28/09/2005 - 7:00
Até que ponto uma empresa pode diversificar o seu negócio? Existe um limite para que as coisas não fujam ao controle? Ou é possível dar um bico no conceito de ?core business? e ter um portfólio que englobe talheres, bombas para banheira, tesouras, gizes de cera, alicates de unha, massinhas de modelar, panelas, botões para roupas, facas, morsas e xampus? A gaúcha Mundial SA, dona das marcas Eberle, Hércules e Mundial e famosa fabricante de facas e tesouras, está provando que é possível atirar com competência para todos os lados. Seu catálogo, que já traz os itens citados acima, acaba de ganhar lâminas e cremes de barbear.
?Não queremos concorrer com a Gillette, dona de 80% do mercado de lâminas, que é de R$ 1 bilhão ao ano?, diz Ricardo Favarão, diretor-geral da companhia. ?O objetivo é outro: aumentar a visibilidade da marca Mundial. Precisamos capitalizar a empresa. Em 2006, iremos ao mercado tentar levantar cerca de R$ 60 milhões.? A Mundial tem 50% de seu capital pulverizado na Bovespa. Essa capitalização é essencial para dar seqüência ao reposicionamento que está salvando a companhia ao mudar o seu perfil ? de simples manufatura para uma empresa voltada ao mercado, com produtos de consumo.
Cinco anos atrás, a Mundial estava quase falida. Tinha a voraz Tramontina nos calcanhares, sobreposição de produtos em algumas marcas, falta de itens em outras, e dívidas de arrepiar: R$ 700 milhões com o Fisco (depois renegociadas no Refis) e R$ 30 milhões com fornecedores (hoje quitadas). Mais: grande parte da receita vinha da produção para terceiros. ?Corríamos o risco de nos tornar meros fabricantes de aluguel, sem marca, sem valor e sem perspectiva de enfrentar os chineses no longo prazo?, diz Michael Ceitlin, herdeiro e superintendente.
As mudanças começaram como de costume: das sete fábricas, sobraram duas, e o número de funcionários caiu de 12 mil para 2,8 mil. Até uma divisão que produzia motores elétricos e representava um terço do faturamento foi passada adiante. ?Era difícil competir com a Weg. Investíamos ou deixávamos o segmento?, diz Favarão. Em 2004, a subsidiária foi vendida por R$ 114 milhões ? que estão bancando a reestruturação, baseada na readequação das marcas do grupo. ?Elas eram tradicionais e conhecidas, mas, em função das dificuldades financeiras, estavam abandonadas?, relembra Alex Sugai, diretor da consultoria FutureBrand, que coordenou o trabalho. ?Hoje, elas guiam o grupo.? Tanto que a queda no faturamento provocada pela venda da unidade de motores já foi compensada. ?Atingiremos os mesmo R$ 420 milhões de 2004, mas com rentabilidade 60% maior?, diz Favarão.
Qual a mágica? Ao estilo Nike, a Mundial passou a licenciar suas marcas para ampliar as linhas de produtos. Só este ano, 600 novos itens foram lançados assim ? de escovas de cabelo a grampeadores. A empresa faz pesquisas, desenvolve os produtos e procura quem possa fabricá-los na China; um importador os traz ao Brasil, os distribui e ainda paga royalties de até 23% à Mundial. Um negócio da China que deve deixar R$ 8 milhões limpos no caixa do grupo este ano. ?Licenciamos produtos de baixo valor agregado?, explica Marcos Sabbag, gerente de marketing. ?Nas linhas em que a alta qualidade faz a diferença, como facas profissionais, continuamos produzindo nós mesmos.? Isso reflete nas exportações, que já atingiram 18% das vendas totais graças ao reconhecimento internacional dos itens mais sofisticados. ?Planejamos até abrir uma loja na Austrália, onde temos 60% do mercado de facas forjadas?, entrega Favarão. Eis o embrião de um novo negócio no mar de negócios em que já nada a Mundial ? a aventura no varejo.