A política é a arte do possível, afirmou o prussiano Otto Von Bismarck (1815-1898), o chanceler de ferro, pai do Estadão alemão, conhecido também como o Napoleão da Alemanha. É o que se pode concluir sobre a aprovação do Marco Civil da Internet, na noite da terça-feira 25, por votação simbólica – todos os partidos apoiaram, com exceção dos antigos comunistas do PPS, hoje à direita do espectro político. A neutralidade da rede, ponto principal da legislação, que é considerada a constituição da internet, foi mantida, desagradando às empresas de telefonia. Por sua vez, o governo federal cedeu na tentativa de obrigar as empresas a armazenar seus dados em data centers em território nacional. 

 

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“O projeto é equilibrado”, afirmou Paulo Bernardo, ministro das Comunicações. “Ninguém ganhou tudo e ninguém perdeu tudo.” De fato, nem todos gostaram. Mas, como disse o ministro, todos têm o que comemorar. Confira o teor de uma nota da SindiTelebrasil, entidade que reúne as principais empresas de telefonia do Brasil, como Vivo, TIM, Claro e Oi. “O texto aprovado, mesmo não sendo em sua totalidade a proposta que o setor considera ideal para a sociedade, assegura que seja dada continuidade aos planos existentes e garante a liberdade de oferta de serviços diversificados, para atender aos diferentes perfis de usuários.” O lamento das operadoras de telecomunicações refere-se à aprovação da neutralidade da rede, um dos pontos que elas gostariam que não fosse contemplado pelo Marco Civil. 

 

O conceito de neutralidade é simples: significa que todas as informações que trafegam na web devem ser tratadas da mesma forma e navegar na mesma velocidade. Ele garante também livre acesso a qualquer tipo de informação. As empresas de telefonia, por sua vez, queriam transformar a internet em uma grande tevê a cabo, vendendo pacotes de acesso. Nesse modelo, o pacote básico daria direito a enviar e-mails; o “premium”, a acessar as redes sociais; e o “superpremium”, a assistir a vídeos e a baixar arquivos. Quanto mais intenso o uso, mais caro pagaria o consumidor. 

 

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A arte do possível: “O projeto é equilibrado. Ninguém ganhou e ninguém

perdeu tudo”, disse Paulo Bernardo, ministro das Comunicações

 

“Com poder econômico extremamente forte, os grandes provedores de acesso poderiam fazer um acordo para reservar determinado conteúdo somente para os seus clientes”, diz Basílio Perez, presidente da Abrint, associação que representa mais de quatro mil pequenos provedores de conexão, com cerca de três mil clientes cada. A legislação brasileira é também a primeira com essa abrangência no mundo. Com isso, ela pode servir de parâmetro para outros países. “O centro da questão no Brasil é que a neutralidade é importante e o País está numa posição de liderança, partindo na direção certa, levando em consideração os direitos humanos de quem acessa e se comunica pela internet”, disse Tim-Berners Lee, o criador da Web, dois dias antes da aprovação do texto final. A preocupação de Lee faz sentido. A neutralidade da rede é um tema polêmico e poucos países contam com leis a respeito do assunto. 


Nos Estados Unidos, a locadora de filmes online Netflix fez um acordo com o provedor Comcast, um dos maiores do país, para fazer chegar seu conteúdo com mais velocidade aos seus usuários. O caso foi parar na Justiça e um tribunal federal manteve o pacto, dando força aos rumores de que a Apple negocia uma aliança semelhante com o mesmo provedor. Aprovado na Câmara, o projeto segue agora para o Senado, onde a votação deve ocorrer sem problemas. A presidenta Dilma Rousseff gostaria de ter o processo finalizado antes do dia 23 de abril, quando será realizado, em São Paulo, um encontro sobre governança na internet. Autora de uma proposta de criação de um órgão mundial para regular a rede, a presidenta quer mostrar que o Brasil soube fazer a sua parte.

 

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