Com prefácio assinado pelo ChatGPT, o livro O Dia Depois de Amanhã (Editora Arquipélago), do jornalista Alexandre Teixeira, reúne uma infinidade de estudos sobre as transformações nas relações de trabalho decorrentes da pandemia e propõe algumas estratégias para que empresas e empregados lidem melhor com o tema.

Além do estilo didático que o autor emprega para ilustrar os diversos aspectos que impedem o sucesso do modelo de trabalho híbrido (ao menos em sua versão atual, ou 1.0, como definido já na capa), o que torna a leitura “intrigante” é o que ele traz de incertezas (as aspas se devem ao fato de eu ter copiado o adjetivo que o ChatGPT escoheu ao prefaciar a obra).

Por isso mesmo, O Dia Depois de Amanhã termina sem uma conclusão. Seu epílogo, Flexibilidade S.A., é muito mais uma provocação à incapacidade de empresas, sobretudo no Brasil, de inovar no RH do que a identificação de uma porta de saída para o embate entre trabalhar dentro ou fora do escritório alguns dias. Talvez porque essa questão seja menos relevante para o que virá nos dias depois de amanhã. O debate mais amplo envolve, além do espaço físico (o onde), o como e por quem o trabalho será feito. É evidente que convidar o ChatGPT para escrever o prefácio comprova o quanto Teixeira tem consciência disso.

Desde seu primeiro livro, Felicidade S.A., publicado em 2012, ele tem se dedicado a aprofundar as discussões sobre como o trabalho e os negócios vêm se transformando de forma acelerada por meio da tecnologia. Mas nem ela própria tem conseguido provocar mudanças tão radicais e em tão pouco tempo como fez a pandemia de Covid-19.

”Como diz Nicholas Bloom, o professor de Stanford à frente da maior pesquisa da atualidade sobre trabalho remoto e híbrido, do mesmo modo que não desistimos dos automóveis quando vemos acidentes causados pela imperícia de motoristas, não faz sentido renunciar ao teletrabalho porque muitas lideranças não sabem
dirigir a distância”

Não apenas pelo isolamento social e pela obrigação de acomodar em casa quem se deslocava diariamente para cumprir horário na empresa. O impacto da crise sanitária foi também cultural, ao mudar a maneira como as pessoas compreendem o compromisso com o trabalho.

E essa percepção muda de acordo com o lugar que cada um ocupa no ambiente corporativo. Gestores habituados ao modelo de comando e controle tendem a preferir a volta de seus subordinados, enquanto quem se adaptou ao home office, mesmo que com algumas perdas, prefere escolher onde e quando trabalhar.

“Pesquisas revelam que o retono ao escritório está causando um tipo específico de ansiedade”, escreveu Teixeira na abertura do segundo capítulo do livro. “A empresa de pesquisas de mercado Ipsos publicou em agosto de 2021 uma enquete feita para o Fórum Econômico Mundial com 12,5 mil trabalhadores de 29 países. Confirmou o óbvio — e ele precisa ser dito”, prossegue o livro. “Dois terços das pessoas de todo o mundo queriam trabalhar com flexibilidade quando a pandemia terminasse, mostrava a pesquisa. (…) Pouco mais da metade dos entrevistados estava sentindo falta dos colegas e 64% disseram que eram mais produtivos com um horário de trabalho flexível.”

Evidentemente, nem todas as empresas concordaram com isso e muitas foram gradualmente exigindo o retorno presencial. O motivo principal é a dificuldade em liderar de forma remota. Ex-vice-presidente global de RH do Google e autor de Um Novo Jeito de Trabalhar, Laszlo Bock afirmou, em 2022: “O modelo 100% presencial voltará a ser a norma”. Elon Musk foi além: “Voltem ao escritório ou saiam da Tesla”. Segundo ele, “essas coisas de ficar em casa da Covid levaram as pessoas a pensar que você não precisa trabalhar duro”. Será?

É provável que a razão para flexibilizar a jornada esteja muito além da falta de vontade de trabalhar duro. Até porque muitos estudos confirmam ter havido aumento de produtividade no home office. “Como diz Nicholas Bloom, o professor de Stanford à frente da maior pesquisa da atualidade sobre trabalho remoto e híbrido, do mesmo modo que não desistimos dos automóveis quando vemos acidentes causados pela imperícia de motoristas, não faz sentido renunciar ao teletrabalho porque muitas lideranças não sabem dirigir a distância.”