20/11/2021 - 13:00
Sobre a pedra fria que pavimenta a Praça dos Três Poderes, o lavador de carros Luis Augusto Brum Gonçalves, de 36 anos, estende alguns cobertores e busca abrigo noturno sob a marquise do Museu Histórico de Brasília, monumento projetado por Oscar Niemeyer e cuja inauguração marcou a transferência da capital federal há 61 anos.
A cena é incomum para o local, que fica a cerca de 200 metros do Palácio do Planalto, de onde despacha o presidente Jair Bolsonaro, do Congresso Nacional, em que deputados e senadores discutem e modificam as leis do País, e também do Supremo Tribunal Federal, órgão máximo da Justiça brasileira.
No centro dos Poderes, Gonçalves dorme porque não tem dinheiro para bancar o aluguel em São Sebastião, região administrativa localizada na divisa do Distrito Federal com Goiás. Tampouco teria como pagar a passagem de ônibus para ir e voltar todos os dias para a Esplanada dos Ministérios, onde busca seu ganha-pão.
Gonçalves lava carros no estacionamento da sede do Ministério da Economia, de onde despacha o ministro Paulo Guedes e onde ocorreram inúmeras discussões sobre o auxílio emergencial, que ele próprio não recebeu. Sem uma renda de apoio, ele ganha R$ 20 por lavagem, mas a procura encurtou em meio à época de chuvas no cerrado.
Ele conta que servidores do Ministério fazem uma “vaquinha” para ajudar, mesmo sem haver trabalho suficiente para ele e os outros quatro lavadores que se revezam no local. Na última vez, a ajuda foi de R$ 650.
Gonçalves tem família no Rio Grande do Sul, mas por lá também enfrentam dificuldades. Ele conta ter vindo para Brasília em 2016, na esperança de conseguir algo melhor. “É na rua, mas eu me sinto como um guerreiro. Ali não é qualquer canto, ali é a Praça dos Três Poderes. Envolve três Poderes, o Legislativo, o Judiciário e o Executivo. Sendo que muitos cruzam por ali e fazem como se não fosse nada, fingem como se nada estivesse acontecendo com o cidadão brasileiro”, diz.
Questionado se fica incomodado de dormir na Praça dos Três Poderes, Gonçalves não hesita. “É a luta, senhor. A vergonha fica na cara deles, não na minha.”