02/06/2001 - 7:00
A história do PAS, o Plano de Atendimento à Saúde concebido na gestão do prefeito Paulo Maluf, em São Paulo, encerra-se oficialmente este mês, com a transferência definitiva dos atendimentos para o Sistema Único de Saúde (SUS). Seis anos após os primeiros estudos, realizados pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), o que era para ser uma modernização da gestão de saúde pública tornou-se um modelo falido, na contramão do SUS ? que, em contrapartida, tem trazido resultados eficazes. Como saldo da experiência, ironicamente utilizada por Maluf como moeda eleitoral, o PAS é objeto de uma CPI na Câmara Municipal e de mais de 70 inquéritos na Promotoria de Justiça da Cidadania do Ministério Público Estadual, 10% das investigações sobre improbidade administrativa. E ainda figura como menina dos olhos dos promotores que investigam o crime organizado no Estado. Segundo o promotor José Carlos Blat, dos R$ 2,7 bilhões gastos, foram desviados nada menos queR$ 2 bilhões.
Para especialistas no assunto, foi também o desperdício de uma idéia. A implantação do sistema a toque de caixa desvirtuou a proposta da Fipe e o modelo de cooperativas, formadas por médicos da Prefeitura. As empresas fixavam primeiro o honorário, depois pagavam ? ou não ? os compromissos. ?Essa lógica é oposta ao modelo de cooperativas?, analisa a socióloga Amélia Cohn, do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea e professora da Faculdade de Medicina da USP. ?O objetivo era fugir do controle da administração direta, com uma terceirização totalmente à margem do serviço público.?
O presidente da CPI do PAS, vereador Adriano Diogo (PT), lembra que o disfarce permitia passar por cima das leis, como as trabalhistas e de licitações. Dívidas, com o fisco e empresas, foram várias. Somente com os fornecedores e prestadores de serviços o valor chegou a R$ 213,5 milhões. Com o ISS foram R$ 136 milhões. Com o INSS, R$ 70 milhões. A cara-de-pau chegava ao ponto de não se pagar contas como de luz, água, pois o serviço essencial não podia ser cortado.
Como o repasse da Prefeitura era fixo, per capita, aos poucos o atendimento foi diminuindo, sobrecarregando os hospitais estaduais. Ao mesmo tempo, nada se investia nos serviços. ?Foi uma privatização atípica, sem investimentos?, diz Paulo Carrara, chefe de gabinete da Secretaria de Saúde. A CPI comandada por Diogo analisa casos escabrosos, como verbas para helipontos que nunca foram utilizados e o de fornecedoras de montanhas de medicamentos que funcionavam em cubículos. ?O PAS foi uma grande lavanderia de dinheiro, um dos grandes golpes do colarinho branco neste País. Como conseqüência, a dengue e a tuberculose foram ressuscitadas em São Paulo?, diz Diogo.
O ex-secretário da Saúde Jorge Pagura, neocirurgião famoso, é um dos investigados por irregularidades. Ele comandou a pasta entre 1998 e 2000 e teve este ano o sigilo bancário quebrado pela Justiça. Pagura disse que todas suas ações na Secretaria foram no sentido da ?efetividade, controlabilidade e transparência?, e que isso ficará claro nas apurações.
Um dos saldos do PAS foi unir políticos do PT, PFL e PSDB em torno do SUS. A Prefeitura agora pensa no modelo de autarquia, como em São Vicente, para tornar o sistema ainda mais ágil. Como o SUS prevê a gestão privada, Estado e município apostam em fundações, comandadas por organizações como universidades e hospitais privados.