Tendo como base a eleição de 2014, um em cada quatro deputados federais teria ultrapassado o teto de gasto de R$ 2,5 milhões proposto em projeto de lei pelo relator da reforma política na Câmara, Vicente Cândido (PT-SP). O texto será debatido nesta terça-feira no plenário da Casa. Dos 513 parlamentares, 122 deles (24%) gastaram mais do que o limite apresentado na proposta de Cândido.

No caso de Arlindo Chinaglia (PT-SP), parlamentar campeão de gastos, a proporção é quatro vezes maior. A campanha do petista custou R$ 10,2 milhões (valores atualizados) em 2014, segundo levantamento realizado pelo cientista político Jairo Nicolau, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Se mantidas as atuais regras, no ano que vem as eleições majoritárias e proporcionais terão financiamento exclusivo de pessoas físicas. Em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inconstitucionais as doações empresariais. Pela lei, somente pessoas físicas podem doar a candidatos sob o limite de 10% do seu rendimento no ano anterior à campanha.

Senado e Câmara têm hoje pressa para estabelecer alternativas (mais informações nesta página). Qualquer mudança deve ser aprovada até 7 de outubro para valer na próxima eleição. “As campanhas são muito caras aqui no Brasil”, afirmou Nicolau. Segundo ele, o único país com gastos eleitorais maiores são os Estados Unidos. “Na França, na Alemanha, mesmo convertendo real para euro, as campanhas são mais baratas.”

Um deputado federal eleito em 2014 gastou, em média, 15 vezes mais do que um candidato derrotado. O total de despesas dos postulantes a uma cadeira na Câmara foi de R$ 1,4 bilhão (valores atualizados), o que representa gasto médio por concorrente de R$ 286 mil. As campanhas mais caras, proporcionalmente, foram em Goiás, com média per capita de gasto de R$ 984 mil. As mais baratas, no Amapá – média de R$ 115 mil.

Para explicar melhor como funciona a relação entre gastar e ganhar eleição, Nicolau usou uma metáfora. “Mal comparando, um time de futebol tem mais chances de chegar entre os primeiros em um campeonato se tiver jogadores mais caros”, disse. Em 2014, porém, oito deputados gastaram menos de R$ 100 mil e foram eleitos.

Os “times” que mais apostaram em seus “jogadores” foram PT, PMDB e PSDB. Como são os maiores partidos, com maiores bancadas, mais municípios e passagens pelo Palácio do Planalto no currículo, são os que mais lançaram candidatos e, assim, os que mais gastaram. Juntos, desembolsaram 40% do total, ou R$ 558 milhões.

Para o professor de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) Glauco Peres, o diagnóstico é de que há cada vez mais candidatos e, para triunfar nas urnas, é necessário gastar mais. Conforme Perez, contudo, o “fator dinheiro” ajuda a compensar os que são desconhecidos na política.

“Quem já é político, deputado no caso, tem mais acesso a cargos e recursos do que quem está começando. E eles têm dupla vantagem: acabam arrecadando mais porque são conhecidos. Então, se por um lado baratear campanha permite que qualquer um possa se candidatar, acaba favorecendo quem já é conhecido”, afirmou Peres.

‘Dobradinhas’

O quadro delimitado por Peres está presente no levantamento: mesmo os detentores de mandato, que possuem maior facilidade de arrecadação, têm de gastar muito para se reeleger. É o caso de Chinaglia. O deputado paulista, que já presidiu a Câmara e exerce mandatos seguidos desde 1999, gastou R$ 10,2 milhões no último pleito. Ele arrecadou R$ 5,8 milhões – segundo o petista, a dívida de campanha persiste e hoje é de R$ 3,6 milhões.

O petista afirmou que suas despesas foram recorde porque fez “dobradinhas” com deputados estaduais, nas quais honrou mais compromissos do que poderia. “Estou seguro de que nas próximas eleições os valores vão ser diferentes. Por vários motivos, espero que haja o financiamento público e a lista preordenada, que são as melhores formas de baratear uma campanha”, disse o deputado.

Em 2007, Chinaglia foi presidente da comissão especial de reforma política que analisou um projeto que propunha essas medidas, mas foi engavetado.

Já Marco Antônio Cabral (PMDB-RJ) foi eleito pela primeira vez em 2014. Filho do ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), Marco Antônio assumiu a Secretaria de Esportes e Lazer do Rio, na gestão de Luiz Fernando Pezão (PMDB), aos 23 anos. No ranking, ficou em segundo, com R$ 8,2 milhões. Segundo a prestação de contas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o valor arrecadado por Marco Antônio foi exatamente o mesmo que o gasto.

Procurado pelo Estado, Marco Antônio disse, em nota, que, “independentemente do valor gasto, todas as normas da legislação eleitoral foram cumpridas de forma transparente e dentro da legalidade”.

Não muito atrás, em termos de gastos, está a deputada Iracema Portella (PP-PI). Aos 55 anos, ela está na segunda legislatura e, para se reeleger, gastou R$ 8,13 milhões. Sua prestação de contas informa um saldo positivo de R$ 1,2 mil. O Estado entrou em contato com a deputada, mas não obteve resposta.

Entre os estudiosos, é comum o entendimento de que a solução para as campanhas caras não é a criação de um fundo eleitoral. “O que barateia campanha é colocar limite nominal, não proporcional, para doações de pessoas físicas”, disse Peres.

Para Nicolau, em vez de “criar mais um fundo público, com identidade própria e valor absurdo”, o melhor seria reforçar o Fundo Partidário, com 30% de recursos públicos em anos eleitorais, por exemplo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.