25/04/2014 - 20:00
Formado em economia, o santista Carlos Santana, diretor da Interagrícola, subsidiária do grupo suíço Ecom, terceiro maior vendedor de café do mundo, não vivia dias tão agitados desde 2011. Sua empresa vende o produto dos cafezais brasileiros para clientes do porte das americanas Starbucks e Kraft e da suíça Nestlé. Nos últimos três meses, Santana tem sido obrigado a enfrentar uma volatilidade inédita. No início deste ano, uma saca de 60 quilos do grão poderia ser comprada na BM&FBovespa por R$ 276, pouco mais do que o preço de custo.
Em fevereiro, a escassez de chuva nas regiões cafeeiras de São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais indicou que a safra seria ruim, contrariando expectativas iniciais e trazendo incertezas sobre a produção do produto no Brasil. Com isso, fundos de investimento que vinham apostando na baixa inverteram sua estratégia e voltaram a comprar café. As cotações dispararam. Logo após o feriado de Páscoa, o preço da saca chegou a R$ 474, uma alta de 72%. “Mais de um terço do café consumido no mundo é produzido no Brasil. Por isso, qualquer problema aqui movimenta o mercado mundial”, diz Santana. “O mercado, que já é naturalmente volátil, fica ainda mais agitado.”
Na BM&FBovespa, a alta no preço do café fez o Índice de Commodities Brasil (ICB), que mede o desempenho dos contratos futuros, subir 14,2% até meados de abril, desempenho que não ocorria desde 2011. Os preços de outros produtos que compõem o índice, como milho, algodão e boi gordo, ficaram no mesmo patamar, igualmente afetados pela estiagem. A única commodity relativamente estável foi a soja, com uma pequena queda de 0,3%. Nesse caso, os efeitos da seca foram contrabalançados pela safra recorde de 88 milhões de toneladas em 2014. Para aproveitar esse potencial de ganhos é preciso conhecer alguns fundamentos.
Commodities são produtos básicos, agrícolas ou minerais. No Brasil, as mais comuns são negociadas na BM&FBovespa. As mais líquidas são, pela ordem, café, milho, soja, etanol e boi gordo, e seus contratos, à vista ou futuros, são negociados por meio das corretoras ou pelo home broker. Para operar no mercado futuro, é preciso depositar margens de garantia e, no caso de perdas, aportar também os ajustes diários inerentes aos contratos futuros. As commodities são mais arriscadas que as ações por serem mercadorias. Para ter lucro, o investidor terá de encontrar um comprador disposto a pagar mais caro e esse mercado é dominado por gigantes – empresas como Nestlé e Starbucks e tradings que movimentam milhões de toneladas de grãos.
Essa concentração torna os preços mais sujeitos a solavancos e obrigam o comprador a ficar mais atento aos humores do mercado. Vale a pena correr esse risco? Segundo os especialistas, o momento é propício, embora este seja um mercado mais arriscado e volátil do que o das ações. “A seca e a demanda mundial aquecida devem manter os preços em alta por algum tempo”, diz Luiz Eduardo Portella, sócio da gestora de recursos carioca Modal. Segundo ele, os preços de todas as commodities agrícolas devem subir até o fim do ano, com exceção da soja, cujas cotações provavelmente permanecerão estáveis. “A China vem comprando mais grãos desde meados de 2013, e isso fez os produtores brasileiros trocarem o milho pela soja, o que manteve os preços em equilíbrio.”
No caso do café, para tentar saber como os preços devem se comportar até o fim do ano, o investidor deve ficar atento aos números da próxima safra, que começa a ser colhida na segunda semana de maio. “O resultado dessa colheita vai determinar qual foi o efeito da falta de chuva e como o preço poderá ser afetado”, afirma Santana. Segundo um estudo da trading inglesa ED&F Man, os cafezais brasileiros deverão produzir, neste ano, 45,5 milhões de sacas. Isso representa uma queda de 18% em relação à estimativa inicial e uma redução de 15,3% sobre os 53,6 milhões de sacas colhidos na safra anterior.
Para os especialistas, a demanda total de café prevista para este ano é de 146 milhões de sacas. Caso a quebra da safra brasileira se confirme, vão ficar faltando 11 milhões de sacas e os preços devem subir ainda mais. O que esperar para o café? Martha Matsumura, especialista em commodities agrícolas da XP Investimentos, diz acreditar que os preços continuarão a subir, e isso vale não só para o café, mas também para outros produtos afetados pela estiagem. “Este ano deve atrair novos investidores em commodities, aumentando a relevância dos contratos negociados”, diz ela. O investidor que optar pelos fundos de commodities terá poucas alternativas.
Dos quatro fundos multimercados dedicados especificamente a commodities brasileiras, três estão com rentabilidade positiva, dois do Bradesco e um do Itaú. No caso do Bradesco, os fundos Bradesco Private Commodities FIC Multimercado e FI Multimercado renderam, respectivamente, 2,41% e 2,43% no ano, até o dia 16 de abril. O Itaú Personalité Spr Commotities FIC rendeu 2,53%. Segundo Reinaldo Le Grazie, diretor de renda fixa do Bradesco Asset Management, a estratégia desses fundos foi a diversificação. As duas carteiras reúnem até 16 commodities, sendo metade agrícolas. “Nos últimos meses, quem se destacou foram ouro, prata e café”, diz Le Grazie.
De acordo com Le Grazie, o investidor disposto a entrar no mercado de commodities deve ficar atento, pois é difícil e volátil. “Geralmente, o cliente disposto a investir nesse segmento é o de alta renda, que busca diversificação e está focado no longo prazo.” Artur Nehm, analista da Sparta Fundos de Investimentos, empresa que não obteve tanto êxito com seu fundo – recuou 3,31% no ano –, explica que o segmento é de alto risco e que o cenário de volatilidade dificulta um histórico de indicação para o investidor. “Com tanta oscilação, é sempre arriscado indicar se é momento de comprar ou vender nesse mercado. Mas o investidor de longo prazo que quer esperar retorno, é o que mais se encaixa no perfil de quem investe em commodities.”