DINHEIRO ? O caso PanAmericano sinaliza que há problemas no sistema financeiro brasileiro?


JOSÉ OLYMPIO ? Vejo o episódio como um caso isolado, sem maiores repercussões sobre o sistema. Não há bolha de crédito no Brasil e os empréstimos e financiamentos ainda representam uma parcela pequena do PIB. Sobre o PanAmericano, ainda não está muito claro qual foi a dinâmica do problema.

 

 

DINHEIRO ? Fala-se em fraude nas operações de cessão de créditos.


OLYMPIO ? Essas cessões de crédito, de fato, geraram problemas. A meu ver, o modo mais correto teria sido contabilizar o spread ao longo da operação ? e não de uma vez só. Porque depois, quando um cliente faz um pré-pagamento, o banco tem que reverter um ganho já apropriado.

  

 

DINHEIRO ? O Banco Central fala em criar uma nova forma de regulamentar essas cessões. Seria positivo?


OLYMPIO ? Eu penso que sim. Acredito que, em todo esse processo, a gestão do BC foi muito eficiente, assim como a do Fundo Garantidor de Crédito. A consequência disso é o que estamos vendo no mercado: aconteceu a crise do PanAmericano, sem nenhum distúrbio. Além disso, a postura do Silvio Santos foi muito correta, ao dispor de todo seu patrimônio.

 

 

DINHEIRO ? É algo fora do padrão?


OLYMPIO ? A alternativa era também ruim. Com a intervenção, o patrimônio também ficaria bloqueado. A diferença foi ele ter tomado a frente.

 

 

DINHEIRO ? O Credit Suisse, embora não tenha atuado no PanAmericano, fez aberturas de capital de vários bancos médios. Uma crise como essa não deveria também ter sido captada pelo banco de investimento? 


OLYMPIO ? É difícil fazer um julgamento sem saber exatamente o que ocorreu. Todos nós que fazemos IPOs nos baseamos nas informações prestadas pelos auditores. A diligência feita pelo banco parte do princípio de que as informações financeiras auditadas estão corretas. Nós conversamos sempre com os auditores, mas não refazemos o trabalho da auditoria, até porque não é o nosso negócio.

 

5.jpg

 

 

DINHEIRO ? Se a crise foi bem gerida pelo BC, isso deveria credenciar o atual presidente, Henrique Meirelles, a permanecer no cargo?


OLYMPIO ? A gestão do presidente Meirelles foi exemplar e não apenas nesta crise. Se olharmos a crise de 2008 e 2009, ela foi muito maior. E a participação do BC, ao flexibilizar compulsórios e reinjetar liquidez no sistema, foi fundamental. Ter um presidente de mercado e testado nas crises fez muito bem ao Brasil. Aliás, temos tido essa sorte há 12 anos, tanto com o Henrique Meirelles como com o Armínio Fraga.

 

 

DINHEIRO ? Quais são as perspectivas para o mercado de capitais no Brasil?


OLYMPIO ? Extrema-mente favoráveis. E o Índice Bovespa, que está praticamente no mesmo nível de antes da crise, mascara uma situação. Na verdade, os setores ligados a consumo, construção e bancos, de uma forma geral, apresentaram uma valorização expressiva neste ano. Isso reflete uma atração crescente que o Brasil exerce sobre os capitais mundiais.

 

 

DINHEIRO ? Mas isso já provoca até uma discussão sobre controle de capitais.


OLYMPIO ? O controle de capital, de fato, é o tema do momento. Mas há capitais e capitais. É preciso distinguir o capital especulativo, de curto prazo, do capital de longo prazo. O investimento em ações é um capital de risco, sem garantia nenhuma de resgate. E que, a meu ver, deve ser incentivado. Além disso, devemos também estimular novos mecanismos de capital de longo prazo, porque a única fonte que existe para as empresas ainda é o BNDES. Na área externa, deve-se manter a janela aberta para o bom capital, penalizando apenas os recursos mais especulativos.

 

 

DINHEIRO ? Então o aumento do IOF não chega a ser um problema?


OLYMPIO ? Quando foi instituído o IOF de 2% para investimentos em ações, ele não coibiu as atividades de mercado. Neste ano, com a capitalização da Petrobras, estamos tendo o maior recorde de todos os tempos nas emissões de ações. E o mercado de IPOs continua favorável, podendo chegar a US$ 6 bilhões de janeiro a dezembro. 

 

 

DINHEIRO ? Mas abaixo do ano passado.


OLYMPIO ? É mais ou menos 50% do volume de 2009, mas no ano passado houve duas operações gigantes: a do Santander e a da Visanet.

