“Uma velha vila que vai acabar”, destacava reportagem do jornal O Estado de S. Paulo de 1975. A matéria foi a primeira de outras tantas sobre a falta de conservação de uma das construções mais curiosas da cidade de São Paulo: a quase surrealista Vila Itororó, na Bela Vista, no centro expandido.

A situação da centenária vila se agravou ao longo das décadas até, enfim, ser objeto de restauro, iniciado há três anos e cuja primeira etapa será entregue amanhã. A obra recuperou quatro edificações (de 11), que se tornarão restaurante comunitário, espaço de residência artística, laboratório de fabricação digital e marcenaria (fab lab) e, ainda, a sede da Casa da Memória Paulistana, que integrará a rede Museu da Cidade.

Os espaços contemplam três casas e um prédio pequeno, que receberão oficinas, exposições, debates e outras atividades, que vão ampliar – a partir de março – a programação já realizada no galpão do centro cultural Vila Itororó Canteiro Aberto, criado no mesmo terreno em 2015.

“A vila não é só um centro cultural, mas também um patrimônio histórico, um espaço para se discutir memória da cidade, de apropriação de diferentes formas pela população”, descreve o coordenador de centros culturais e teatros da Secretaria Municipal de Cultura, Pedro Granato. Segundo ele, os usos das edificações que precisam ser restauradas ainda serão discutidos e podem incluir até mesmo o habitacional.

História

A vila foi idealizada nos anos 1910 pelo comerciante paulista Francisco Castro, filho de imigrantes portugueses, em área de cerca de 6 mil metros quadrados. Diferentemente de outras vilas, mistura cores e estilos arquitetônicos variados, inclusive com o reaproveitamento do entulho de demolições, como de ornamentos de máscaras do extinto Teatro São José.

O local também se destaca por ter recebido projeções nas fachadas em uma época em que cinema ao ar livre não era usual e, ainda, por incluir a primeira piscina privada da cidade. Ele chegou a ser cogitado para se tornar um Sesc nos anos 1970 após o sucesso da unidade da Pompeia, mas a ideia não foi adiante.

Em 2002 e 2005, respectivamente, a vila foi tombada nas esferas municipal e estadual. Foi desapropriada logo depois, momento em que era lar de 172 pessoas de baixa renda e estava em estado de arruinamento e descaracterização.

Recuperação

O restauro da vila foi resultado de um acordo entre a Prefeitura e o Instituto Pedra em 2013, instituição que captou R$ 14,5 milhões (via Lei Rouanet) para a execução da primeira fase da obra – iniciada em meados de 2014, com a drenagem e limpeza do terreno.

“A Vila Itororó como um todo estava muito degradada, com sérios problemas de drenagem, água, esgoto, muito lixo acumulado. Algumas edificações tinham raízes de vegetação infestante, que destroem as edificações”, lembra Norton Ficarelli, diretor adjunto do Instituto Pedra.

O arquiteto explica que foram selecionadas três casas de um extremo do terreno e o prédio de outra ponta, pois são independentes e permitem o uso durante as demais etapas da obra. “Alguns trechos da casa 6 (que vai virar o espaço de memória) estavam sem piso, sem forro, quase arruinados.”

O restauro já realizado inclui a recuperação das camadas originais de tinta, inclusive com a descoberta de pinturas ornamentais de flores. Também abrange a instalação de passarelas de metal e elevador para permitir a acessibilidade. A estrutura interna, com as divisões de paredes, foi mantida.

Ficarelli diz que a parte que será entregue equivale a um terço das edificações. Segundo ele, a próxima fase envolve o restauro de cinco casas e a estabilização estrutural do palacete (a construção de grandes colunas símbolo da vila) e terá custo de R$ 17,5 milhões, em fase de captação também pela Lei Rouanet. Já a última etapa prevê a recuperação do palacete e de uma casa, com custo estimado em R$ 21 milhões. Não há, contudo, um cronograma para a entrega integral do restauro.

Visitas

A Vila Itororó Canteiro Aberto realiza visitas monitoradas no pátio das casas de quinta-feira a domingo, às 16 horas e com participação gratuita. Por segurança, a atividade não permite a entrada nas edificações não restauradas. O passeio tem duração de 1h30, com entrada pela Rua Pedroso, 238. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.