04/11/2010 - 23:43
Após afiar as facas, os homens de avental branco começam a trabalhar: astros do “novo açougue”, um americano e um francês mostram aos jovens chefs de Nova York a arte de cortar a carne.
A cena ocorre no bairro nova-iorquino do Brooklyn, especificamente no “Meat Hook”, um conjunto que compreende uma loja de alimentos, outra de ferramentas e laboratórios de experimentação culinária.
Os dois homens, Tom Mylan e Yves-Marie Le Bourdonnec, são aliados na arte da boa mesa. Conheceram-se no ano passado em meio às filmagens de um documentário sobre a pecuária no mundo.
O primeiro é dono do lugar e proprietário de uma fazenda de criação de gado extensiva, muito diferente dos usuais parques de engorda. O segundo, artista com as facas, possui o açougue “Le Couteau d’argent”, a faca de ouro, numa tradução livre, em Asnières, na periferia de Paris. Todos os anos posa nu para um calendário que reserva aos seus clientes.
Em vinte minutos, o francês apelidado de “O açougueiro boêmio” e seus três ajudantes transformaram o animal, após tirar sua capa de gordura, em fileiras bem alinhadas e desossadas de lombo, “falso lombo”, entrecostos, abas e outros, como a picanha, um corte importado do Brasil.
Os franceses certamente ganharam em termos de variedade de cortes e terminação. O americano, por sua vez, rapidamente foi à antesala, onde despedaçou o animal com uma serra elétrica, depositando sobre o balcão fatias grossas com seus ossos, principalmente costelas “T-bone” e lombos.
“Na França, como protegemos as raças e não temos parques de engorda, a criação de gado é muito cara. Os animais chegam à maturidade fisiológica em 40 meses, ao invés dos 24-28 nos Estados Unidos. Então, no corte, separamos bem todos os músculos e os amontoamos, não podemos nos permitir perder nenhum pedaço de carne”, explicou Yves-Marie Le Bourdonnec aos jovens chefs.
O artesão não se limita a cortar, também dá receitas: “Com este pedaço de aba cortada em sentido contrário à fibra, e rodeada com bacon de Colonnata, vou confeccionar deliciosos aperitivos”, explicou, antes de colocar no forno.
A arte do corte, maturação e receitas inovadoras interessam a Tom Mylan. “Nos Estados Unidos, os consumidores estão cada vez mais interessados na origem da carne e no tipo de cria do animal. Não querem mais hormônios nem animais alimentados com grãos”, explica este apaixonado “novo-açougueiro”, que dirigia-se a proprietários de campos no nordeste de seu país para convencê-los a embarcar neste novo tipo de criação.
“O consumo de carne na França diminui, como em todo o mundo, mas está centrando-se na qualidade”, afirma Yves-Marie Le Bourdonnec, que sonha em montar uma escola de formação para “ensinar a brincar com as fibras e texturas”.
A ideia fez seu caminho. O francês já se reuniu com Darío Cecchini, o “açougueiro poeta” de Panzano em Chianti (Itália) e prepara-se para viajar ao Japão, terra da célebre Wagyu – mais conhecida como carne de Kobe – que dizem ser a melhor do mundo, disponível a preços exorbitantes.
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