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?Ao invés de incentivar o setor a ANS, de Santos, tem uma postura policialesca?

 

 

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“Lançado na gestão Serra, o programa de agentes de saúde não avançou”

 

 

DINHEIRO ? O que impede o desenvolvimento dos planos de saúde no Brasil?
LUIZ ROBERTO PINTO ? O principal entrave é a política adotada pela Agência Nacional de Saúde (ANS). O órgão peca pelo excesso de regulamentação. Para se ter uma idéia, em apenas sete anos foram editadas cerca de 40 Medidas Provisórias para regular o setor. Apoio uma fiscalização rigorosa. Contudo, a regulamentação excessiva está prejudicando o desenvolvimento de um segmento importante para o País e que atende a 36 milhões de brasileiros. O plano de saúde deveria ser visto como parte da solução da questão da assistência médica pois sabemos que, sozinho, o Governo não dá conta .

DINHEIRO ? E qual a sua sugestão para mudar esse quadro?
PINTO ? A ANS nasceu com uma postura policialesca que considero equivocada. Precisamos, na verdade, é de um órgão de fomento capaz de ajudar no crescimento do sistema, fazendo com que a medicina brasileira evolua cada vez mais. Infelizmente não é isso que acontece. Os planos de saúde continuam sendo vistos como os vilões da história. O que não é verdade. Como pode uma atividade econômica que gera 147 mil postos de trabalho e movimenta R$ 7,14 bilhões, levando-se em conta apenas as empresas de medicina de grupo, ser tratada com descaso. Não contamos nem mesmo com uma linha de crédito no BNDES para a compra de equipamentos. Sequer fomos lembrados na reforma tributária e fiscal. Tudo isso inibe a iniciativa privada em uma área vital para o País.

DINHEIRO ? E como a carga tributária afeta o setor?
PINTO ? De cada real pago pelos associados, vinte e três centavos se referem a tributos diretos e indiretos. Uma política de fomento também deve passar pela redução de tributos, para permitir que os ganhos sejam repassados aos usuários.

DINHEIRO ? O senhor acha que esses problemas vão ser resolvidos na gestão do presidente Lula?
PINTO ? Apesar da postura crítica, mantenho a esperança de que as coisas vão melhorar.

DINHEIRO ? O governo e a própria ANS já sinalizaram com a possibilidade de mudanças em relação ao setor?
PINTO ? Até agora não. A ANS está praticamente paralisada porque o novo presidente, Fausto Pereira dos Santos, tomou posse recentemente. Ele nem preencheu a vaga aberta na diretoria e já teremos outra vacância nesse mês.

DINHEIRO ? E como o senhor avalia
a atuação do ministro Humberto Costa, da Saúde?
PINTO ? Ele conhece bem a medicina preventiva que é, certamente, a área que deve ser privilegiada pelo ministério. O problema é que o ministro teve de gastar boa parte de seu tempo cuidando de escândalos envolvendo o Instituto Nacional do Câncer e também as denúncias de irregularidades na fila dos transplantes no Rio de Janeiro.

DINHEIRO ? O senhor acredita que, um dia, o governo conseguirá oferecer saúde de qualidade a todos os brasileiros?
PINTO ? É uma utopia achar que, sozinho, o Estado conseguirá dar conta da demanda em um País como o Brasil. A única forma de isso se tornar realidade é fazer com que a rede pública se volte apenas para as pessoas que são realmente pobres. Uma grande parcela poderia ser direcionada para os planos de saúde.

DINHEIRO ? Esse ainda é um luxo ao qual a maioria dos brasileiros não tem acesso …
PINTO ? A universalização do atendimento médico é que é, na verdade, uma falácia. As pessoas madrugam nas filas de hospitais, esperam semanas e até meses para fazer exames e se submeterem a tratamentos. Quando conseguem ser atendidas nem sempre encontram os remédios de que precisam.

DINHEIRO ? Mas como pagar por um serviço se a renda dos trabalhadores só cai; sem contar o avanço do desemprego?
PINTO ? Basta o governo adotar fórmulas já testadas no passa-
do, como o subsídio para financiar o ingresso de novos participan-
tes nos planos de saúde. Na década de 60 era assim. Os trabalha-
dores que tinham plano de saúde recebiam um desconto no pagamento feito à Previdência. Hoje, a realidade é outra e o
fomento poderia ser feito com a arrecadação da CPMF, que
deve somar R$ 19,8 bilhões nesse ano.

DINHEIRO ? E qual seria o impacto de uma medida como essa no setor de saúde privada?
PINTO ? Eu acho que poderíamos ampliar o número de usuários
do sistema para 72 milhões, em até cinco anos. Com isso, a rede pública ficaria liberada para atender, com dignidade, as pessoas carentes e os desempregados.

DINHEIRO ? E o senhor acha que um governo que flerta com o socialismo vai apoiar essa proposta?
PINTO ? Não estamos inventando nada. Isso já foi feito, com bastante sucesso, na década de 1960.

