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A descoberta de um tesouro de US$ 800 bilhões nas profundezas do litoral brasileiro foi a notícia de maior impacto no mundo do petróleo em muitos anos. O campo de Tupi, que vai da costa do Espírito Santo até Santa Catarina, terá esse valor – meio PIB brasileiro – caso se confirme o potencial de extração de oito bilhões de barris de óleo na região. Numa estimativa conservadora, com reservas de cinco bilhões de barris, Tupi valeria US$ 500 bilhões. Seja como for, é uma montanha de dinheiro, que despertou reações eufóricas e sonhos de grandeza em Brasília – no Palácio do Planalto, o presidente Lula já fala até em ingressar na poderosa Organização dos Países Exportadores de Petróleo, a Opep. O que importa, no entanto, é o mar de oportunidades que esse novo ciclo do petróleo irá abrir para empreendedores brasileiros de todos os portes. Há hoje 20 mil empresas ligadas ao setor de óleo e gás no Brasil – a maioria como fornecedora da Petrobras e dos grupos privados que começaram a atuar no País a partir da abertura do mercado, em 1997. “Depois de Tupi, vamos ter de ampliar ainda mais nossos investimentos”, disse, de Roma, onde participava de um congresso mundial de energia, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli.

 

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SÉRGIO GABRIELLI: depois de Tupi, a Petrobras irá ampliar os investimentos, como os das grandes plataformas marítimas

 

Não é pouca coisa. Há poucos meses, a empresa anunciou o seu plano de negócios de 2008 a 2012, com investimentos totais de US$ 112 bilhões, ou seja, US$ 28 bilhões ao ano. Isso já representa um salto de 300% em relação ao que a Petrobras vinha investindo nos últimos anos. Com o novo campo gigante, os técnicos da empresa estão tendo de refazer suas contas. Isso porque o petróleo de Tupi se encontra em áreas ultraprofundas, a seis ou sete quilômetros abaixo do nível do mar, onde cada plataforma custaria, no mínimo, US$ 4 bilhões. Diante desse quadro, a engenharia brasileira, que ficou estagnada durante muitos anos, volta a viver dias de glória. “O momento atual é o melhor das últimas duas décadas”, garante o empresário Ricardo Pessoa, sócio da UTC (antiga Ultratec) e presidente da Abemi, a Associação Brasileira das Empresas de Montagem Industrial. Sob o guarda-chuva da Abemi estão cerca de 100 empresas, que são os grandes fornecedores da Petrobras – quase todos estão em processo de contratação de pessoal. “Já estamos treinando 27 mil pessoas e vamos precisar de 110 mil novos funcionários no setor de óleo e gás em quatro anos.”

 

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O setor de óleo e gás já treina 27 mil novos profissionais para atuar na exploração

 

A dimensão do desafio foi colocada pelo próprio Gabrielli aos seus fornecedores num encontro recente na Abemi. Deles, o presidente da Petrobras disse que espera menos “criatividade” e mais “agilidade”, com soluções de prateleira que possam ser colocadas rapidamente em prática. “A Petrobras, que sempre foi o vetor de modernização tecnológica nas empresas privadas brasileiras, hoje é também o motor da economia”, avalia o empresário Murillo Mendes, sócio da construtora Mendes Júnior. Murillo foi um dos pioneiros da construção de plataformas no Brasil. Na década de 70, ele entregou para a Petrobras a obra de Pampo, que foi a primeira plataforma projetada e construída no País. Hoje, a estatal voltou a ser o maior cliente da empresa mineira, com contratos de R$ 1,2 bilhão. “A Petrobras representa mais da metade dos nossos negócios”, diz Sérgio Mendes, diretor da construtora. O volume de dinheiro movimentado pela estatal também foi captado pelo radar da Companhia Siderúrgica Nacional. “Hoje, nós não produzimos chapas grossas nem temos a Petrobras entre os nossos clientes”, disse à DINHEIRO Luís Fernando Martinez, diretor comercial da CSN. “Mas, depois da descoberta de Tupi, queremos incluir esse produto no nosso portfólio para atender a empresa”, antecipou.

 

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As oportunidades abertas pelo boom do petróleo vão muito além da prestação de serviços e do fornecimento de insumos. Desde que a Agência Nacional do Petróleo começou a licitar áreas para o setor privado, começaram a surgir empresas brasileiras de exploração de óleo e gás a partir do zero. Foi o caso da Petro Recôncavo, da Bahia, que nasceu em 1997 para operar campos maduros da Petrobras. “Entramos em áreas que já não interessavam tanto para a empresa, nas quais seríamos remunerados pelo serviço e pelo incremento de produção”, aponta Eduardo Cintra Santos, que comanda o negócio. Hoje, a Petro Recôncavo retira, em áreas terrestres, 3,5 mil barris/dia e tem receita estimada pelo mercado em mais de US$ 100 milhões. Em novembro, a empresa irá participar da 9a Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo. “Não existe um novo Tupi em terra, mas, com certeza, há muita riqueza ainda inexplorada no Brasil continental”, diz o sócio da Petro Recôncavo. Da mesma forma, a Starfish, fundada por engenheiros aposentados da Petrobras, também entrará na disputa, focada em áreas terrestres. “O leilão tem tudo para ser um sucesso”, prevê Rafael Doria, sócio da Starfish. As duas empresas, que têm menos de dez anos de vida, vêm sendo assediadas por bancos focados na área de energia e até mesmo eventuais aberturas de capital em bolsa estão em análise.

