do País para um almoço na primeira quinta-feira de fevereiro e, entre piadas e sorrisos, aproveitou para fazer a cobrança. Puxou a conversa pelo presidente do banco Itaú, Roberto Setubal. Lula contou que é cliente do banco há muitos anos e que havia acabado de receber cerca de R$ 30 mil de seu fundo de garantia. E indagou: ?Roberto, se eu aplicar essa quantia em seu banco, quanto ganho??. Meio sem jeito, Setubal respondeu: ?Mais ou menos 2% ao mês, presidente?. Lula passou, então, a Márcio Cypriano, presidente do Bradesco. ?Sou um dos últimos a manter o cartão de afinidade do PT e do Bradesco?, lembrou Lula. E emendou em seguida: ?Se eu pegar um empréstimo no Bradesco, quanto você vai cobrar?? Cypriano, também sem jeito, respondeu: ?Cerca de 9% ao mês, presidente?. Foi a deixa para Lula dar o bote: ?Tá vendo, é essa diferença entre as taxas que eu quero diminuir?, disse Lula, provocando risadas entre os banqueiros.

A conversa seguiu num tom ameno, com o presidente sempre pedindo aos executivos que encontrassem uma maneira de reduzir o spread, o ganho dos bancos com os juros. Lula só se exaltou num momento. Ao falar dos efeitos das altas taxas para os consumidores, elevou o tom de voz ao dizer que ?não é possível uma dona de casa comprar uma geladeira e pagar duas?. Mesmo assim, o encontro terminou de maneira amistosa e ficou combinado que a Febraban, a associação dos bancos e o Ministério da Fazenda formariam um grupo de trabalho para encontrar maneiras de baixar o spread. ?Ficou claro que essa é uma prioridade do presidente e que ele quer alcançar seu objetivo sem confrontos?, disse um banqueiro que participou do encontro. Mesmo sendo prioridade, a iniciativa não está avançando. Estava programada para sexta-feira passada a primeira reunião entre o primeiro escalão do Ministério da Fazenda e diretores da Febraban. O encontro foi cancelado pela quarta vez, por problemas de agenda do ministro Antônio Palocci.

Mas, mesmo se tivesse sido realizada, não há muito o que
fazer a curto prazo, segundo economistas. Em primeiro lugar, o governo subiu a taxa básica de juros e aumentou o recolhimento
de compulsórios sobre depósitos à vista. Na prática, isso significa que o crédito ficou mais caro. Além disso, todas as mudanças discutidas até agora levam tempo. E Lula tem pressa. As
propostas mais debatidas são as mudanças de aspectos legais
do sistema financeiro, como a Lei de Falências e a execução de garantias. ?No Brasil, o crédito é caro porque é muito difícil para o credor recuperar a sua dívida quando há inadimplência?, afirma Octávio de Barros, presidente da Comissão de Economia da Febraban. O almoço de Lula com os banqueiros é um marco no relacionamento entre o novo governo e o sistema financeiro. Mas ainda vai levar tempo para que as taxas de remuneração e de empréstimo pessoal se equiparem.