23/09/2002 - 7:00
Nos últimos oito meses, o setor de encomendas expressas viveu um período de agonia. Três empresas com menos de três anos de vida fecharam as portas inesperadamente. Nas explicações para esse quadro desolador, há de tudo, dos ataques terroristas aos Estados Unidos à crise da economia argentina. Mas em todos os discursos, um fator permanece constante: a forte concorrência da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, a ECT. Com preços mais baixos e uma extensa estrutura construída ao longo de 339 anos, a estatal parece imbatível, competindo agressivamente em todos os mercados em que atua. Todavia, há também quem pense o contrário e acuse a empresa de esmagar as rivais sob a proteção do seu pretenso monopólio no setor de cartas. ?Nossa missão social não passa pelo favorecimento da concorrência?, avisa o presidente dos Correios, Humberto Mota.
E não passa mesmo. Encerraram as atividades a Total Express, investimento do banco JP Morgan e do GP Investimentos, a Intecom, do maior grupo atacadista do Brasil, Martins, e por último a EBX, do empresário Eike Batista. Juntas, essas companhias investiram
US$ 190 milhões, dos
US$ 330 milhões previstos, mas ficaram sem oxigênio financeiro muito antes do que esperavam. O caso mais emblemático foi o da EBX, que gastou US$ 135 milhões em dois anos de operação com ajuda do fundo americano de investimento Warburg Pincus. ?Nenhuma empresa brasileira tem cacife para enfrentar os Correios na entrega de encomendas expressas?, resigna-se José Carlos Solimeo, da EBX, que permanece como diretor geral da empresa para vender os ativos e reduzir a operação.
A grande vantagem da ECT é a capilaridade e o custo de transporte das encomendas. Colocar um pacote a mais na bolsa de um dos seus 45 mil carteiros espalhados no País é muito mais barato do que criar uma estrutura própria de distribuição e transporte, como fizeram as empresas privadas. Em alguns casos, a estatal pratica preços 20% menores que seus críticos. ?A ECT desvia o lucro da distribuição de cartas para os novos negócios?, afirma Michael Canon, diretor-presidente da DHL, que ao lado da sua irmã americana Fedex e das brasileiras Vaspex e Tam Express permanecem enfrentando a máquina mortífera da estatal. O cenário não é melhor para as companhias que entregam pequenos objetos como cartas e extratos bancários. Baseada numa lei de 1979, a ECT diz que detém o monopólio dos serviços postais no Brasil, mas há uma discussão constitucional sobre esse tema. Nas últimas semanas, a companhia carioca de gás encanado CEG recebeu uma notificação afirmando que eles não poderiam contratar outra empresa para entregar contas de gás. ?É preciso que as empresas se rebelem para não aceitar essa posição dos Correios?, diz Wagner Cambur, diretor de operações da Logistech, a companhia contratada pela CEG para a tarefa.
Mota, dos Correios: ?Nossa missão social não passa pela ajuda da concorrência?
Agressividade. Sem se intimidar, a ECT mantém firmes os planos para expandir seus negócios. E já começa a assustar outros mercados. Em breve anunciará um grande contrato para oferecer serviços de controle de estoque para uma empresa, onde a ECT irá entrar dentro dos armazéns e controlar toda entrada e saída de materiais. Outra novidade é o Banco Postal. Até o final do ano, mais de três mil agências postais estarão abrindo contas e imprimindo extratos para clientes do Bradesco. Nos planos da estatal, há até um projeto de Correio Híbrido. Nele, bancos e outros clientes irão enviar dados eletronicamente para a ECT, que irá imprimir as contas e os carnês com um parceiro perto do local de destino e entregá-los. ?Com isso, várias gráficas que hoje imprimem formulários e depois os enviam pelo correio poderão ser prejudicadas?, diz Mário Camargo, presidente da Associação Brasileira da Indústria Gráfica. Será que alguém conseguirá deter a máquina dos Correios?