DINHEIRO – Como anda o desempenho do Brasil no processo de inclusão digital?
PAULO CASTRO Na virada do ano, houve uma quebra de paradigma muito importante para entendermos o crescimento do mercado de internet no País. Em 2007, pela primeira vez, se vendeu mais computadores do que televisores, um indicador importante de maturidade do mercado. O mercado de venda de computadores no Brasil está numa dinâmica muito boa. Em função do dólar mais baixo, da redução de impostos e da taxa de juros, a oferta de computadores para as classes C, D e E acabou facilitada com parcelas menores de pagamento. Outra quebra de paradigma é que, pela primeira vez, mais da metade dos acessos à internet foram feitos fora das Entrevista / Paulo Castro residências: nas universidades, nas empresas e num fenômeno que está explodindo, que são as LAN-houses, o que permite a inclusão digital.

DINHEIRO – Mas o acesso à internet de banda larga ainda é muito caro no Brasil. Como resolver esse problema?
CASTRO No final do ano passado, 78% dos acessos à internet foram feitos em banda larga. Apesar de o preço ser elevado, em comparação a outros países, está havendo uma popularização no uso. Quando você pensa que 50% dos acessos estão sendo feitos fora das residências, isso significa que geralmente a navegação é em banda larga. Hoje já é uma realidade para quem produz conteúdo contar que quase 80% dos acessos são feitos em banda larga. Há também uma ação governamental importante de levar internet a cabo às escolas de todos os municípios, até 2011. Vai ser um fator indutor de crescimento da banda larga. Além disso, aumentou muito a concorrência de oferta de internet rápida, com a entrada das operadoras de TV a cabo e do lançamento da 3G, que tende a baixar o preço.

DINHEIRO – E em comparação a outros países, como estamos em relação à inclusão digital?
CASTRO Em relação aos mercados dos EUA e da Europa, o Brasil está algo como uns quatro, cinco anos atrasado. Essa notícia isolada é muito negativa. Mas essa curva está mudando de uma forma muito rápida. Fechamos o ano passado com 40 milhões de usuários na internet. Para este ano se espera entre 45 e 50 milhões de usuários. Se compararmos com outros mercados no mundo, o Brasil é a sexta maior população de internet.

DINHEIRO – O mérito disso se deve a quem?
CASTRO O fato de o governo ter baixado os impostos na área de informática elevou as vendas de computadores e provavelmente houve uma arrecadação maior de tributos em função do volume gerado. O governo tem uma participação, seja nesse aspecto, seja como indutor do uso de internet. É o caso do Imposto de Renda, parâmetro no mundo todo, e da carteira de trabalho eletrônica. O uso da internet é visto pelo governo como elemento de promoção social. Inclusive há uma frase do ministro da Educação, Fernando Haddad, que demonstra como o governo enxerga a internet: “Se a gente pega um país como a França, a internet afasta o jovem do livro. No Brasil, ela aproxima, dada a carência de recurso que a gente tem”. A banda larga vai chegar antes a muitos municípios que nem sequer têm biblioteca ou cinema.

DINHEIRO – Quer dizer que o governo tem sido exemplar?
CASTROUm papel que o governo poderia exercer também é estudar uma desoneração tributária no serviço de banda larga, que hoje tem em torno de 40%, 45% de imposto. Na Coréia, por exemplo, o governo foi um indutor muito forte nesse processo porque levou a banda larga para todos os domicílios do país.

DINHEIRO – O Brasil já acumula R$ 6 bilhões no Fundo de Universalização de Serviços de Telecomunicações. Na sua opinião, a que se deve o atraso no uso dessa verba?
CASTRO Quando surgiu uma tentativa de usar essa verba, houve um embargo do Tribunal de Contas da União. Na época, tinha a ver com o projeto Gesac (Governo Eletrônico – Serviço de Atendimento ao Cidadão), de colocar postos de acesso via satélite em órgãos do governo e em escolas de todo o Brasil. Como não foi para a frente, a verba acabou sendo depositada nas contas da União e continua indisponível.

DINHEIRO – Na era da mobilidade, em que a área de telecom está intimamente ligada à internet, qual seria o melhor destino para essa verba?
CASTRO Seria fomentar a distribuição do serviço de banda larga. Certamente, é um fator que vai ajudar o progresso do Brasil, vai ajudar sermos mais competitivos daqui para a frente. A internet é um instrumento de eficiência para qualquer pessoa. Hoje temos pessoas com muito acesso à internet e uma massa que não tem nenhum. Mas a internet de hoje é, sem dúvida, menos elitizada do que há dois anos.

