Membro do Centrão, grupo de deputados da base aliada do presidente Michel Temer ligados a 13 partidos que vão do PP ao PSD, Carlos Marun (MDB-MS) tem sido chamado de o general da Tropa de Choque. Primeiramente do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e depois do próprio Temer. Foi o maior defensor de Cunha e lutou até o fim para que ele não fosse cassado. Depois, sua atuação à frente da CPI da JBS pressionou o Judiciário a rever os termos da delação premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista, negociada com o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Marun também liderou a bancada governista nas votações que arquivaram as denúncias contra Temer. Agora, à frente da Secretaria de Governo, Marun tem a missão de arrebanhar os votos para aprovar a Reforma da Previdência. Porém, o ministro, empossado em 15 de dezembro, tem vivido para apagar incêndios. Alguns, iniciados por ele mesmo. Nesta entrevista, o “general” diz ter salvado Temer de uma conspiração e garante que conseguirá os votos necessários para aprovar a reforma previdenciária.

DINHEIRO – Em poucos meses, o senhor já enfrentou algumas crises no governo. Qual o balanço desse período?

CARLOS MARUN – Acredito que esse período está sendo positivo. Um momento de muito trabalho, mas que vai dar resultado. Nós vamos conseguir essa que é a mais importante das coisas importantes e a mais necessária das necessidades: a Reforma da Previdência. Para conseguirmos isso, vamos precisar avançar em questões chave como a da Caixa [leia reportagem aqui]. São pedras que aparecem no caminho.

DINHEIRO – Essa, justamente, é a crise mais recente. A influência política no comando da Caixa prejudicou a companhia?

MARUN – A verdade é que, com o afastamento [dos quatro vice-presidentes da Caixa], foi dada a esses servidores uma oportunidade de defesa. Apenas isso. Além disso, entendo que a Caixa está indo muito bem. O banco está conquistando mercado ao prestar um excelente serviço ao País. Temos a mais absoluta convicção de que ela avançou em questões na qualidade do crédito, aumentando em 20% no volume negociado. Se houve indicações políticas ou influência em alguma nomeação, eu não estava no governo naquele momento. Mas garanto que elas não foram, de fato, prejudiciais à Caixa. Digo isso porque ela está indo muito bem. Ela está conquistando espaço entre os outros bancos.

DINHEIRO – Deputados da base aliada dizem que o imbróglio envolvendo os vice-presidentes da Caixa, muitos indicados por políticos da base, enterra a Reforma da Previdência. O senhor concorda?

MARUN – Não acredito que isso venha a impactar a Reforma da Previdência. Estamos fazendo o que é certo. Vamos aprovar a Reforma fazendo o correto. E não fazendo a coisa errada. Não acredito que isso venha prejudicar.

DINHEIRO – Na sua conta, quantos deputados faltam para conseguir a aprovação na Câmara?

MARUN – Falta algo próximo de 50 a 60 votos. Mas tenho certeza de que vamos chegar lá. Se tirarmos uma fotografia, caso a votação da Reforma fosse hoje, eu diria a você que ainda não temos esses votos. Mas isso não é nem novidade e nem pessimismo. É uma realidade. Porém, posso com tranquilidade afirmar que no dia 19 de fevereiro vamos ter esses votos.

DINHEIRO – Quais são as cartas que o senhor possui na manga para fazer isso acontecer? Até porque, a sua função é arrebanhar os votos…

MARUN – Neste momento, as cartas que tenho são o apoio da população, que é crescente. Os deputados e as deputadas estão sendo pressionados em suas bases eleitorais para votar a favor. A população está começando a se conscientizar. Com o trabalho da imprensa, com a publicidade do governo, a população começou a se conscientizar da necessidade de aprovar a Reforma. Quando aumenta o esclarecimento, aumenta o apoio à Reforma. Se as pessoas estivessem, hoje, esclarecidas sobre esse assunto, teríamos o apoio de 90%.

DINHEIRO – Mas ainda há receio entre os deputados. Como combater os argumentos contrários à aprovação?

MARUN – Não há argumentos contra a Reforma. Não há qualquer debate em torno das questões da Reforma. Ninguém debate. Ninguém pode defender os aspectos absurdos da atual legislação. Existe uma consciência absoluta e quase unânime de que é preciso aprovar. Isso é muito importante. A oposição, que é contra o governo, sabe da necessidade de aprovar o texto. Mas ela é contra o governo, então se posiciona contra. E existem alguns deputados da base aliada que têm algum tipo de receio sobre isso por questões eleitorais. Essa mudança de pensamento da população é uma das coisas mais importantes que podem acontecer, porque isso tira esse medo dos deputados. Eles ficam com mais confiança de votar da forma correta. Esse é o principal destaque que temos hoje.

O governo escolheu o dia 19 de fevereiro para votar a Reforma da Previdência. Porém, sabe que ainda não possui os votos necessários (Crédito:Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

DINHEIRO – Mas e a manutenção dos privilégios de políticos e do Judiciário? Esse não é um argumento contra a Reforma?

