Na manhã do dia 22 de novembro do ano passado, os holofotes da mídia estavam direcionados para o saguão principal da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), no chamado centro velho da capital paulista. Em disputa, a concessão de 25 anos do aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim, mais conhecido como Galeão, no Rio de Janeiro, que foi arrematada pelo consórcio liderado pela Odebrecht, com ágio de 294% sobre o valor mínimo estipulado pelo governo federal. A oferta final de R$ 19,02 bilhões, classificada como “ousada” pelos concorrentes, só seria informada ao presidente do Grupo Odebrecht, Marcelo Bahia Odebrecht, horas mais tarde. “Eu estava sendo operado de desvio séptico”, diz o empresário, de 45 anos. Na verdade, os executivos que representavam a construtora, já tinham a ordem expressa para ganhar a disputa, sem dar chances aos demais participantes.

No aeroporto carioca, estão previstos investimentos de R$ 5,7 bilhões para a instalação de 26 pontes de embarques (fingers), um estacionamento para 1.850 veículos, ampliação do pátio de aeronaves e a construção de uma terceira pista. Odebrecht, que assinou o cheque de R$ 19,02 bilhões, garante não ter ficado preocupado com o valor. “É uma outorga que você paga ao longo da concessão, junto com o crescimento das receitas”, diz. “O projeto foi muito bem estudado pela equipe.” A sua “ousadia” no setor aeroportuário é apenas um exemplo do leque de investimentos que o grupo vem realizando nos últimos anos, em diversas áreas. É um processo de diversificação comandado por seu pai, Emílio, que começou no fim da década de 1970, no setor petroquímico, teve um “revertério” no começo do século, nas suas próprias palavras, e que agora foi retomado com força total – atualmente o grupo tem 16 negócios em diversos setores no Brasil e no Exterior, como infraestrutura, empreendimentos imobiliários, petroquímica, óleo e gás e energia.

Marcelo Odebrecht é o líder da terceira geração da família a comandar a empresa – o avô Norberto fundou o grupo, em 1944, e Emílio é o atual presidente do conselho de administração. A sala de Marcelo, no 15º andar do novo edifício-sede, tem como vista um trecho da Marginal do Rio Pinheiros, em São Paulo. Ali acontecem as principais reuniões que definem as estratégias do grupo, que emprega 200 mil pessoas. Para marcar a estreia do novo portal da DINHEIRO, o empresário participou de um bate-papo que durou uma hora e meia. Sem deixar de responder a nenhuma pergunta, ele fez críticas e elogios ao governo Dilma Rousseff, falou sobre erros e acertos nos negócios do grupo e abordou temas espinhosos como a derrocada de Eike Batista e a construção de um porto financiado pelo BNDES, em Cuba. Timidez mesmo só na hora de tirar a foto – de jeito nenhum ele aceitou ser flagrado em público com funcionários por perto.

Aos 70 anos, com faturamento anual estimado em R$ 100 bilhões, o Grupo Odebrecht tem muitas ambições. Uma delas é ajudar a reduzir a carência de infraestrutura do País. “Vejo esses déficits como oportunidade de investimento”, diz Odebrecht. Para isso, a corporação possui dois braços específicos: a Odebrecht TransPort e a Odebrecht Infraestrutura. A primeira foi criada em 2010 e tem o Fundo de Investimento do FGTS como acionista, com 30% de participação indireta no seu capital social. A TransPort atua como gestora de projetos no setor rodoviário, em transporte urbano, como a Linha 6-Laranja do Metrô de São Paulo, aeroportos, como o do Galeão, e portos. Já a Odebrecht Infraestrutura executa obras nos segmentos de transporte e logística, saneamento, desenvolvimento urbano e edifícios de uso público e corporativo.

Por causa do apelo popular, o estádio do Corinthians, em Itaquera, na zona leste de São Paulo, é uma das obras da empresa mais comentadas na mídia e em redes sociais. A liberação do empréstimo pelo BNDES atrasou e acabou elevando o custo da construção, já que o Corinthians teve de buscar recursos no mercado financeiro. Na avaliação do presidente do Grupo Odebrecht, o principal problema foi a escolha do estádio para ser palco da abertura da Copa do Mundo. “Era para ser um estádio pequeno e que custaria entre R$ 300 milhões e R$ 400 milhões, valor que o Corinthians pagaria tranquilamente e que não seria difícil financiar”, diz Odebrecht, que reclamou da demora da Prefeitura de São Paulo e do BNDES para superar a burocracia. “É um absurdo que as outras partes não tenham cumprido o que foi combinado.”

A Odebrecht não vai participar da administração do Itaquerão, como a Arena Corinthians é conhecido. Porém, a Properties, braço do grupo criado em 2012, é a responsável pela gestão de outras três praças esportivas: a Arena Fonte Nova, em Salvador, a Arena Pernambuco, em Recife, e o Maracanã, no Rio de Janeiro. “Não houve um planejamento específico para entrar em negócios de estádio”, afirma. “A Copa gerou a oportunidade de um modelo de PPP (parceria público-privada), que eu achei acertadíssimo.” O empresário não concorda com as críticas de que as obras sempre começam com um orçamento estimado, que nunca é cumprido. “Muitos estádios sofreram com novas exigências da Fifa, que não estavam planejadas”, diz.

Apesar dos inúmeros acertos, o processo de diversificação dos negócios do grupo baiano também trouxe dores de cabeça ao seu comandante. A principal delas vem do setor de etanol. Criada em 2007 com o nome de ETH Energia, num momento em que o futuro do combustível fabricado a partir da cana-de-açúcar parecia promissor, a Odebrecht Agroindustrial já corroeu R$ 10 bilhões em investimentos, sem dar um centavo de retorno. Na época, o combustível contava com o apoio público do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e conquistava a preferência dos motoristas por sua imagem ambientalmente correta. Para continuar crescendo, no entanto, era fundamental que o seu preço fosse competitivo em relação à gasolina. Porém, a partir de 2008, o governo foi reduzindo aos poucos a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), uma taxa que incide sobre o valor da gasolina, até zerá-la em junho de 2012. O objetivo era reforçar o caixa da Petrobras sem repassar o aumento para os consumidores. “A Petrobras teve os 30 centavos de aumento dela e o etanol, não”, afirma Odebrecht, que nutre a esperança de que uma solução será encontrada para o setor sucroenergético. “Vamos continuar investindo em etanol.” Para os próximos três anos, estão previstos R$ 3 bilhões.

Outra área que vai continuar recebendo recursos do grupo é a petroquímica, através da Braskem. Considerado o investimento mais importante na indústria petroquímica da América Latina nos últimos anos, o complexo terá capacidade para a produção de 1,05 milhão de toneladas anuais de polietileno, além de um volume equivalente da matéria-prima eteno, na região de Coatzacoalcos, no estado de Veracruz. Juntos, nos próximos três anos, os 16 negócios do grupo receberão R$ 40 bilhões em investimentos. “O Brasil é um País que não tem risco do ponto de vista macroeconômico”, afirma Odebrecht, cujo leque de projetos o credencia a ser um dos maiores investidores do Brasil.