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Naji Nahas: “Não foi o Naji quem quebrou a bolsa de valores. Foi a bolsa que quebrou o Naji em 1989”

 

O mercado de capitais brasileiro tem um encontro marcado com o passado. Mais precisamente, com um nebuloso episódio ocorrido em junho de 1989 e que teve como protagonista o investidor libanês Naji Nahas. Acusado de manipular o mercado e de inflar artificialmente os preços das ações, Nahas foi alvo de uma intensa perseguição policial e chegou a ser preso por uma equipe chefiada pelo delegado Romeu Tuma. Contra ele, pesavam duas acusações: crime contra o sistema financeiro e crime contra a economia popular. Sua carteira de ações, à época avaliada em US$ 490 milhões, foi tomada. Nela, havia 7% das ações da Petrobras e 12% dos papéis da Vale do Rio Doce. De lá para cá, Nahas gastou boa parte do seu tempo com advogados, defendendo- se das acusações que sofreu. Recentemente, foi inocentado de vez em todos os processos e, contra ele, já não cabe qualquer tipo de recurso.

É dessa posição, não mais de vilão e sim de vítima, que ele se prepara para, novamente, abalar o mercado. Nos próximos dias, Nahas deverá ingressar com ações bilionárias contra a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) e contra a Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F).

 

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Warren Buffett: Nahas diz que, sem os processos que sofreu, ele seria o “Buffett brasileiro”

 

O valor da indenização? Dez bilhões de dólares! Exatamente quanto valeria sua carteira se ela ainda estivesse em seu poder. ?Não foi o Naji quem quebrou a bolsa; foi a bolsa que quebrou o Naji?, disse Nahas a um interlocutor que participou do desenho de sua estratégia jurídica. ?Para entrar com as ações, era preciso esperar o fim de todos os processos criminais.?

O distanciamento histórico poderá fazer bem ao megainvestidor libanês que chegou ao Brasil em 1969 com US$ 50 milhões no bolso, decorrentes de uma herança familiar. Se tivesse entrado com as ações judiciais no calor dos acontecimentos, ele dificilmente teria possibilidades de êxito. Hoje, no entanto, o quadro é distinto. Dias atrás, o ex-ministro Delfim Netto publicou um artigo no jornal Valor Econômico apontando a ?injustiça? cometida contra Nahas em 1989.

 

Em 1989, carteira de Nahas valia US$ 490 milhões com 7% da Petrobras e 12% da Vale

 

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BOLSA DO RIO, EM 1989: quando o escândalo estourou, ações caíram 30%

 

?Aquela disputa pareceu envolver Delfim justificou sua posição. ?Havia uma queda-de-braço entre comprados e vendidos, onde um dos lados quebraria?, disse ele. ?A Bovespa decidiu então mudar as regras do jogo contra o Naji.? Segundo Delfim, Nahas era uma ?menina do Colégio Sion? diante das ?crooners do La Licorne?, referindo-se a uma das mais famosas casas do meretrício paulista. À época do crash, Nahas também teve o apoio explícito de outro notório economista, o ex-ministro Mário Henrique Simonsen, mas os argumentos do professor da FGV, num contexto de histeria na mídia contra o ?especulador empresas valem US$ 1 trilhão. Para ampliar sua carteira, Nahas se valia de uma regra então vigente no mercado brasileiro conhecida como ?DZero?. Ao comprar ações, um investidor tinha prazo de cinco dias para liquidar as operações, mas recebia os papéis à vista, que podiam ser dados em garantia a um banco para obtenção de novos empréstimos.

Assim, era possível ?alavancar? a posição. No seu jogo, de alto risco mas dentro das regras, Nahas vinha sendo financiado por bancos como o Multiplic, o Crefisul e o Planibanc. Para que a operação fosse lucrativa, a alta das ações pordeveria superar a taxa de juros cobrada pelos bancos nos financiamentos. Naquele momento, Nahas já era o maior investidor em atuação no Brasil e operava no mercado do Rio de Janeiro.

 

Hoje, a mesma posição seria de US$ 10 bilhões, valor da causa de Nahas contra as bolsas

 

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BOLSA DE SÃO PAULO, EM 2007: instituição prepara seu próprio IPO

 

Em 1989, no entanto, as autoridades da Bovespa agiram para suspender as operações ?D-Zero? em todo o País. Num depoimento à Justiça, Luiz Carlos Mendonça de Barros, que presidia o Planibanc, declarou que cortou o financiamento a Nahas depois de ser pressionado pelo presidente da Bovespa, Eduardo Rocha Azevedo. Sem prazo, Nahas não conseguiu liquidar suas compras de ações e perdeu sua carteira, que foi tomada pelos bancos. Depois disso, as cotações, que haviam caído 30% em junho de 1989, rapidamente voltaram ao patamar anterior, mesmo com Nahas distante do mercado. Aos amigos, ele sempre atribuiu sua queda a Rocha Azevedo e ao ex-presidente do BCN, Pedro Conde. Os ?vendidos?, segundo Nahas, teriam lucrado US$ 58 milhões num único dia, numa operação feita para ?quebrar o turco?. Rocha Azevedo hoje prefere não falar mais sobre esse assunto. ?Se o Nahas acha que tem algum direito, deve tentar exercê-lo?, limita-se a dizer. Na Bovespa, esse tema também é tabu. Ninguém gosta de comentá-lo e a posição oficial é de que se trata de uma história do passado. Na BM&F, comenta-se que o caso é um problema restrito à Bovespa. Procurados pela DINHEIRO, diretores das duas bolsas evitaram dar declarações. Mas ambas as instituições serão parte dos processos por que assumiram os negócios feitos na Bolsa do Rio, onde Nahas atuava.

 

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Rocha Azevedo: ex-presidente da Bovespa é acusado por Nahas de ter tramado sua queda

 

O fato é que as ações judiciais de Nahas, que tem como advogados Paulo Lazareschi e Carmen Sílvia Parsaudita, ele é amigo de grandes empresários, como Marco Tronchetti Provera, da Pirelli, e Robert-Louis Dreyfus, da Coinbra. Se não tivesse tombado em 1989, ele diz que seria uma espécie de ?Warren Buffett brasileiro?, referindo- se ao maior investidor americano, que comprava ações pensando no longo prazo. Nahas carregou suas posições de Vale e Petrobras durante 12 anos. Hoje, as duas empresas têm um valor de mercado superior a R$ 100 bilhões.