Péssima notícia para quem sonha com o primeiro milhão para entrar no seleto grupo dos ricos brasileiros: só R$ 1 milhão na conta não garante mais o visto de entrada. Uma pesquisa realizada pelo site Dinheiro na Web revela que, para a grande maioria dos brasileiros (64% dos entrevistados), não pode ser considerado realmente rico aquele que não tiver amealhado um patrimônio mínimo de R$ 10 milhões. Na outra ponta, apenas 16% dos pesquisados ainda pensam que ser um simples milionário é o bastante, como se acreditava tempos atrás. ?A economia mudou nas últimas décadas e, com ela, a percepção das pessoas em relação à riqueza?, afirma Miguel de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos em Finanças, Contabilidade e Administração (Anefac). Mudaram também os símbolos que representam a presença no topo da pirâmide socioeconômica. Segundo os pesquisados, para estar lá é preciso morar em uma supermansão, dirigir um carro importado de valor superior a R$ 70 mil e ? sinal dos tempos ? ter um helicóptero sempre à disposição, um estilo de vida impossível para aquele que acaba de ultrapassar a barreira que lhe permite ser qualificado como milionário. Com R$ 1 milhão pode-se ter no máximo uma cobertura de 300 metros quadrados no Morumbi, bairro nobre de São Paulo ou então a metade de uma limusine Pullman, da Mercedes-Benz (que custa exatamente o dobro).

?Trata-se de uma grande distorção?, afirma a antropóloga Teresinha Bernardo, professora de Ciências Sociais da PUC de São Paulo. ?As pessoas estão perdendo a noção do dinheiro por considerar como riqueza ícones de poder e status.? Muitos só percebem isso quando realizam o sonho do primeiro milhão. Aconteceu com o empresário Rogério Silberberg, presidente do Fulano.com, site de entretenimento que só no ano passado teve aportes financeiros de R$ 4 milhões.

Aos 19 anos, quando teve a primeira experiência como empreendedor abrindo um espaço de paintball (jogo em que os competidores utilizam pistolas de tintas), com um amigo, alcançar um milhão para ele significava o nirvana ? ou, pelo menos, uma doce aposentadoria precoce. Hoje, com alguns dígitos a mais na conta corrente, sua avaliação é diferente. ?Ser rico é relativo. E R$ 1 milhão não garante isso?, explica. O pensamento de Silberberg se assemelha ao do empresário paranaense Antônio Setin, dono da Setin Empreendimentos Imobiliários. Ele é dono de uma das maiores construtoras de hotéis do Brasil e mesmo assim dá expediente das 7 da manhã às 7 da noite. Se ele precisa trabalhar tanto? ?Sei que não, mas não me imagino na varanda de uma mansão de pernas para o ar.? Para Setin, que não faz parte de nenhuma família tradicional e nem herdou fortunas, trabalho é a palavra chave para se tornar rico. ?E aí considerar R$ 1 milhão ou R$ 10 milhões suficientes vai depender muito de cada pessoa e, principalmente, do momento da vida.?

Setin tem razão. Ter R$ 1 milhão hoje não significa o mesmo poder de compra de cinco, dez ou vinte anos atrás. ?As mudanças econômicas incentivaram uma forte valorização dos ativos e o fim da inflação reduziu e muito a rentabilidade das aplicações bancárias?, diz Oliveira, da Anefac. Exemplo é o mercado imobiliário. Há 20 anos, era possível comprar uma mansão de 600 metros quadrados nos Jardins, bairro chique paulistano, por meio milhão de reais. Hoje, o metro quadrado por lá não custa menos que R$ 1.300. Ou seja, a mesma casa custaria R$ 780 mil. Outro exemplo: imagine alguém que tinha há dez anos investimentos na poupança, quanto a rentabilidade chegou a 82% ao mês. ?Era quase como dobrar o patrimônio em 30 dias?, reforça Oliveira.

Definitivamente, alcançar uma fortuna hoje é mais difícil do que anos atrás. E para que tanto esforço então? Para 29% dos leitores que responderam à pesquisa, a grande vantagem do dinheiro é o respeito que ele impõe. A pesquisadora Ana Matilde Pacheco, professora de psicologia social da Universidade de São Paulo (USP), concorda. ?O rico é mesmo mais respeitado no Brasil, o que é uma grande distorção social.? A empresária Rosa Cruz, dona da Just Kenar, loja que representa no Brasil sete grifes americanas de roupas, prefere acreditar que esse respeito está relacionado ao desempenho profissional. ?Sou respeitada sim, mas pelo que faço e não pelo que tenho.? Para Rosa, a grande vantagem em ter dinheiro é poder trabalhar por prazer. Agora, se você quer uma definição do que é ser rico, Rosa tem uma: ?É nunca passar calor?. Ser rico é poder dizer isso, em pleno país tropical.