19/09/2012 - 21:00
Para conter a crise econômica que atinge a Europa e melhorar a arrecadação, uma das medidas que vêm sendo adotadas pelos governos do continente é aumentar a tributação sobre as grandes fortunas. Mas o bilionário francês Bernard Arnault, o homem mais rico da Europa, dono de um patrimônio de US$ 41 bilhões, mostrou que essa estratégia pode resultar em um fiasco. O proprietário do império do luxo LVMH, que controla grifes tradicionais como Louis Vuitton, Givenchy e Dior, entrou com o pedido de cidadania belga. Com isso, o próximo passo poderá ser a troca de domicílio fiscal, escapando da fúria arrecadatória do governo socialista do presidente François Hollande.
Saindo de fininho: o matreiro Arnault, dono do maior império do luxo
do mundo, mais uma vez faz de tudo para pagar menos tributos.
Uma das medidas incluídas no pacote econômico anunciado é a elevação da alíquota do Imposto de Renda, de 41% para até 75%. Isso atingiria um seleto grupo de 29 mil contribuintes com rendimentos anuais acima de € 1 milhão. O pacote com as mudanças fiscais na França deverá entrar em vigor em 2013 e foi uma das bandeiras do político socialista, vencedor da eleição realizada em maio, quando derrotou o então presidente Nicolas Sarkozy, ligado a Arnault. Na semana passada, o bilionário francês negou que a opção pela cidadania belga tenha relação com a proposta de adoção de uma nova política tributária. A decisão atenderia ao desejo de fortalecer os laços com seu ramo familiar que vive na Bélgica.
Prova disso, disse em nota oficial, é que pretende manter seu domicílio fiscal na França. O discurso esbarra nos fatos. Quando da ascensão do socialista François Mitterrand ao poder, em 1981, Arnault “se exilou” nos EUA, de onde retornou apenas três anos depois. Na verdade, especula-se que, desta vez, a Bélgica entraria em seu roteiro apenas como uma parada estratégica antes de se fixar em Mônaco, conhecido paraíso fiscal. Isso abriria caminho para uma disputa diplomática – a França, por sinal, já ameaçou rever acordos fiscais com a Bélgica, caso acolha o bilionário. Para Marcio Sampaio, professor de contabilidade da Trevisan Escola de Negócios e ex-controller da LVMH no País, é uma questão de tempo para que Arnault mude o endereço de seus negócios.
“Nos quatro anos em que trabalhei na empresa, ele era conhecido por tomar atitudes inesperadas”, diz Sampaio. “Pelo que conheço, seu objetivo é deixar de pagar impostos na França.” Apesar do rebuliço causado pela decisão do dono da LVMH, a fuga de milionários franceses não é recente. É verdade que vem ganhando força nos últimos anos, quando centenas de figuras “menos abonadas” decidiram cruzar a fronteira em direção aos países vizinhos. Estão entre eles nomes como o cantor Charles Aznavour, o galã Alain Delon, o ex-craque de futebol Zinedine Zidane e o campeão de rali e piloto de provas da equipe Redbull de Fórmula 1, Sébastien Loeb. Um caso emblemático é o do jovem tenista Jo-Wilfred Tsonga.
Nem bem começou a faturar alto, ele já se mandou para a Suíça. Sétimo colocado no ranking mundial, ele vive em uma bela mansão em Gingins, cidade do cantão de Vaud. Mas com as mudanças na tributação, que deverão entrar em vigor apenas em 2013, o temor é de que mais e mais milionários deixem a França, colocando em risco a meta de arrecadação adicional de € 33 bilhões. Os mais abonados devem ser instados a colaborar com uma fatia de € 330 milhões, equivalente a apenas 1% do total. “Tributar grandes fortunas é considerado uma medida demagógica”, afirma Amauri Liba, professor de contabilidade e planejamento tributário da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap).
“No caso francês, está ficando cada vez mais evidente que a decisão não deve resultar no efeito esperado na arrecadação.” Atualmente, a alíquota máxima de imposto cobrada dos franceses, em geral, é de 41% sobre o rendimento. No caso dos mais ricos, também entra no cálculo um adicional de até 1,8% referente ao Imposto Solidário sobre Riqueza, que incide na faixa a partir de € 790 mil de rendimentos anuais. Além de gerar uma receita vinsignificante para o equilíbrio das finanças da França, a cobrança extra pode produzir um efeito deletério sobre o ânimo dos capitalistas locais, desestimulando-os de investir em seu próprio país.