13/07/2004 - 7:00
Duas correspondências entre o presidente de uma multinacional italiana no Brasil e seus chefes em Milão, obtidas com exclusividade pela DINHEIRO, revelam bastidores de uma falência empresarial que provocou um estrago de R$ 100 milhões no mercado brasileiro. O Banespa, maior prejudicado, perdeu R$ 40 milhões. O Rural ficou com um papagaio de R$ 16 milhões. Outros bancos e fornecedores perderam milhões. O caso em questão é o da concordatária Tecnosistemi, a empresa italiana que instalou os equipamentos de telefonia celular da operadora TIM, como antenas e estações rádio-base. A Tecnosistemi deixou de honrar seus compromissos com os credores em 2003 e acusou a TIM de não ter pago pelos serviços prestados. Em seguida, em abril deste ano, a empresa entrou com uma ação judicial contra a TIM para tentar recuperar R$ 43 milhões. No entanto, um mês depois, no dia 26 de maio, a matriz da Tecnosistemi na Itália, a Technolux S.p.A, resolveu questionar a cobrança. O presidente da companhia, Giorgio Ghiglione, escreveu a Rubens Pedroso, chefe da Tecnosistemi, para lhe advertir de que a ação judicial era inadequada. Ghiglione não questionou a existência ou o valor dos créditos.
O que importava, segundo o capo italiano, era preservar uma boa relação com a TIM na Itália. Pedroso então respondeu no dia 18 de junho: ?A matriz comprovou total abandono e desinteresse em defender os ativos da empresa e os credores, se preocupando apenas em ressaltar a sensibilidade do relacionamento com o grupo Telecom Italia?. Na prática, a matriz recomendou à filial que desse o calote nos seus credores brasileiros.
O impasse entre Technolux e Tecnosistemi coloca em risco direto o presidente da filial brasileira. Caso o executivo Rubens Pedroso acate as ordens do chefe Giorgio Ghiglione, ele estará fraudando seus credores. ?O executivo de uma empresa concordatária não pode deixar de cobrar os créditos da empresa que dirige, sob pena de provocar uma falência fraudulenta?, esclareceu à DINHEIRO o advogado José Murilo Procópio de Carvalho, especialista da área de falências e concordatas. ?Neste caso, ele pode até acabar preso.? A TIM, por sua vez, alega que os créditos cobrados judicialmente não existem e que a Tecnosistemi deixou de ser fornecedora porque não honrou compromissos técnicos. ?A Justiça irá comprovar a qualidade dos créditos?, garante Carlos Eduardo de Souza, advogado da Tecnosistemi.
O fato é que o caso é um problema e tanto para a TIM, que fechou 2003 com prejuízo de R$ 1,4 bilhão. Muitas empresas que forneciam equipamentos para a Tecnosistemi e até os funcionários demitidos resolveram acionar a TIM. Somadas, as ações cobram valores próximos a R$ 85 milhões. ?A TIM é solidária nas ações porque a Tecnosistemi existia quase que única e exclusivamente para atendê-la?, aponta a advogada Elaine Zacarella, que cuida de alguns processos trabalhistas. Estima-se que pelo menos 250 ex-funcionários da Tecnosistemi estejam acionando a TIM. Numa outra ação, a empresa Teleinstal, de São Paulo, acusa a TIM de ter usado a Tecnosistemi como uma espécie de escudo protetor. ?Eles usaram a Tecnosistemi para intermediar suas atividades, tiraram as vantagens dos serviços prestados e não pagaram seus credores, deixando a impressão de que foi o intermediário quem deu o calote?, alegou o advogado Sérgio Rubertone, da Teleinstal. Os bancos, como o Rural e o Banespa, ainda estudam se também entrarão com ações contra a TIM.