Operação financeira deficitária, folha de pagamento inchada, ativos sucateados, administração engessada. Essas mazelas são bem conhecidas. Elas compõem o retrato de diversas estatais brasileiras ? com honrosas exceções. A Companhia do Metropolitano de São Paulo, ou simplesmente o Metrô, tem se empenhado para escapar do péssimo diagnóstico corporativo. Em 2004, a empresa auferiu lucro operacional de R$ 26 milhões. Na última linha do balanço, porém, que será divulgado nas próximas semanas, o número virá em vermelho: R$ 300 milhões. ?A diferença refere-se às dívidas de expansão do Metrô. Ainda que esses valores apareçam no balanço, quem os paga é o governo do Estado?, explicou à DINHEIRO o diretor-financeiro José Kalil Neto. ?Que pese a falta de agilidade no modelo de gestão de qualquer estatal, onde tudo é feito através de licitações, só o fato de o Metrô apresentar lucro operacional é um bom sinal?, opina Henrique Fingermann, da Fundação Getúlio Vargas. Mas não há de se buscar uma fórmula em que a companhia honre suas dívidas, livrando o Estado do ônus? ?É impossível. Em todo o mundo, só o de Hong Kong é superavitário?, garante o presidente da estatal, Luiz Carlos David. E detalhe: o passivo vai aumentar. O Metrô está investindo R$ 4,9 bilhões na construção de duas novas linhas em São Paulo.

Para equilibrar suas contas no ano passado, o Metrô recorreu às chamadas receitas não-tarifárias, pois os preços dos bilhetes estavam congelados havia dois anos. ?Aproveitamos o final do contrato da empresa que explorava publicidade nas estações e nos trens e estatizamos a função?, diz David. Dos R$ 200 mil mensais que entravam em 2003 com publicidade, as receitas subiram para R$ 725 mil ao mês. E houve outras soluções: aumento do número de locações de quiosques (para Nestlé e Contém 1g, por exemplo), instalação de painéis luminosos (Nike, Unilever) nas estações e ?envelopagem? de trens (anunciantes como Hipermercado Extra e Nestlé revestiram toda a composição com sua logomarca). Para 2005, a empresa se dedicará a novas ferramentas de mídia, como monitores de vídeo dentro dos vagões. ?Fechamos 2004 com R$ 36,7 milhões em receitas não-tarifárias. Esperamos crescer 14% neste ano?, anuncia Kalil.

Já na ?macroeconomia?, a companhia empreende o maior investimento urbano em execução no Brasil. ?Os R$ 4,9 bilhões serão divididos em duas etapas?, anuncia Luiz Carlos David, advertindo que a fase inicial (cerca de R$ 3,7 bilhões) está sendo custeada pelo governo estadual, com participações do Bird, do BNDES e de um pool de bancos japoneses. ?A segunda etapa será só para a linha 4. Estamos concluindo estudos para abrir nova licitação em junho, no valor de R$ 1,2 bilhão, no formato de PPP?, antecipa. Como diz a lei, o governo estadual arcaria com 20% desse total, restando à iniciativa privada o restante dos investimentos. A recompensa seria a exploração da bilheteria. Para Fingermann, a adoção de uma parceria público-privada (PPP) nesta modalidade de investimento é perfeita. ?Caso a rentabilidade mínima não seja atingida, a lei prevê que o Estado faça um ressarcimento ao parceiro?, explica o consultor. Somadas as duas linhas em construção, o Metrô irá saltar dos atuais 57,6 km (52 estações) para 73,4 km (63 estações). A conclusão é simples: cada km de expansão custa cerca de R$ 300 milhões. Sonhar com um metrô que ofereça a extensão dos trilhos de Nova York (471 km), Londres (408 km) ou Paris (211,3 km) parece inviável mesmo a longo prazo.

Para 2005, a expectativa é evoluir o ritmo das obras e repetir o balanço no azul. Nada mais do que isso. ?O dissídio dos metroviários ocorre em maio. O ganho obtido nos preços das passagens, que subiram 10% no último dia 16, será absorvido pelos reajustes?, diz David. E as relações com o forte sindicato da categoria não andam muito amistosas. Como parte do plano de contenção de custos, o Metrô enxugou 10,5% de seu efetivo desde 2003, focando demissões em administrativos e aposentados (700 pessoas).

Já o ?sucateamento? não preocupa. Os trens do Metrô, alguns funcionando desde a inauguração, há trinta anos, recebem, segundo a companhia, um programa de manutenção semelhante ao dos aviões. ?Temos acompanhamento de cada ?carro? por horas de operação, com manutenção preventiva e corretiva?, explica Kalil. Na prática, o resultado agrada. Em 2004, os paulistanos elegeram o Metrô como melhor serviço público do ano, à frente dos Correios, do Corpo de Bombeiros e do Poupatempo.