Será que o alerta vermelho dos cientistas vai servir para colocar os governos para trabalhar? Representantes de cerca de 200 países vão tentar, a partir de domingo (2), na Polônia, fazer avançar o Acordo de Paris, mas teme-se que o resultado seja insuficiente para responder à urgência climática.

O pacto, assinado em 2015, tem como objetivo conter o aquecimento global abaixo dos 2ºC, idealmente a 1,5ºC, com relação à era pré-industrial.

Mas os compromissos atuais dos países para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa levariam a um aumento de 3ºC até o fim do século. A temperatura do planeta já subiu 1ºC e os últimos quatro anos foram os mais quentes já registrados.

Para se ajustar ao limite de 1,5ºC, as transformações devem ser rápidas e sem precedentes, advertiram, em outubro, cientistas da ONU. Esta semana, um relatório da organização assegurou que os esforços deveriam quintuplicar com relação às promessas incluídas no Acordo de Paris em 2030.

Mas os observadores temem que as advertências científicas não bastem para dar novo impulso à luta contra as mudanças climáticas durante a 24ª Conferência da ONU sobre o Clima (COP24), que será realizada em Katowice até 14 de dezembro.

– “Enquanto Roma arde” –

“Isto nos lembra de Nero, que toca música enquanto Roma arde. A falta de ritmo e de ambições é simplesmente inaceitável”, comentou Andrew Steer, especialista do World Resources Institute.

Segundo o calendário estabelecido pela COP21, em Paris, os países estão convidados a apresentar em 2020 seus compromissos revisados. Katowice deveria permitir esboçar estas novas ambições no âmbito de um diálogo político, denominado “Talanoa”.

Apenas alguns poucos chefes de Estado e de governo confirmaram até agora presença na cúpula que começa segunda-feira (3) em Katowice, entre eles os chefes dos Executivos espanhol (Pedro Sánchez), francês (Emmanuel Macron) e holandês (Mark Rutte).

“Os grandes países não vão concretizar nada”, à espera de outra cúpula organizada pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, em setembro de 2019, em Nova York, prevê Alden Meyer, veterano observador das negociações do clima.

– Brasil é incerteza –

A posição do Brasil é incerta, depois de o presidente eleito, Jair Bolsonaro, questionar o Acordo de Paris, e do futuro chanceler, Ernesto Araújo, qualificar o contexto atual de “alarmismo climático”. Além disso, o governo em fim de mandato de Michel Temer anunciou a desistência de o país sediar a COP25 no ano que vem, a pedido de Bolsonaro.

O presidente americano, Donald Trump, que retirou seu país do Acordo, reagiu esta semana com um taxativo “Não acredito” ao relatório de sua própria administração sobre os efeitos desastrosos dos desarranjos climáticos para a economia americana.

Quanto à Polônia, país-sede da reunião, muito apegado à sua indústria de carvão, a prioridade não é tanto a questão das ambições, mas sim a adoção de regras de aplicação do Acordo.

“Sem Katowice, não há (Acordo de) Paris”, disse recentemente o polonês Michal Kurtyka, presidente da COP24.

Este manual contém em particular as regras de transparência, ou seja, a forma como os países prestam contas de suas ações, financiamentos e resultados, bem como o grau de flexibilidade acordado aos países mais pobres.

– “Transição justa” para os trabalhadores –

No que diz respeito aos países mais pobres, estes sem dúvida vão lembrar às nações do Norte sua promessa de elevar a 100 bilhões de euros ao ano até 2020 as contribuições financeiras para as políticas climáticas do Sul.

“Katowice deverá avançar no tema do financiamento ou nos encaminharemos para a catástrofe”, informou à AFP Amjad Abdullah, negociador do grupo de Estados insulares.

O Acordo de Paris defende, ainda, que os fluxos financeiros sejam compatíveis com o combate às mudanças climáticas, ou seja, com uma economia de baixas emissões.

“Estamos falando de 5 trilhões de dólares”, que teriam que ser desviados das energias poluentes para as limpas, destacou Benoit Leguet, diretor do Think Tank I4CE (Instituto para as Mudanças Climáticas).

Outro assunto sobre a mesa proposto pela Polônia, a chamada “transição justa”, contempla apoiar os trabalhadores dos setores mais afetados pela transição ecológica, como sua indústria de carvão.