 

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DINHEIRO – A idéia de Nicholas Negroponte, de distribuir um computador por criança, não iria ajudar o País no processo de inclusão digital?
CASTRO Certamente. Veja bem, em uma sala de aula, você acha possível várias crianças dividirem um só caderno? A mesma filosofia se aplica à idéia do Negroponte. Mas também não podemos ser tão idealistas e pensar que, num primeiro momento, já vamos ter uma solução como essa. Esse primeiro passo de levar a banda larga para todas as escolas já é um passo importante.

DINHEIRO – Pelo menos dois países da América Latina já adotaram esse projeto. O fato de o Brasil ter desistido da licitação do MEC de aquisição de computadores populares não fez com que o País desse um passo atrás na inclusão digital?
CASTROAcho que sim. As duas coisas têm de acontecer. A banda larga é importante, mas o ideal é dar os dois passos simultaneamente. O desafio não é só conectar os computadores à rede, mas mantê-los em uso, o que muitas vezes não acontece no Brasil. Já vi muitos projetos locais terminarem com computadores jogados de lado, trancados em depósitos.

DINHEIRO – Qual tem sido a contribuição do Terra no processo de inclusão digital?
CASTRONós temos algo em torno de 25 milhões de visitantes que passam pelo Terra todos os meses. Uma das formas de colaboração é o fato de estarmos baseados em um modelo de oferta de conteúdo aberto, disponível para todos os usuários, esteja ele em conteúdo mídia ou texto. A gente inovou no ano passado lançando gratuitamente séries como Lost e Desperate housewives, que só estão disponíveis em tevê fechada. Estamos ajudando a popularizar esse conteúdo. Temos um papel não de inclusão digital, mas de oferta de conteúdo democrática baseada em um modelo de publicidade. O papel da inclusão digital passa muito por essa questão do governo e menos pelas empresas.

DINHEIRO – Com o desenvolvimento da internet no País, o potencial de captação de investimentos em publicidade da rede tem aumentado?
CASTROEm primeiro lugar, a internet no Brasil é um bom espaço para desenvolver projetos, negócios e publicidade. Mas, em relação ao potencial da internet, ainda é muito pouco. No ano passado, a publicidade online fechou com uma cota de 2,8% do total de investimentos em publicidade. A média mundial é hoje de 9%. Na Alemanha, o índice foi acima de 15%. No Brasil, isoladamente é muito baixo. Mas, no ano passado, foi o investimento que mais cresceu na mídia brasileira, aumentando 46%. Nesse primeiro trimestre, a internet superou em investimento a tevê por assinatura. O que é bastante razoável, porque a tevê paga chega a 15 milhões de pessoas e a internet já atinge 45 milhões de pessoas. O mercado começou a entender que é preciso investir mais em internet.

 

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“O projeto de Negroponte certamente ajudaria o Brasil na inclusão digital” Nicholas Negroponte, idealizador do OLPC

 

DINHEIRO – Com a chegada da mobilidade, esse potencial será impulsionado?
CASTROAtravés do celular, acredito que vai ser a primeira experiência de internet de muita gente. Você tem no Brasil quase 130 milhões de celulares, sendo que mais de 40% deles têm capacidade de acessar vídeos ou páginas na internet. Sem dúvida, o investimento publicitário na internet irá aumentar. Para se ter uma idéia, a previsão é de que nos EUA, em quatro anos, a mídia online supere a tevê em termos de captação de anúncios. Não imagino que no nosso caso isso aconteça com tanta velocidade, mas certamente iremos ter um crescimento muito acentuado.

DINHEIRO – O Brasil é conhecido mundialmente como um fenômeno no uso de redes sociais. Como podemos transformar isso em dinheiro?
CASTROEsse não é só um desafio dos brasileiros. É o grande ponto de interrogação no mundo todo. As redes sociais mais bem-sucedidas, como MySpace e Facebook, não têm um faturamento de publicidade expressivo. O que está acontecendo cada vez mais é um conceito no qual se abrem novas formas de captação de anúncios através da mistura de conteúdo profissional com amador. As redes sociais estão se abrindo e se transformando em plataformas, permitindo a empresas diversas a criação de novas aplicações. É uma forma de trazer um conteúdo mais profissional a essas redes, baseado no modelo de publicidade. Essa é uma tendência que acredito vá acontecer no País também. O brasileiro adota de uma forma muito interessante a tecnologia. Os brasileiros têm o dobro de contatos virtuais do que a média mundial.

DINHEIRO – A longo prazo, qual será o papel da internet na vida das pessoas?
CASTROA internet passa a ser cada vez mais acessada por múltiplos dispositivos. O computador, o celular, a própria tevê digital vai chegar lá e até consoles de videogame, como Nintendo Wii e PlayStation. A internet como repositório de informações e serviços vai se fazer cada vez mais presente e não só através do computador. Até para decidir o cinema que vai assistir, o endereço da balada, para comprar alguma coisa. E isso não é só para as classes A e B. É um comportamento que existe na classe C também, não tanto para comprar, mas para pesquisar preços.