21/10/2011 - 21:00
A crise na Europa vem custando caro aos investidores em ações. No ano, até meados de outubro, o Índice Bovespa caiu quase 21%. A boa notícia é que, mesmo assim, algumas empresas estão conseguindo resistir aos maus humores do mercado, mostrando que suas muralhas são bastante resistentes à crise. Como fazer para identificá-las e escolher as ações cujas defesas são mais resistentes? O processo é um tanto trabalhoso, mas está ao alcance de qualquer investidor. Para fazer isso, é preciso definir os melhores setores para investir e, em seguida, localizar as melhores alternativas neles disponíveis. Essa técnica de análise que parte dos números grandes para os pequenos é chamada de top-down, cuja tradução mais aproximada seria “de cima para baixo”. Nesse método, o analista avalia os grandes números da economia, como o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), os movimentos do câmbio, dos juros e da inflação, e os humores do comércio internacional, para decidir quais segmentos da economia possuem as melhores perspectivas.
Como está esse quadro? Os especialistas avaliam que a economia brasileira deverá ter um desempenho melhor do que a internacional. O último relatório Focus, do Banco Central (BC), indica que os prognósticos do mercado são de um crescimento de 3,5% do PIB neste ano e de 3,7% no ano que vem. Para os países desenvolvidos as previsões são bem menos otimistas. As projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para os Estados Unidos apontam para um crescimento de 1,5% em 2011 e de 1,8% em 2012. Para os países da zona do euro os números são ainda piores. O crescimento previsto para este ano é de 1,6% e para o próximo cai para 1,1%. Se as economias não crescem, as empresas não vendem e não lucram. Portanto, a recomendação é buscar setores mais voltados para o mercado interno, como o comércio, ou então os que vão bem quer chova quer faça sol, como as companhias de energia elétrica e de telefonia, por exemplo.
Após escolhido o setor, é hora de procurar as melhores oportunidades dentro dele. Como a crise não parece oferecer nenhum sinal de arrefecimento, a sugestão é preferir empresas cujas muralhas financeiras sejam inexpugnáveis. Ou seja, companhias que tenham boa geração de caixa, pouca exposição a dívidas e executivos competentes. Finalmente, é preciso saber se os preços em bolsa estão altos ou baixos. Companhias cujos setores devam sofrer, no caso de piora no cenário global, devem ser evitadas, mesmo que mostrem vários pontos fortes: suas vantagens individuais serão insuficientes para conter as adversidades da economia. As ações de energia elétrica e de telecomunicações são os destaques do momento. Nos primeiros nove meses do ano, os índices de ações desses setores acumulam ganhos respectivamente de 3,2% e 13,2%.
“Esses dois segmentos têm sido beneficiados pelo aquecimento da economia brasileira e pela garantia de que as tarifas serão corrigidas pela inflação, medida pelo IGP-M (Índice Geral de Preços de Mercado, da Fundação Getulio Vargas)”, diz Sérgio Manoel Correia, economista da LLA Investimentos. “Um eventual calote de algum país europeu não terá nenhum impacto negativo nessas empresas.” A corretora paulista Planner destaca a geradora de energia AES Tietê como boa opção de compra, pois ela distribui trimestralmente 100% do lucro sob a forma de proventos, tem poucas despesas com investimentos e as hidrelétricas que possui vão continuar sendo boas geradoras de caixa. A mais querida em telecomunicações é a Telesp, agora Telefônica Brasil, que incorporou a Vivo e acabou de pagar dividendos.
“O calote grego é bastante provável e deve afetar as ações dos bancos”
Clodoir Vieira, economista-chefe da corretora Souza Barros
As empresas de água e saneamento como a paulista Sabesp e a mineira Copasa também são portos seguros, pois têm as mesmas vantagens das companhias de energia elétrica e de telecomunicações. No entanto, elas oferecem um risco adicional: por serem estatais, seu lucro pode ser destinado à expansão das redes de abastecimento de água, em vez de parar no bolso dos acionistas. “Não é errado do ponto de vista social, mas é menos interessante para o investidor”, diz Clodoir Vieira, economista-chefe da Souza Barros. O varejo também é considerado uma alternativa saudável para investimento, pois ganha com o contínuo crescimento da renda do brasileiro. Entretanto, o investidor tem de tomar cuidado com a diversidade do setor. A margem de ganho das farmácias é menor do que a das lojas de vestuário, por exemplo. As preferidas do varejo são Hering e BR Malls. Quais setores evitar? O setor bancário, sempre presente nas recomendações, é considerado arriscado neste momento.
Primeiro, porque seus resultados podem sofrer, caso algum de seus pares na Europa não honrar o que deve. Segundo porque a retração dos mercados internacionais vem dificultando a captação de recursos no Exterior. As águas ficaram mais agitadas, ainda, com a perspectiva cada vez mais nítida de que a Grécia não será capaz de honrar seus compromissos financeiros. “Nesse cenário, os bancos vão sofrer”, diz Vieira. Para quem quiser ignorar esses riscos e apostar nos bancos, a bola da vez é o estatal gaúcho Banrisul, justamente por não ter negócios lá fora. Na mesma linha, as companhias aéreas e os frigoríficos estão nos últimos lugares na preferência dos especialistas. As empresas aéreas serão fortemente prejudicadas pela alta do dólar, que reduz a demanda por viagens e eleva seus custos, e os frigoríficos brasileiros vendem bastante para Europa e Rússia, que devem reduzir as encomendas nos próximos meses.