DINHEIRO ? Os políticos ainda falam em construir novos hospitais. Ainda faltam leitos ?
PINTO ? Se analisarmos o setor de saúde como um todo, veremos que houve um avanço muito grande em todos os procedimentos. O tempo de internação, por exemplo, se reduziu à metade na maioria dos casos. Por isso, acho um equívoco construir novos hospitais. O ideal é investir em tecnologia de ponta. Comprar equipamentos modernos e não insistir em obras demagógicas que deixaram como herança dezenas de esqueletos abandonados pelo Brasil afora.

DINHEIRO ? O governo tenta fazer um atendimento universal e amplo no lado da doença. Por outro lado, os institutos de pesquisa vivem à míngua …
PINTO ? Isso é reflexo da opção errada do governo de concentrar recursos onde, nitidamente, ele é ineficiente deixando de lado a prevenção. Desde o início do século XX, quando Oswaldo Cruz comandou a saúde, sofremos uma involução nessa área. Por conta disso, doenças erradicadas em 1910, como a febre amarela, voltaram.

DINHEIRO ? Além de equipamentos, quais deveriam ser as prioridades do ministério?
PINTO ? O trabalho dos agentes de saúde e dos médicos de família deveria ser prestigiado. O programa foi lançado na gestão de José Serra (ministro da Saúde do governo FHC) mas não foi ampliado da forma que deveria.

DINHEIRO ? Qual a sua opinião sobre os genéricos?
PINTO ? Esse foi outro grande acerto da gestão Serra. Os genéricos beneficiam, principalmente, os pacientes de baixa renda. O que falta é uma divulgação mais forte desses medicamentos junto à classe médica. Na Samcil nós aderimos de imediato. Quando o paciente não tem recursos para se medicar corretamente ele acaba voltando ao sistema de saúde, o que gera um custo adicional muito alto.

DINHEIRO ? Apesar da postura crítica o senhor confia na capacidade do governo de gerir a área de saúde?
PINTO ? Claro que sim. Insisto em dizer que eles poderiam fazer muito mais se mudassem o foco de atuação para as áreas essenciais e passassem a ver as empresas privadas como parceiras. O gigantismo do sistema é tamanho que ele fica sujeito a uma série de problemas como os recentes escândalos ocorridos no Rio, envolvendo denúncias de corrupção. Por conta disso, o ministro Humberto Costa (Saúde) acaba gastando muito de seu tempo mandando apurar escândalos.

DINHEIRO ? O segmento de saúde privada passou por um forte ajuste. O setor já está depurado?
PINTO ? Creio que sim e as medidas que defendo deverão torná-lo cada vez mais forte. Temos condições de dobrar o número de usuários. Mas isso deve ser feito gradualmente.

DINHEIRO ? O faturamento da Samcil cresceu 37% para R$ 345 milhões em um ano difícil. Qual a fórmula do sucesso?
PINTO ? Nossos custos são controlados na ponta do lápis. Acompanho diariamente quantos associados estão internados
em cada hospital e há quantos dias. Isso é possível porque, ao contrário das empresas de seguro-saúde, nós atendemos basicamente em rede própria. Com isso, nosso custo com atendimento médico-hospitalar fica em 63% do faturamento. Apenas para efeito de comparação, as grandes empresas de seguro-saúde gastam
até 92% com essa rubrica.

DINHEIRO ? Mas isso não conta a história toda…
PINTO ? Nós criamos também outros serviços diferenciados como
um departamento de medicina preventiva. Através dele, os associados que sofrem de doenças crônicas (hipertensão e diabetes, por exemplo) recebem gratuitamente os medicamentos. Também temos um grupo de médicos que atendem, por telefone, qualquer dúvida dos pacientes. Fazemos, ainda, o acompanhamento ativo desses casos. São cerca de 50 mil inscritos (10% de nossos clientes) nesses programas. Isso fez com que o gasto com esses pacientes caísse quase 70%, através da redução da demanda por internações ou do uso de serviços complexos e caros como as Unidades de Terapia Intensiva.

DINHEIRO ? Sua empresa fez sucesso atuando com a classes C e D. É rentável trabalhar com esse público?
PINTO ? Sem dúvida. O seguro-saúde passou a fazer parte da cesta de benefícios das empresas privadas. O mesmo vale para os consumidores individuais. Todos querem fugir dos hospitais públicos. Cobramos uma mensalidade média de R$ 65, valor razoável para o padrão de preços da Grande São Paulo, onde atuamos.

DINHEIRO ? Em sua opinião, o que fez com que as empresas aderissem maciçamente à contratação de planos de saúde?
PINTO ? Elas perceberam que o atendimento de qualidade pode garantir a melhora da produtividade, evitando, por exemplo, os
custos decorrentes do absenteísmo.

DINHEIRO ? Por que as operadores estrangeiras não vingaram no Brasil?
PINTO ? A maioria delas desembarcou por aqui querendo impor um esquema semelhante ao adotado em seus países de origem. O mercado brasileiro é complexo e exige uma atuação sob medida. A americana Cigna sentiu isso na pele quando comprou a Golden Cross em 1997. Ela acabou devolvendo a empresa aos antigos donos depois de amargar um prejuízo de US$ 320 milhões.