23/11/2025 - 8:00
Na entrada da cidade de Teixeira de Freitas (BA), a 822 km de Salvador, há uma estátua de uma melancia, mostrando com orgulho o título de capital nacional da fruta. O monumento mostra a fruta de sua forma mais característica: vermelha e com pequenas sementes pretas.
Acontece que, se depender dos processos de melhoramentos genéticos, do gosto dos consumidores e das grandes empresas do agro, a melancia tradicional do futuro pode ser menor, sem sementes e até mesmo amarela. O futuro da fruta foi discutido na cidade do sul da Bahia nos últimos dias 11 e 12 de novembro, no evento Tech Show Melancia, organizado pela Basf.
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Reunindo produtores, distribuidores e representantes do varejo, a companhia alemã discutiu quais os desafios para fazer com que o brasileiro consuma mais melancia. De acordo com o IBGE, foram colhidas 1,78 milhão de toneladas de melancia na safra 2023/2024. A Bahia está na liderança, com 230 mil toneladas.
Apesar do mercado comprador ainda preferir as melancias mais graúdas, com mais de 14 quilos, o xodó do evento foi a Pingo Doce, melancia menor, com média de 5 a 6 quilos, mais adocicada, sem sementes, e em duas versões: a vermelha e a amarela.
A história deste tipo diferente da fruta começou em 2016, quando a Basf, por meio da marca de sementes e hortaliças Nunhems, identificou uma demanda do consumidor por uma fruta menor e mais saborosa. A resposta foi encontrada na Espanha, onde os produtores já tinham colocado no mercado uma melancia com essas características. Golmar Beppler Neto, gerente de Vendas da Basf Brasil da Nunhems, afirmou que após entender todo o processo de produção, resolveu trazer a novidade para o Brasil.
“Em 2016 eu comecei a querer entender como estava o processo de produção de melancias no mundo. Fui até os EUA várias vezes, mas na Espanha é que eu tive uma grata surpresa. Os produtores eram muito tecnificados e entregavam um produto de extrema qualidade. Trouxemos esse híbrido para o Brasil e lançamos a Pingo Doce no final de 2018”, explicou.
É preciso explicar melhor o que o executivo quer dizer quando fala de “híbrido”. A expressão vem da área de genética e é usada quando algumas espécies de uma mesma fruta são combinadas para conseguir modificá-la. Isso pode deixar a fruta mais doce, mais firme, menor, mais saborosa e assim por diante.
Mas essa fruta é modificada artificialmente? É transgênica? Faz mal? A resposta é não. O gerente de Desenvolvimento de Produtos da Basf para América Latina, Antonio Carlos Pierro, explica que o processo de melhoramento genético natural não significa transgenia.
“Ela é um alimento obtido através do melhoramento genético e natural. É um processo que busca imitar em condições controladas processos que já existem na natureza. É muito importante lembrar que todos os vegetais que a gente consome hoje são muito diferentes da forma como eles eram lá na origem, há milhares de anos”, explicou.
Outro exemplo de melhoramento genético são as espécies de cebola que ‘não fazem chorar’, como a Dulciana, desenvolvida pela Bayer, e a Sunion, da própria Basf, elaborada de acordo com as necessidades dos consumidores.
Mercado quer melancias menores e sem sementes

A Pingo Doce é apenas um dos tipos de melancia sem sementes desenvolvida pela companhia. De acordo com Beppler, são mais de 10 e esse mercado deve crescer ainda mais, junto com o das melancias menores, pois além de uma demanda do consumidor, o transporte é facilitado, diminuindo desperdícios para distribuidores e o varejo.
O executivo acredita que uma fruta mais conveniente vai agregar mais valor ao produtor, melhorar a logística e facilitar a vida do consumidor propenso a mais facilidade.
“Nós acreditamos muito que com a democratização dessa fruta sem semente para vários públicos do Brasil, a gente tenha muito mais praticidade, conveniência e uma fruta saborosa. Também será melhor para a logística, pois uma fruta menor é mais fácil de manusear e também para o produtor, que terá uma fruta com maior valor agregado”, acredita.
Na contramão de uma massificação da Pingo Doce, a aposta da companhia é torná-la um produto mais premium. Para exemplificar essa estratégia ele explica que no começo da produção eram mais de 20 produtores desse tipo de melancia no país, esse número caiu para 8 e tende a cair ainda mais conforme às exigências para o seu cultivo aumentem.
Apesar da preocupação da Basf em não saturar o mercado, a produção da Pingo Doce vem aumentando cerca de 15% ao ano e atingiu 35 mil toneladas em 2024 em 1000 hectares plantados.
Ao contrário de culturas que permitem o estoque por dias, semanas e até meses, a melancia é uma fruta com perecividade alta, ou seja, é preciso agilidade no processo logístico. Ele tem que sair da colheita até o consumidor final, na prateleira, em cerca de 20 a 25 dias para não perder as características de dulçor e textura. Um dos maiores desafios da companhia é verticalizar esse processo, o tornando mais ágil.
Produtor aposta em estrutura exclusiva para a Pingo Doce
O produtor Pedro Orita cultiva melancia há mais de 30 anos em Teixeira de Freitas. Desde 2019 ele é um dos principais produtores da Pingo Doce no Brasil. Ele é responsável por mais de 30% de toda a produção da fruta no país, com mais de 350 hectares dedicados somente ao cultivo das espécies amarela e vermelha.
Apesar dos desafios, ele contou à reportagem que ele teve que se adaptar ao novo tipo de fruta, mas que hoje ela ocupa mais de 60% de sua propriedade. A aposta é tão grande que o produtor investiu em um packing para centralizar boa parte do pós-colheita, onde vai processar e embalar cerca de 200 toneladas da Pingo Doce por dia.
“O desafio foi muito grande porque a melancia no Brasil é diferente. Até colocar no mercado leva um certo tempo pra se adaptar. No campo também houve uma dificuldade, porque é uma variedade diferente, que a gente não conhecia. O desafio para chegar a esse ponto de produção foi grande”, encerrou.
