19/03/2010 - 6:00
Todos os meses, as corretoras de valores têm acesso ao sistema da BM&FBovespa que mostra a posição de cada uma no ranking de negociação do mercado acionário. É uma informação praticamente sigilosa. A bolsa não divulga o ranking e muitas instituições não têm interesse em mostrar o volume de negócios que fazem.
Guilherme Benchimol (esq.): A corretora saiu do 19º lugar no ranking da BM&FBovespa, em 2008,
para a primeira colocação neste ano com a estratégia de apostar no agente autônomo.
Marcelo Maisonnave (dir.): A XP Investimentos caminha para um modelo de shopping center financeiro,
com a corretora, fundos de investimentos e seguros entre outros negócios
Como era de se esperar, quem está na frente gosta de aparecer e quem está atrás prefere se esconder. Durante muito tempo, quem ocupava os primeiros lugares eram os grandes grupos internacionais, como Credit Suisse, Morgan Stanley e UBS (hoje BTG Pactual), e a Ágora, que pertence ao Bradesco. Neste ano, porém, uma novidade mexeu com essa corrida. A XP Investimentos deixou esses nomes para trás, subiu no pódio e ganhou o troféu de primeira colocada.
O que fez a XP, uma corretora até há alguns anos desconhecida, para desbancar seus tradicionais concorrentes? Em poucas palavras: marketing, educação financeira e agentes autônomos. Agressiva na implementação desse tripé, a empresa criada por Marcelo Maisonnave e Guilherme Benchimol em 2001, em Porto Alegre (RS), mostrou a que veio.
Parte do negócio: a propaganda dos cursos e palestras é uma maneira de a
XP Investimentos promover a educação financeira e atrair novos clientes
Naqueles primeiros tempos, a ousadia dos dois rapazes com pouco mais de 30 anos deu a tônica do negócio. Em uma salinha, começaram a atender dez clientes com computadores comprados de uma lan house. ?Éramos agentes autônomos do Investshop e partimos para realizar a nossa ideia?, diz Benchimol, referindo-se ao serviço do Unibanco.
O nome da empreitada deveria ser curto, como o das então nascentes empresas de internet, para atrair o pequeno investidor. Da terminologia XPTO, usada por Benchimol a cada final de frase, Maisonnave propôs que a empresa fosse a XP. Deu certo. ?Anos depois, para explicarmos a origem, falamos que XP é a abreviatura de expertise investimentos?, afirma, aos risos, Benchimol.
Sem ter um plano detalhado de negócios e com vontade de trabalhar para fazer a empresa crescer, os sócios da companhia fizeram-na ganhar corpo e disputar cabeça a cabeça com os gigantes do mercado. Eles próprios se definem como jovens à frente de um grupo de jovens que querem se destacar. Os que conseguem são atraídos para a sociedade no modelo baseado na meritocracia, sistema importado pelos fundadores do Banco Garantia. Atualmente, a corretora tem 20 sócios.
A ascensão fulminante no ranking da Bovespa é mais recente. Em setembro de 2008, quando a crise econômica mundial derrubou os mercados e fez o Ibovespa mergulhar a caminho dos 29 mil pontos, a XP ocupava a 19a colocação em volume financeiro negociado na bolsa, com 1,8% do total. Após 17 meses, a corretora multiplicou em 3,5 vezes sua participação para chegar ao topo. Dos R$ 244,3 bilhões que passaram pela BM&FBovespa nos dois primeiros meses do ano, a XP foi responsável por R$ 31,5 bilhões, entre ordens de compras e de vendas de ações. Como isso foi possível?
Os garotos da XP inovaram ao apostar tudo na educação financeira dos clientes e formar uma base de novos investidores, que engrossaram os 559 mil CPFs que hoje operam na Bovespa. ?Eles uniram um conjunto de fatores para esse negócio, que era muito tradicional?, diz Robert Dannenberg, presidente da Trade Network, promotora da ExpoMoney.
?A XP ajudou a profissionalizar o mercado com marketing, educação financeira e os agentes autônomos.? A corretora fez campanhas de popularização das ações. Enquanto promovia a educação, fazia o marketing da marca e engrossava a carteira de clientes, hoje acima de 50 mil. ?As pessoas gostavam de falar do mercado financeiro, mas não entendiam?, explica Benchimol.
A estratégia deu tão certo que hoje não há corretora que dispense a oportunidade de fazer uma apresentação sobre o mercado acionário. A marca XP Educação está separada da empresa e tem uma equipe dedicada a realizar cursos pelo Brasil. Em março, serão completados 300 cursos e mais de 200 mil pessoas treinadas. O modelo tem sido copiado.
?A Hera nasceu baseada na fórmula da XP, com cursos de educação financeira e foco no atendimento?, diz Rodnei Riscali, sócio da Hera Investments. Junto com ele, Nicholas Barbarisi e Marcelo Uva saíram da XP para montar a própria empresa.
Embora a XP considere o lado educacional sua principal locomotiva, foi o modelo de agentes autônomos que ajudou na disseminação da corretora por todo o País. A empresa não só incentiva como busca representantes interessados em fincar a bandeira XP na sua cidade. Já são 130 escritórios abertos e, pelo menos, outros dez devem entrar em funcionamento até o final do mês. Com isso, o número de agentes autônomos já passa de mil. ?A XP cresce com parceiros, não sozinha?, confirma o diretor de expansão Henrique Cunha. É este o ponto que gera polêmica entre os pares.
Boa parte do mercado defende que os agentes autônomos devem existir, mas que não devem superar o número de funcionários de uma corretora. O clima esquenta quando se recorda da crise financeira de 2008, período em que os agentes foram criticados por realizar operações arriscadas, como os termos, sem a autorização e o conhecimento dos clientes no meio. A XP defende o seu modelo. ?Todos os agentes passam por treinamento e cursos de orientação?, afirma Cunha.
Se quem está na frente tem que aguentar as pedradas, a XP busca caminhos para se manter no topo. O objetivo final é se tornar um grande shopping center financeiro. ?Queremos ser uma plataforma de gestão financeira, com corretora, fundos, seguros e tudo o que pudermos oferecer?, diz Benchimol. Esse passo já começou a ser dado. O site da empresa oferece fundos, como o multimercado XP Financial (que frequentemente está em destaque na seção de fundos do caderno Dinheiro do Investidor) e corretagem de seguros. Pelo visto, a XP quer continuar no topo da lista dos campeões.