O ano de 2018 começa com uma grande novidade: no mesmo instante em que o mercado de capitais se anima no Brasil com a chegada iminente de novas companhias abertas, uma das vozes mais influentes no mundo dos investimentos afirma que as empresas devem identificar um propósito, além do lucro, para contribuir positivamente com a transformação da sociedade.

Esta é a síntese da carta aberta que Larry Fink, fundador e chairman do fundo de investimentos BlackRock, enviou na terça-feira, 16 de Janeiro, para centenas de CEOs das companhias investidas ao redor do mundo.

Com o título A Sense of Purpose (Um Sentido de Propósito), a mensagem carrega o peso dos mais de US$ 6 trilhões administrados pela BlackRock (o triplo do PIB brasileiro), majoritariamente investidos nos Estados Unidos, mas também em empresas de todos os mercados, inclusive brasileiras.

A carta de Fink explica que é dever fiduciário da BlackRock proteger os interesses dos investidores, em sua maioria comprometidos com objetivos de longo prazo. Diz ainda que a incapacidade dos governos em responder aos desafios do futuro faz com que a expectativa dos públicos sobre as companhias seja tão grande, como jamais visto.

E é claro: “A sociedade está demandando que companhias, públicas ou privadas, sirvam a um propósito social. Para prosperar no tempo, cada empresa deve não apenas entregar performance financeira, mas mostrar como essa performance deixa uma contribuição positiva para a sociedade. Companhias devem beneficiar todos os seus stakeholders, incluindo acionistas, empregados, consumidores e comunidades onde operam”.

Em si, esta não é uma fala revolucionária ou disruptiva. Seu conteúdo já vem sendo propagado há anos por ativistas do desenvolvimento sustentável como Guilherme Leal, da Natura, e Fábio Barbosa, ex-Banco Real, Santander e Grupo Abril.

No entanto, Fink alcança todo o mercado de capitais global e suas palavras chegam até aquele administrador totalmente orientado pelo retorno financeiro de curto prazo ou o mais cético dos conselheiros de empresas – que ainda constituem a maioria.

O mercado brasileiro está às vésperas de ter uma nova onda de abertura de capital de companhias, depois de um período de estagnação. As empresas entrantes, muitas de fora do eixo Rio-São Paulo, chegam com o legítimo desejo de angariar fundos para impulsionar o crescimento. Passarão a ser cobradas por resultados trimestrais e terão decisões influenciadas por novos acionistas, e não apenas seus fundadores.

Este é o momento crítico, no qual o propósito original e a cultura forjada por anos encontram a fria realidade do mercado de capitais. Não é raro que este casamento resulte em confusão, desorientação, perda de identidade – e a supremacia do “curto-prazismo” na tomada de decisão.

Ter, portanto, clareza sobre qual o propósito maior de uma companhia, qual sua grande contribuição para a construção de uma sociedade melhor, muitas vezes presente no impulso inicial de seus fundadores, é o antídoto já adotado por muitas das empresas de sucesso. E agora reconhecido como vital por um gigante do mundo dos investimentos.