24/04/2001 - 7:00
De um longínquo lugar chamado Brasil, surgiu um dos maiores heróis da história moderna do Japão. Ele aterrissou na pequena cidade de Guinza em 1999 para uma missão especial: destruir o fantasma do prejuízo que assombrava a poderosa corporação Nissan por sete anos consecutivos. A tarefa incluía ainda o compromisso de reduzir a pó uma dívida de US$ 13 bilhões e levantar a participação de mercado da montadora nipônica. No início do combate, o National Kid brasileiro foi confundido com o vilão. Disse que para ganhar a batalha precisaria aniquilar fábricas deficitárias e acabar com milhares de postos de trabalho, além de dispensar vários fornecedores. A tática caiu como uma bomba sobre os princípios e a cultura empresarial da tradicional nação, mas, segundo o nosso herói, era a única arma capaz de vencer o mal. Os japoneses, enfim, concordaram e ele começou a agir. Neste mês, a corporação vai divulgar o balanço do ano fiscal encerrado em abril. A expectativa é de que o vingador brasileiro tenha conseguido, em dois anos, eliminar o fantasma da Nissan. É melhor não perder o próximo episódio.
Não é por acaso que a saga do executivo Carlos Ghosn está sendo contada aqui como se ele fosse um super-herói do mundo empresarial. O homem convocado pela Renault ? dona de 37% do capital da Nissan ? para salvar a montadora nipônica, vai virar agora personagem de quadrinhos no Japão. É isso mesmo. Editoras estão cercando o gaijin para que ele conte sua vida em capítulos. Vale lembrar que na terra do sol nascente os gibis são respeitáveis materiais de leitura e não apenas diversão para adolescentes. Masayoshi Son, presidente do Softbank, já foi herói de quadrinhos para em seguida ter sua biografia publicada em livro.
Ghosn deve seguir o mesmo caminho. O departamento de comunicação da Nissan, no Japão, informou que ainda não há nada oficial neste sentido. Mas algumas editoras estão muito interessadas no presidente da Nissan. Entre elas, a Big Comic Superior, direcionada para jovens profissionais japoneses. Em sua última experiência com executivos em gibis, a Big Comic conquistou 300 mil leitores por exemplar. Na semana passada, DINHEIRO procurou diretores da editora para falar sobre a negociação. Foi informada que o responsável pelo assunto estava fora do Japão e não poderia ser localizado.
Embora Ghosn tenha participado de forma decisiva na reestruturação de empresas como Michelin e Renault, não há planos para versões francesas dos quadrinhos. Para os fãs americanos do executivo, deverá surgir em breve uma autobiografia. Mais de 10 editoras estão tentando convencer o comandante da Nissan a transformar em livro sua fórmula de sucesso. Este é um filão conhecido e rentável para as editoras. Obras como a de Jack Welch, Lee Iacocca ou Richard Branson já saem do prelo como Best-Sellers. ?Todas as editoras querem ter um Jack Welch em seu catálogo. Mas nesse nicho é preciso que seja mesmo um grande nome empresarial?, diz Wander Soares, presidente da Associação Brasileira dos Editores de Livros. Os valores pagos aos executivos geralmente são guardados a sete chaves. Jack Welch, o mago da GE, embolsou US$ 7 milhões adiantados para começar a escrever sua vida, mas o montante total do acordo não foi revelado. No caso de Ghosn, as conversas estão em fase preliminar. O que se sabe é que ele tem ingredientes de sobra para repetir o sucesso de seus pares e encantar leitores.
Para começar, não nasceu em grandes centros econômicos, o que torna a história ainda mais curiosa. Ele é natural de Rondônia. Filho de uma francesa com um brasileiro descendente de libaneses, aprendeu cedo a conversar em árabe, francês e inglês (e agora, também se vira em japonês). Por influência dos pais, foi estudar engenharia em Paris. Em seguida, fez doutorado em administração pela Universidade da Carolina do Sul. Conseguiu seu primeiro emprego na Michelin. Ficou 18 anos por lá até chegar a presidência da companhia nos EUA. Depois foi para a Renault e fez algo parecido com o que está tramando na Nissan. A montadora francesa estava sendo engolida pelos concorrentes. Ghosn mandou gente embora, chamou fornecedores para uma conversa decisiva e também fechou fábricas. Costumava dizer que ?sem cortes, a Renault morreria?. Não morreu e comprou a Nissan. Por isso, os japoneses chamaram o SuperGhosn.