É possível dizer que a festa dos computadores pessoais começou em 1977, quando a Apple lançou o Apple II. Essa não foi a única ocasião em que a empresa de Steve Jobs ajudou a criar um mercado. Da interface gráfica, passando pelo mouse, o iPod, o iPhone e o iPad, a Apple foi fundamental para que novos segmentos florescessem e prosperassem. Na maioria das ocasiões, foram Jobs e sua entourage de executivos que abriram o caminho. Mas a empresa da maçã tem se mostrado incapaz de manter a liderança dos setores que formou. É como se fosse expulsa da própria festa. 

 

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Hoje, ela conta com uma pífia participação na área de computação pessoal e perdeu o primeira posição no ranking de smartphones para a coreana Samsung. Há indícios de que isso esteja acontecendo de novo no setor de tablets, inaugurado em janeiro de 2010 pelo próprio Jobs ? cuja morte completou dois anos em outubro deste ano. A principal evidência foi o anúncio do iPad Air, a quinta geração do aclamado tablet da Apple, na terça-feira 22. Em poucas palavras: o novo produto é leve (pesa quase 200 gramas a menos do que a versão anterior), rápido e sem nenhuma inovação digna de nota. 

 

Trata-se de uma situação que vem se repetindo com frequência desde que o executivo Tim Cook assumiu o comando da Apple, em 2011. Pior: a maioria dos sites especializados recomendou aos consumidores que compraram a versão anterior do iPad a simplesmente ignorar o Air. Simultaneamente, os concorrentes da Apple avançam sobre o seu território. No mesmo dia do lançamento do Air, a finlandesa Nokia mostrou seus primeiros tablets. A Microsoft colocou à venda, na mesma data, o Surface 2. Além delas, a Samsung, a taiwanesa Asus, a americana Amazon, a japonesa Sony e praticamente todas as outras grandes marcas de tecnologia desenharam uma estratégia para atuar no promissor mercado de tablets (veja os principais concorrentes no quadro “O front da batalha”). 

 

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É um sinal inequívoco que a batalha das tábuas digitais, antes dominada com facilidade pela Apple, deve ficar mais acirrada nos próximos anos. É fácil de entender por que os fabricantes de tecnologia querem um naco desse mercado. Em 2015, de acordo com previsões da consultoria americana de tecnologia IDC, ele será maior do que o de computadores pessoais, incluindo nessa conta desktops e notebooks. Em números, as tábuas digitais faturarão US$ 116,8 bilhões, contra US$ 111 bilhões dos PCs. A consultoria americana Gartner estima que serão vendidos 406 milhões de tablets em 2017, quase três vezes mais do que os computadores (confira gráfico ao final da reportagem). 

 

À medida que os tablets se transformam em protagonistas da computação pessoal, a participação da Apple vem caindo de forma acelerada. Em 2012, ela detinha 71% do mercado. No segundo trimestre deste ano, sua fatia era de apenas 32,4%. Pela primeira vez, a Apple vendeu menos iPads. Foram 14,6 milhões de unidades nos meses de abril, maio e junho de 2013, uma queda de 14% em comparação com o mesmo período do ano passado. O banco americano Morgan Stanley estima que a Apple venderá 13 milhões de iPads no terceiro trimestre, um tombo de 7%. A rival Samsung, por sua vez, viu suas vendas aumentarem vertiginosos 277%. 

 

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Atualmente, a empresa de Seul está em segundo lugar no ranking de participação, com 18%. O grande mérito da coreana é a incrível habilidade de lançar tablets para agradar a todos os bolsos. A maior parte deles equipados com Android, o sistema operacional do Google oferecido gratuitamente e quase onipresente nos smartphones ? ele desbancou exatamente o iOS, que equipa o iPhone. ?A posição de liderança da Apple está comprometida pela ação dos competidores que oferecem tablets abaixo de US$ 250?, afirmou à DINHEIRO o analista americano de tecnologia Jeff Kagan. 

 

A Apple, aparentemente, demonstrou que sentiu a pressão. Em uma declaração atípica para um evento de lançamento, que geralmente abusa das hipérboles sobre as características revolucionárias do produto, Cook alfinetou a Microsoft, uma rival com participação irrisória no mercado de tablets. ?Eles estão confusos, eles correram atrás dos netbooks”, disse Cook. “Agora estão tentando transformar PCs em tablets e tablets em PCs. Quem sabe o que eles farão depois?? Em outra ocasião, ao falar sobre a versão gratuita de seu novo sistema operacional, o OS X Maverick, a empresa de Bill Gates foi novamente atacada. 

 

?Os dias de gasto de centenas de dólares para conseguir o melhor de seu computador acabaram?, disse Craig Federighi, vice-presidente de engenharia de software da Apple, enquanto uma tela atrás dele mostrava uma caixa do Windows 8 Pro, com um preço de US$ 199 ao lado. Ainda é cedo para afirmar que a Apple perdeu a aura da inovação. Espera-se, para os próximos anos, que a companhia surpreenda os consumidores com o iWatch, um relógio inteligente, e com um aparelho que mude a forma como as pessoas assistem à tevê. No mercado de tablets, no entanto, a empresa do genial Steve Jobs parece estar repetindo uma trágica sina: ficar de fora da festa que ela própria ajudou a organizar.

 

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