 

6.jpg

Henrique Meirelles, presidente do BC

 

 

DINHEIRO ? Já há muitos IPOs na fila?


OLYMPIO ? Esse mercado vai se expandir, atraindo empresas de porte médio para a bolsa de valores. Eu antevejo um número maior de operações em 2011.

 

 

DINHEIRO ? Mas com empresas de boa qualidade?


OLYMPIO ? Eu sempre me surpreendo com a riqueza empreendedora e empresarial do Brasil. Todo dia, eu conheço empresas novas, de alto potencial. Muitas delas vão precisar do mercado de capitais para se desenvolver.

 

 

DINHEIRO ? O sucesso das empresas que foram ao mercado educou os novos empreendedores brasileiros?


OLYMPIO ? Sem dúvida, porque todos enxergam o sucesso do modelo. De 2004 para cá, foram mais de 130 empresas nesse processo de IPO. São histórias que deram certo.

 

DINHEIRO ? Vocês tiveram uma história muito ruim, que foi a da Agrenco. Por que isso ocorreu?


OLYMPIO ? Nós fizemos 60 IPOs e tivemos um caso de insucesso. Óbvio que preferíamos não ter tido, mas é uma coisa que acontece. Na minha visão, a empresa esteve sujeita a uma série de conjunturas negativas. Houve o aumento do preço da soja, a quebra de um concorrente, a Selecta, e a ação da Polícia Federal. Deu no que deu.

 

 

DINHEIRO ? Houve uma crítica muito grande aos financiamentos pré-IPO que os bancos de investimento fazem aos clientes. Isso não cria um conflito de interesses, uma vez que os bancos passariam a ter interesse em vender qualquer ativo ao mercado?


OLYMPIO ? Há o risco de se criar situações conflituosas. Por isso, tudo tem que ser administrado com muito cuidado. Nós temos um dever fiduciário com os novos investidores, que é o de proteger seus investimentos. Afinal de contas, não podemos matar a galinha dos ovos de ouro. Mas também temos que ter capacidade de gerar negócios. Esse crédito pré-IPO, na verdade, é uma espécie de private equity. Pode ter conflito? Pode. Por isso, tem que ter cuidado. Sempre tivemos um outro banco liderando conosco e sempre fomos transparentes em relação aos nossos investidores. Fizemos isso, por exemplo, com a Santos Brasil e foi um grande sucesso.

 

7.jpg

Dilma Rousseff, que toma posse em janeiro de 2011

 

 

DINHEIRO ? Como a CVM tem se comportado em relação ao mercado brasileiro?


OLYMPIO ? De forma exemplar. Houve vários avanços institucionais e o maior deles foi o Novo Mercado. Na década de 90, 17 empresas abriram o capital. De 1998 a 2003, foram apenas três operações de IPO. E depois aconteceram 140, com conceitos novos. Um deles, o advento da corporação, com capital diluído e sem um controlador. Nós temos muito orgulho de ter participado da criação da primeira corporação brasileira, que foi a Renner.

 

 

DINHEIRO ? As empresas com estrutura de controle mais complexa, como a Telemar, estão sendo penalizadas pelo mercado. Não é um sinal importante para o controlador?


OLYMPIO ? Sem dúvida. No mercado, não existe estrutura certa ou errada. Existem estruturas que serão mais bem vistas e terão mais recompensas do que outras, gerando um custo menor de capital para as empresas.

 

 

DINHEIRO ? Sua previsão para 2011 é otimista, mas muitos analistas falam em bolha dos emergentes.


OLYMPIO ? Quando eu vejo os números macroeconômicos do Brasil, não observo uma situação de bolha no Brasil. Os dados apontam para um ciclo de crescimento sustentado, com expansão do emprego, do consumo e da renda, que pode durar muito.

 

 

DINHEIRO ? O pacote de US$ 600 bilhões dos EUA não distorce os preços?


OLYMPIO ? Os EUA querem estimular o mercado interno, com taxas de juros negativas. Isso gera consequências, mas não torna ruins os nossos indicadores. O Brasil é grau de investimento  e tem  perspectivas de alto crescimento. Se você une baixo risco e expansão, o resultado é a geração de múltiplos maiores para as empresas daqui. Por isso, uma empresa como a Natura vale tanto quanto a Avon.

 

 

DINHEIRO ? Como o sr. avalia os primeiros sinais da presidente eleita Dilma?


OLYMPIO ? Eles foram escassos até agora, mas todos na direção correta. Essencialmente, ela defendeu um ambiente de taxas de juros menores, mas também com uma maior prudência fiscal. Disso, não há quem discorde. E a preocupação internacional em relação ao Brasil hoje é praticamente zero. Está claro para todos que teremos uma política de continuidade econômica.