MARUN – Isso não é verdade. Estamos estabelecendo que os políticos, a partir dessa Reforma, terão a mesma responsabilidade de qualquer cidadão. O político vai ter de aposentadoria pública o teto de R$ 5.300. Para receber mais do que isso, ele vai ter de fazer uma contribuição extra, seja para um fundo privado ou para um fundo corporativo, para complementar sua aposentadoria. Juízes também vão ter de fazer isso. E mais do que isso: os políticos também vão ter que trabalhar mais de 35 anos. O que vai acontecer é que ele somará o tempo de mandato ao tempo de contribuição de outras atividades. Esses argumentos [de privilégios] são absurdos. Não estamos mais na era do político que se aposenta com dois mandatos. Se ele aposenta pela idade correta, após contribuir o tempo necessário, ele pode se aposentar pelo teto. É claro que não vai precisar de 35 anos de mandato. Ele vai receber proporcionalmente ao valor de sua contribuição ao longo do tempo. Nós estamos colocando nossos políticos na mesma categoria dos cidadãos. Todos os brasileiros terão o teto de R$ 5.300. Dali para frente, para receber mais, eles terão que contribuir com valores extras.

DINHEIRO – No fim do ano, o governo passou a adotar o discurso da “reforma possível”. Hoje, qual é a reforma possível?

MARUN – A reforma possível e necessária não pode se afastar de dois pilares: idade mínima e o fim dos privilégios.

DINHEIRO – Privilégios do funcionalismo público?

MARUN – De quem for. De todos.

DINHEIRO – Também no fim do ano, o senhor envolveu-se em uma polêmica com governadores do Nordeste. Alguns o acusaram de chantagem por negociar verbas da Caixa em troca de votos para a Reforma. O que aconteceu nesse episódio?

MARUN – Aconteceu que quem falou em chantagem mentiu. Ninguém foi e nem vai ser chantageado por mim. Foi algum cafajeste que falou isso. É fato que quem está no governo tem de fazer o que é necessário. Nessa caravana da hipocrisia, muitos dos que criticam durante o dia, rezam, à noite, para a Reforma da Previdência ser aprovada. Porque sabem que ela é necessária. E eu não sou hipócrita. Não uso do expediente da chantagem, mas venho com um argumento forte, pedindo o apoio de todos, porque é necessário. Falo para eles que mesmo os seus Estados, que parecem saudáveis, em 10 anos, se seguirem da maneira como as coisas estão hoje, também enfrentarão seriíssimas dificuldades financeiras. Há 10 anos, ninguém imaginava que um aposentado poderia não estar recebendo sua aposentadoria. Eu não chantageei ninguém. Apenas estou pleiteando a todos que ajam com responsabilidade. Mais responsabilidade e menos demagogia.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge (Crédito:Mateus Bonomi/AGIF)

DINHEIRO – Outra crise atual é o problema jurídico em torno da nomeação de Cristiane Brasil para o Ministério do Trabalho. Por que o governo evitou entrar no STF para derrubar as liminares que impedem a nomeação?

MARUN – Sobre o caminho jurídico que está sendo percorrido, não tenho condições de comentar. Mas, em relação aos recursos para essas decisões, acredito que estamos apenas buscando o bom senso. E vamos continuar fazendo isso. Porque não há normativa que permita que a Constituição seja desrespeitada do jeito que está sendo. E nós não podemos fingir que nada está acontecendo. O artigo 84 da Constituição [que diz que compete privativamente ao Presidente da República a nomeação de Ministros de Estado] precisa ser respeitado.

DINHEIRO – O senhor primeiro foi chamado de general da Tropa de Choque de Eduardo Cunha. Agora de Temer. O que pensa sobre isso?

MARUN – Eu já comentei várias vezes sobre isso. Eu me sinto um protagonista do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Falo isso porque atuei para que Eduardo Cunha permanecesse à frente da Câmara até aquela sessão histórica de 17 de abril de 2016. Todo mundo sabe que o ex-deputado foi o líder do processo de impeachment. E, na verdade, insisto que, no processo de cassação de Cunha, que foi julgado na Câmara – e eu sou advogado –, não havia razões para que ele fosse cassado. Não conheço os processos seguintes, mas naquele, não havia razões. Depois, virei o general da tropa de choque de Temer porque eu não sou uma pessoa medrosa. Sou temente a Deus, lógico, mas não é uma característica minha ter medo. E o que eu não tenho é falta de determinação. Se eu, como deputado, fui um dos protagonistas do processo de impeachment, é porque eu sabia que Temer assumiria o governo. E eu acreditava em seu projeto de governo. Eu acreditava e ainda acredito. E quando eu vi aquela conspiração…

DINHEIRO – Conspiração?

MARUN – Sim. Aquela montada para afastar o presidente. Eu tive ainda mais ânimo para me posicionar contra o antigo governo e defender o presidente. E assumi o meu papel, que foi importante para que a conspiração acabasse.

DINHEIRO – Mas de qual conspiração o senhor está falando? A delação dos irmãos Batista?

MARUN – A delação em si não, mas o contexto. Enquanto estive à frente da CPI da JBS, fiquei ainda mais convicto dessa conspiração.

DINHEIRO – Então, quem eram os conspiradores? O senhor tem nomes?

MARUN – Os conspiradores eram o senhor Rodrigo Janot, então procurador-geral da República, Marcelo Miller, seu braço direito, e os irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS.

DINHEIRO – O PT não estava envolvido?

MARUN – A conspiração não guardava relação com o PT. Isso é algo que deve ser investigado. Inclusive a CPI indicou à Procuradoria-Geral da República (PGR) para que o órgão aprofundasse as investigações sobre a delação. Um ponto que tive certeza sobre esse processo é que o único objetivo deles era derrubar o governo.

DINHEIRO – E como vê o trabalho da nova procuradora, Raquel Dodge?

MARUN – Ela é serena. Assumiu sem esses interesses. O Janot tinha o objetivo de levar a PGR a assumir uma função maior do que de fato tem. Mas, sobre a Raquel Dodge, entendo que ela tem feito um bom trabalho.