Apita o árbitro, abrem-se as cortinas e começa o espetáculo para os investidores em todo o Brasil. Enquanto a maioria dos torcedores espera jogadas fenomenais e dribles estonteantes que valem o ingresso nos estádios de futebol, um grupo mais restrito entra em campo. São os investidores nos direitos econômicos dos jogadores – a figura legal que substituiu o antigo passe. Um pequena demonstração da pujança desse mercado foi dada na segunda-feira 12, quando o fundo DIS, braço esportivo do grupo de supermercados Sonda, anunciou que estava elevando de 45% para 55% a sua participação nos resultados do meia-atacante santista Paulo Henrique Ganso. O craque paraense recebeu R$ 5 milhões pela transação. Foi uma negociação polêmica, que pode ser contestada na Justiça pelo Santos Futebol Clube, dono dos outros 45%. Mesmo assim, ela mostra o crescente interesse em apostar nos futuros talentos dos gramados, como Matheus, filho do jogador Bebeto, campeão do mundo de 1994. Destaque nas categorias de base do Flamengo, o garoto já recebeu convites para treinar na Espanha e pode ascender ao time principal do time da Gávea no ano que vem. 

35.jpg
Treino do Audax: time já lucrou vendendo jogadores

Os direitos econômicos de atletas nessa categoria podem chegar a 1 milhão de euros. “Se o jogador tiver sucesso, o investidor pode ganhar até 10 ou 15 vezes o que aplicou”, diz Atair Oliveira Mendes, empresário paulista que intermedeia transações com os contratos de atletas. Mendes começou a negociar jogadores em 1996 no interior de São Paulo. “No início buscava jovens talentosos e os levava para fazer testes nos clubes.” Ele descobria o jovem atleta, investia dinheiro no treinamento e acertava seu contrato com clubes locais, embolsando uma fatia do pagamento. Hoje, ele mantém uma rede de olheiros espalhados por todo o Brasil que procuram o novo Ganso ou o futuro Neymar ainda ocultos nos campos de várzea ou nas peneiras dos pequenos clubes. O objetivo é encaixar os mais promissores nos clubes de grande porte.  

“O moleque tem a habilidade com a bola e eu conheço os caminhos”, disse Mendes à DINHEIRO, nos intervalos da negociação para a venda de um de seus jogadores para um time português. Qualquer investidor, pessoa física ou empresa, pode procurar um clube e comprar parte dos direitos econômicos e de imagem de um atleta. Se ele brilhar nos campos nacionais e for convidado a bater bola na Europa ou no Japão, o investidor ganha uma fatia da diferença, que costuma ser generosa. Para isso, a estratégia mais recomendada é investir em atletas jovens, a partir de 13 anos de idade, que têm uma carreira mais longa pela frente e, portanto, mais possibilidades de sucesso. Essas transações são reguladas por contratos privados e não são incomuns. 

 

“Quase todos os jogadores têm seus direitos divididos entre vários investidores”, diz Eduardo Carlezzo, advogado paulista especializado em direito esportivo, numa referência ao fatiamento da “propriedade” dos atletas. Como jogar no time de Mendes? O mercado de direitos econômicos de jogadores não é regulamentado, ou seja, mesmo que suas transações sejam perfeitamente legais, elas são contratos fechados entre os investidores e os clubes de futebol. Assim, o melhor negócio é procurar os próprios clubes, que têm sido muito ativos no desenvolvimento de departamentos comerciais. Sempre é bom contar com um advogado para redigir um contrato com prazos, valores e garantias. Aqui vale, mais do que nunca, a recomendação de jamais torcer pelo seu investimento. “O investidor cujo conhecimento de futebol se dá só como torcedor deve contratar alguém para avaliar o potencial do atleta”, diz o advogado Carlezzo.  

 

36.jpg

O craque Ganso recebeu R$ 5 milhões pela venda de 10% do seu contrato

 

É impossível saber qual dos meninos será um novo Neymar ou mesmo um Paulo Henrique Ganso e qual ficará apenas como promessa. Por isso, a prática mais comum dos investidores é diluir o risco, comprando parcelas de direitos econômicos de grupos de 10 ou 15 garotos. “A esperança do investidor é de que ao menos um deles se valorize e seja vendido por alguns milhões de euros”, diz Fernando Pinto Ferreira, economista da Pluri Consultoria, do Paraná. A ideia é que, em um grupo de dez atletas, três ou quatro deles sejam negociáveis. “Não precisa ser craque, mas tem de agregar rentabilidade ao clube”, diz Ferreira, citando como exemplo o zagueiro Puyol, do Barcelona. “Não é um jogador do nível de um Messi, mas tem raça, vende muita camisa e tem bom potencial de marketing.” 

 

Além das pessoas físicas, as empresas também têm ganho com esses investimentos. Há seis anos, o grupo Pão de Açúcar fundou o time Audax, que disputa campeonatos nos Estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. “Os meninos chegam com 10 anos e, a partir dos 14, começam a se concentrar em nossos centros de treinamento,” afirma Thiago Scuro, gerente-geral do Audax São Paulo. Cada geração de jogadores reúne até 15 atletas, dos quais três, em média, chegam às categorias profissionais. O time já ganhou dinheiro negociando o passe do zagueiro Rodney com o Kaiserslautern da Alemanha, por 1 milhão de euros, em 2009. “Também vendemos uma porcentagem do jogador Paulinho, do Corinthians, ao BMG por R$ 1 milhão e revelamos o zagueiro Bruno Uvini, atualmente jogando no São Paulo”, diz Scuro.

 

37.jpg

Gol de lucros: Os jogadores que mais se valorizaram no Brasileirão 2011