Aexpansão recente da liquidez internacional abriu espaço para investimentos classificados genericamente como “alternativos”. São aplicações financeiras que vão além de títulos públicos e privados de renda fixa, ações, moedas e commodities. Podem ser obras de arte, joias, itens colecionáveis e vinhos. Tradicionais em economias maduras, esses investimentos começam a se tornar disponíveis para o investidor brasileiro. A empresa britânica Oeno Group, dedicada à comercialização e à curadoria do investimento em vinhos, realizou uma captação para isso por meio de um crowdfunding no início deste ano, e prepara o lançamento de um fundo de investimentos ainda no segundo trimestre. “A meta é oferecer ao investidor brasileiro a oportunidade de ganhar com rótulos e safras especiais”, disse o sócio da Oeno, Victor Hugo Cotoski.

Atualmente, a Oeno possui um portfólio de 55 milhões de libras (R$ 332 milhões) investidos em vinho, dos quais 10% pertencem a brasileiros. A empresa gerencia essa adega como o gestor de um fundo. Adquire as garrafas após uma análise de seu valor e perspectiva de mercado, e vende quando o lucro parece razoável. Em média, disse Cotoski, a venda ocorre em períodos de três a seis meses, mas há rótulos de safras raras ou únicas que ficam armazenados por vários anos. Um dos maiores investidores é um empresário brasileiro — Cotoski não revela o nome nem se beber muito — que comprou R$ 1 milhão em cerca de 20 garrafas. Detalhe: o investidor é abstêmio. “Ele comprou o vinho como um pecúlio para a família”, disse. Segundo Cotoski, a maioria dos investidores adquire as garrafas para revender. Apenas 10% das compras são destinadas ao consumo. “E isso ocorre apenas entre os europeus.”

Divulgação

“Investir em vinho permite diversificar as aplicações” Victor Hugo Cotoski sócio da Oeno.

A tendência de alta dos preços internacionais do vinho é um fenômeno anterior à expansão da liquidez provocada pela pandemia. É verdade que as medidas de restrição ampliaram e melhoraram o consumo em vários países, o Brasil entre eles. Impedidas de sair, as pessoas compensavam comprando mais vinhos e investindo em rótulos de melhor qualidade. No entanto, os preços começaram a subir com a abertura do mercado asiático. No início da década passada, a China quase não aparecia nas estatísticas. Atualmente, o país é o sexto maior mercado mundial, com 1,24 bilhão de litros consumidos em 2021, um resultado fraco após a pandemia — havia sido quase 1,8 bilhão em 2017. Para comparar, o consumo dos Estados Unidos é de 3,3 bilhões de litros. “E a participação do mercado asiático deverá seguir elevada e crescendo, o que manterá os preços elevados”, disse o professor de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) William Eid Júnior.

Claudio Gatti

“O consumidor brasileiro de vinhos está cada vez mais sofisticado” Carolina Montenegro Fundadora e CEO da plataforma Soma.

APRIMORAMENTO Profundo conhecedor do mercado de vinhos, ele afirmou que o mercado brasileiro ainda é dominado por rótulos “de entrada”, os produtos mais simples (e baratos) produzidos pelas vinícolas. O perfil do consumidor está mudando, mas o caminho à frente é longo. “Consumir vinho é um processo contínuo de aprimoramento”, disse a fundadora e CEO da plataforma de venda de vinhos Soma, Carolina Montenegro. “Quem passa a beber vinhos de melhor qualidade dificilmente retorna para os produtos anteriores.” No entanto, afirmou Carolina, o brasileiro ainda está nos primeiros estágios.
É possível investir em vinho sem temer a ressaca? Vinhos internacionais são uma forma de diversificação. Porém, como qualquer investimento alternativo, o vinho é uma aplicação — ironias à parte — pouco líquida. Ou seja, não é para quem pode precisar do dinheiro no curto prazo. Do ponto de vista puramente financeiro, é mais seguro diversificar as aplicações comprando ações ou títulos de renda fixa de empresas internacionais de primeira linha. E, como qualquer aplicação, o vinho tem risco de mercado — uma safra promissora pode perder a preferência dos consumidores.