O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), declarou nesta segunda-feira, 4, que a gestão municipal não acatará a proposta de um grupo de moradores de gradeamento e transformação em parque da Praça da República, no centro paulistano. Como o Estadão revelou, a proposta foi apresentada oficialmente pelo Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) Centro, mas obteve pareceres contrários de secretarias e órgãos ouvidos.

“Não vai fechar, não tem o menor sentido. No caso da Praça da República, a gente tem ali uma área com um trânsito muito grande de pessoas. É continuar cuidando, deixando a nossa Praça da República bonita, como está ali, os nossos lagos, as nossas fontes. Não tem a menor possibilidade de fechar a Praça da República”, afirmou o prefeito.

Nunes disse que a gestão municipal e o Estado estão aprimorando a segurança no centro e que, quando esteve recentemente no local, estava “lotado de polícia”. “E é isso: continuar combatendo o crime de forma constante”, acrescentou.

A proposta foi discutida na reunião do Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) desta segunda-feira, 4. Com um parecer contrário do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), os conselheiros acordaram em fazer uma diligência e discutir com a SPUrbanismo (da Prefeitura) se haveria alternativas para melhorar a situação da praça, mas não de gradeamento.

Não há, contudo, uma sinalização de que o Conpresp votará a favor do cercamento. Se a maioria dos conselheiros for contrária, não há como realizar o fechamento, pois o parque é tombado desde 1992 e, portanto, mudanças significativas precisam de autorização dos órgãos de patrimônio. Já, caso vote favoravelmente, a decisão final cabe à gestão Nunes, que declarou não apoiar a proposta.

Na reunião, o presidente do Conseg Centro, Cândido Prunes, defendeu que o gradeamento seria a única forma de conter crimes, prostituição, uso de drogas e acúmulo de lixo no local. “É preciso proteger a praça da degradação que hoje ela se encontra”, disse. Ele também afirmou que teria reunido 2 mil apoiadores por meio de um abaixo-assinado.

Procurada pelo Estadão, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) do Estado disse que tem aprimorado “ações de enfrentamento à criminalidade” na região. Também destacou a queda de 53,7% em roubos e 41,1% em furtos no entorno da praça entre janeiro e setembro deste ano, ante o mesmo período de 2023.

Além disso, a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) acrescentou que faz “mapeamento nas áreas de maior incidência de crime e contato permanente com comerciantes, moradores e outros órgãos para o desenvolvimento de políticas públicas preventivas alinhadas aos interesses da população”.

Segundo o Radar da Criminalidade do Estadão, que utiliza dados oficiais, foram registrados 136 crimes no entorno da praça em setembro, dos quais 75 furtos de celular e 51 roubos do aparelho. O total representa recuo de 48,1% em relação ao mesmo mês do ano passado.

Como referência, o Conseg Centro tem mencionado a transformação da antes Praça Princesa Isabel em parque – no Campos Elíseos, nas proximidades da Cracolândia, em abril. Também cita o caso do Parque Buenos Aires, em Higienópolis, que passou pela mesma mudança em 1987.

A nova lei do Plano Diretor não inclui a área entre aquelas com transformação preferencial em parque, o que facilitaria a mudança. O recém-anunciado Parque do Bixiga foi incluído nessa lista, por exemplo, após a aprovação de projeto na Câmara Municipal.

Em nota, a Prefeitura destacou que realiza varrição duas vezes por dia, enquanto faz a limpeza do lago, no entorno da creche e no coreto duas vezes na semana. Há ainda, conforme a gestão Ricardo Nunes (MDB), higienização da “praça por completo” uma vez por semana.

“Também são feitos serviços de jardinagem, como o corte mensal de grama, troca de mudas após avaliação de um biólogo e um agrônomo, além das podas de árvores sempre que necessário.” Além disso, afirmou que está na fase de contratação da reforma do lago.

Por que as avaliações têm sido contrárias?

Na avaliação do Núcleo de Projetos, Restauro e Conservação e o Núcleo de Monumentos e Obras Artísticas, da Prefeitura, a alteração da praça “desconfiguraria o histórico do seu surgimento e o seu uso, que perdura por mais de um século”. Também traria “grandes prejuízos” à circulação de pessoas e de acesso à escola municipal e à Secretaria da Educação do Estado (sediada na praça).

Outra avaliação do DPH ressaltou que há um processo em andamento para o início do restauro dos monumentos da praça. “Administrativamente, as praças são geridas pela Secretaria das Subprefeituras e, os parques, pela Secretaria do Verde e Meio Ambiente”, disse.

Apontou ainda que a alteração exigiria previsão orçamentária, visto que os parques precisam ter sede administrativa e condições para a permanência de equipes de vigilância e manejo.

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Já a Divisão de Estudos Ambientais e Planejamento Territorial da Secretaria do Verde concluiu que o cercamento não suprimiria “os problemas de segurança e vulnerabilidade social” do local. Também ressaltou que “os logradouros da praça são espaços livres de acesso à população, indistintamente” e que há posto de policiamento e banheiro público na praça.

Além disso, a equipe fez duas vistorias in loco, nas quais teria constatado “realidade distinta” da descrita pelo Conseg. Também contatou a escola localizada dentro da praça, que teria informado que não costuma ter conflitos ou problemas com a população de rua, usuários de drogas e outras pessoas que circulam pelo entorno.

“Presenciamos crianças da Emei acompanhadas por professoras em visita à área da praça, ao longo dos passeios, o que é atividade feita regularmente”, completou o parecer da equipe. O documento reconhece a presença de moradores de rua no local, inclusive no coreto.

Além disso, mencionou que o cercamento de outros parques, como o Jardim da Luz, resultou na migração dessas pessoas para as calçadas, sem resolver o problema social.

Por que o Conseg quer a transformação em parque?

À Prefeitura, o Conseg Centro argumentou que a praça “deveria funcionar como verdadeiro oásis no meio da mancha urbana de São Paulo” e que, hoje, a população estaria “privada de usar o maior espaço público aberto da região no novo centro”. Também afirma que o local teria sido “abandonado pelos poderes públicos”.

O conselho critica a realização de shows, desfiles de carnaval e manifestações no entorno. Uma das alegações é que resultariam em destruição da vegetação da praça, assim como do calçamento e outros elementos, assim como o barulho perturbaria a fauna nativa. Igualmente descreve o espaço hoje como lugar tratado como “lata de lixo ou banheiro ao ar livre”.

Por isso, defende que “a única alternativa para reverter o grave quadro de degradação” seria a transformação em parque, pois seria “fator inibidor para a entrada de elementos que degradam ou praticam crimes no interior da praça”. “Nenhuma mãe leva seus filhos para passearem na Praça da República”, alega.

Por que a Praça da República é tombada?

Datado do século 19, o local originalmente era chamado de Largo dos Curros. Foi pouso de tropeiros e, também, recebeu touradas e rodeios antes da proibição da prática na cidade, segundo dados da Prefeitura. Além disso, recebeu circos e já se chamou Largo Sete de Abril.

O espaço ganhou o nome de Praça da República, em 1905, após remodelação, quando ganhou características de inspiração europeia, com lagos, coreto e outros elementos. Em 1894, passou a incluir a antiga Escola Normal, atual Secretaria da Educação, também tombada como patrimônio cultural.