 

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DE DENTRO PARA FORA: Doria montou uma nova empresa com grupo de aposentados da Petrobras

 

O leilão da ANP, que irá ocorrer de 27 a 29 de novembro, também sofreu os efeitos da descoberta da Petrobras. Dos mais de 300 blocos que seriam licitados, 41 foram retirados por estarem na região de Tupi, que já não é mais considerada uma área de risco. No Palácio do Planalto, avaliou-se que leiloálos agora seria o mesmo que entregar um bilhete de loteria premiado ao ganhador. O maior prejudicado foi o empresário Eike Batista, que recrutou vários técnicos da Petrobras, inclusive o ex-presidente Francisco Gros, e criou a OGX, que já havia captado mais de US$ 500 milhões para participar da 9ª Rodada. Ao que tudo indica, os blocos de Tupi estavam na sua alça de mira. Da mesma forma, a Vale do Rio Doce também se preparava para entrar no setor de petróleo, focada nos campos mais caros e promissores. Com a retirada dos blocos, no entanto, o governo começou a estudar uma nova forma de abrir a exploração de Tupi à iniciativa privada. Primeiro, falou- se num modelo de partilha, em que a maior parte da produção ficaria com a União. No Planalto, houve até quem defendesse o modelo do coronel líbio Muamar Kadafi – no seu país, o risco é privado, mas 85% da receita pertence ao Estado. Como a gritaria foi geral, a tendência é que o governo apenas aumente, por decreto, o valor dos royalties pagos à União. O diretor-geral da ANP, Haroldo Lima, que foi um quadro histórico do antigo Partido Comunista do Brasil, defende uma taxação ao redor de 50%.

 

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Apesar da perspectiva de mudança de regras, até agora não houve abandonos na 9ª Rodada. “Se alguém desistir, será ressarcido das taxas que pagou, mas ninguém recuou”, disse Haroldo Lima à DINHEIRO. Com royalties maiores, o mais provável é que se arrecade menos com a venda dos blocos. Isso, no entanto, não diminui o entusiasmo das empresas ligadas ao setor de petróleo. “Hoje, a Petrobras tem encomendas garantidas para a indústria que vão até 2012”, diz Alfredo Renault, superintendente da Organização Nacional das Indústrias de Petróleo, a Onip. “Com Tupi, teremos outra carteira, que vai gerar estabilidade e garantir escala.” Essas encomendas deram impulso à indústria naval brasileira, que produz grandes petroleiros e plataformas. É o caso do estaleiro Atlântico Sul, que foi instalado no Porto de Suape, em Pernambuco, e tem o controle dividido pelas empreiteiras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão. “Criamos o projeto há apenas quatro anos e já estamos prontos para uma ampliação”, revela Carlos Reynaldo Camerato, presidente do conselho da empresa. “Temos 800 mil metros quadrados no porto e já estamos negociando mais 200 mil.”

 

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DE FORA PARA DENTRO: Simões e Carvalho chegam ao petróleo, depois de lucrar na era da internet

 

O mais surpreendente nesse ciclo do petróleo é a chegada de novos atores, que não tinham relação histórica com o setor de óleo e gás. É o caso dos empresários André Carvalho e Ernesto Simões, que acumularam capital nos mundos da internet e da publicidade. “Dois anos atrás, quando nos associamos, decidimos entrar no setor que seria o mais dinâmico do Brasil num horizonte de 15 anos e escolhemos o petróleo”, diz André Carvalho. O resultado foi a compra da Ecman, uma empresa que presta serviços à Petrobras, como manutenção de dutos, e tem 25 anos de tradição no setor. Além dela, os dois criaram a holding Petro Energy e se preparam para comprar uma empresa de perfuração de poços terrestres, antes de se aventurarem no ramo de exploração. A meta é participar da 10ª Rodada, em 2008, e atingir uma receita, com todos os negócios, de R$ 700 milhões ao fim da década. Ernesto Simões, que acaba de voltar de Houston, a meca do petróleo nos Estados Unidos, foi em busca de sócios americanos e voltou impressionado com o que viu e ouviu. “O Brasil é percebido como a grande fronteira do petróleo”, diz ele. “E grandes companhias americanas, negociadas em bolsa, estão abertas para discutir parcerias com empresas que estão apenas nascendo por aqui.”