Às vésperas de entrar em vigor o tarifaço de Donald Trump ao Brasil, com cobrança de 50% sobre as importações brasileiras nos Estados Unidos, na sexta-feira, 1º, o governo Lula tem sido pressionado por alguns setores no âmbito doméstico a rever uma medida que há tempos incomoda o governo americano: a tarifa do Brasil sobre o etanol de milho produzido nos EUA.

Atualmente, o Brasil cobra 18% de tarifa sobre o etanol americano importado, enquanto os EUA aplicam 2,5% sobre o etanol brasileiro. A diferença foi citada pelo governo Trump entre os pontos da investigação comercial aberta sobre práticas brasileiras — a mesma que incluiu tópicos como o Pix e até o comércio na Rua 25 de Março, em São Paulo.

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O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, comandado pelo vice-presidente, Geraldo Alckmin, no entanto, indica que a redução da tarifa ao etanol americano não está na agenda das negociações com Trump. Disse à coluna Márcio Elias Rosa, secretário-executivo do ministério (à direita na foto acima):

“Não haveria sentido levarmos essa proposta ou qualquer outra de redução de alíquotas que o Brasil aplica na fase atual. Eles (os americanos) reivindicavam essa redução ou atribuição de cota para o etanol, mas esse tema deixou de ser debatido desde o começo das novas tarifas (os 10% que Trump aplicou sobre produtos brasileiros, em abril)”.

Rosa negou que a pasta e seus órgãos vinculados, como a Secretaria de Comércio Exterior (Secex) e a Câmara de Comércio Exterior (Camex), venham sofrendo pressões de setores econômicos pela redução da tarifa à importação do etanol americano.

O ministério afirmou à coluna que o Comitê Interministerial de Negociação e Contramedidas Econômicas e Comerciais tem se reunido com representes de todos os setores produtivos potencialmente afetados pelo tarifaço. “O Comitê está recolhendo diagnósticos e propostas, no intuito de encaminhar as melhores soluções, caso haja necessidade”, disse a pasta, por meio de nota.

No governo Lula, mais gente graúda defende abertamente a manutenção das taxas ao produto. Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, disse nos últimos dias não descartar que o etanol entre nas negociações, mas defendeu a continuidade da tarifa. “O etanol é muito importante e fortalece muito a cadeia produtiva do agronegócio brasileiro. É um produto que, naturalmente, vou defender que se mantenha a estabilidade da taxa, até porque o etanol é muito importante para o Nordeste brasileiro”, afirmou ao jornal Folha de S.Paulo.

A coluna apurou que a siderurgia nacional tem defendido junto ao governo levar à mesa de negociações com o governo Trump uma proposta de reduzir a tarifa sobre o etanol, em troca de condições mais favoráveis à exportação do aço brasileiro aos EUA.

A preocupação no setor é grande. Desde junho, antes do tarifaço, o aço importado pelos Estados Unidos já vinha sendo taxado em 50% por ordem de Trump. Em fevereiro, eram 25%. Ao falar em uma reunião da Comissão de Indústria, Comércio e Serviços da Câmara, em 10 de julho, a diretora de assuntos institucionais do Instituto Aço Brasil, Cristina Yuan, disse que o tarifaço, somado aos 50% já praticados, “inviabilizará a exportação de aço e alumínio”. Em 2024, o Brasil foi o segundo maior exportador de aço aos EUA, com US$ 3,2 bilhões.

Entre especialistas, a taxa de 18% sobre o etanol americano é vista como medida de proteção ao etanol produzido no Nordeste, menos competitivo comercialmente que o fabricado em estados do Centro-Oeste e do Sudeste. Uma redução ou retirada da taxa impactaria fortemente essa cadeia produtiva na região.

“O Nordeste produz um etanol muito caro, porque a produtividade é baixa. Se tirar a tarifa, o etanol de milho americano invade o Nordeste, onde a indústria de açúcar e álcool é muito importante na geração de empregos”, disse Adriano Pires, fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura.

Além disso, a tarifa ao etanol americano é avaliada como compatível às tarifas aplicadas pelos Estados Unidos ao açúcar brasileiro. “A tarifa do açúcar (aplicada pelos EUA) é quase 100% fora da cota de exportação. A proposta brasileira tem sido aumentar a cota de etanol aos EUA e os EUA aumentarem a cota de açúcar. Os americanos querem que o Brasil abra o etanol, mas não querem abrir o açúcar”, explicou Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento Econômico.

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