27/02/2002 - 7:00
Com uma oferta irrecusável superior a US$ 400 milhões, a gigante suíça Nestlé afastou a concorrente britânica Cadbury do páreo e está pronta para concretizar a compra da Garoto. O negócio deve ser fechado nos próximos 15 dias, segundo fontes ouvidas por DINHEIRO. Última grande fabricante brasileira de chocolate, a empresa de Vila Velha, no Espírito Santo, estava sendo alvo de grandes especulações desde agosto do ano passado, quando a família Meyerfreund resolveu colocá-la à venda como forma de estancar o prejuízo causado por intermináveis brigas entre os herdeiros. Com a aquisição, a Nestlé, dona de 31,6% do mercado, assume a liderança absoluta com nada menos que 53,6% de participação. Com 35,4%, a atual líder Lacta desce para a segunda posição. Diante de tamanha concentração, a venda da Garoto terá de passar pelo crivo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Porém, advogados ouvidos pela reportagem acreditam que, a julgar por casos passados, não haverá grandes entraves. ?O governo não vê com maus olhos um volume de concentração razoável. Como o mercado de chocolates já é bastante concorrido e não existem barreiras para entrada de novos competidores, há grandes chances de o Cade aprovar a operação?, afirma o advogado Ricardo Inglês de Souza, especialista em Direito da Concorrência da Demarest & Almeida.
O presidente do Cade, João Rodas, não quis comentar a compra antes de uma confirmação oficial mas já recebeu, na última quinta-feira 21, em Brasília, o prefeito de Vila Velha e sindicalistas representantes dos trabalhadores da Garoto. Eles foram ao órgão não protestar contra a multinacional suíça, mas brigar para que a aprovação seja condicionada a algumas ?cláusulas sociais?. Saíram satisfeitos. Obtiveram de Rodas a garantia de que, uma vez concretizada a compra, a Nestlé deve ser obrigada a manter a fábrica de Vila Velha funcionando de alguma forma. ?Queremos apenas que seja levada em conta a situação dos trabalhadores?, afirmou o prefeito Max Filho. Com 3.100 funcionários e um faturamento de R$ 454 milhões, a Garoto é a segunda maior empregadora privada do Espírito Santo. ?Se não for para ela própria, a Nestlé provavelmente terá que manter a capacidade instalada para produzir para terceiros?, diz um consultor ligado à empresa.
Desde a compra da Lacta pela Kraft Foods, em 1996, não se via tanta movimentação no setor de chocolates do País, quinto maior mercado do mundo, com um faturamento anual de R$ 2,3 bilhões. Uma das únicas multinacionais do setor que ainda não fincou um pé no Brasil, a Cadbury estava no páreo até quinta-feira 21. Desistiu diante do alto preço oferecido pela concorrente. Praticamente todos os grandes fabricantes de chocolate do mundo ? como Ferrero Rocher, Arcor, Parmalat, Hershey?s e Mars ? cobiçaram a Garoto. Mas depois de analisar de perto o balanço e a intrincada relação entre os herdeiros acionistas, muitos desanimaram. Foi o caso da Hershey?s, que chegou muito perto da compra mas acabou preferindo entrar no Brasil pelas portas da Visconti.
A oferta da Nestlé põe fim a uma disputa familiar que ameaçava destruir o império fundado em 1929 por Henrich Meyerfreund. Desde o afastamento de Helmut Meyerfreund, filho mais velho do fundador e maior acionista individual, em 1998, depois de 25 anos à frente da companhia, os negócios começaram a desandar. De lá pra cá, Paulo, 32 anos, e Ricardo, 29, filhos de Ferdinnand, irmão de Helmut, têm se alternado no poder de forma desastrosa, levando com freqüência as contas da empresa para o vermelho.