20/03/2013 - 21:00
A vida do empresário judeu-ucraniano Natan Kimelblat daria um filme. Em 1942, aos 19 anos ele fugiu de sua terra natal com o irmão mais velho, Izak, depois que soldados nazistas fuzilaram seus pais e seus dois irmãos mais novos. O trauma fez com que os irmãos Kimelblat ingressassem no Exército soviético para lutar contra os alemães, na Segunda Guerra Mundial. Com o fim do conflito, sem nenhum familiar vivo na Ucrânia, a dupla atravessou o Atlântico e aportou no Rio de Janeiro, onde foram acolhidos por parentes de terceiro grau. Aqui, Natan começou a trabalhar como camelô, mas logo descobriu sua verdadeira vocação: desenhar joias. O bom gosto no design das peças e o talento para vendê-las fizeram surgir uma joalheria que leva seu nome e que virou sinônimo de luxo e elegância.
Negócio familiar: Kimelblat dividia a gestão da empresa com os filhos,
entre eles Miriam (à esq.) e Jane
A empresa, fundada em 1956, chegou a faturar mais de R$ 50 milhões e ter uma rede de 12 lojas próprias, onde eram vendidas peças de até R$ 400 mil. Na terça-feira 12, o brilho da grife, que era tocada com seus quatro filhos, se apagou. Submersa em dívidas de R$ 14,5 milhões, a joalheria Natan Kimelblat fechou suas duas últimas lojas, nos shoppings Rio Design Leblon, da zona sul do Rio de Janeiro, e Rio Design Barra, zona oeste da cidade. Foi nas altas rodas de um Rio de Janeiro que vivia a efervescência da bossa nova e que ostentava o status de capital da República, na década de 1950, que o jovem designer de joias se firmou. Começou sua carreira de forma tímida e até mesmo pitoresca.
Portas fechadas: a empresa chegou a ter 12 lojas próprias no Brasil
Frequentemente era visto atravessando a portaria de prédios em endereços exclusivos dos bairros da zona sul carioca carregando joias embrulhadas em papel de pão, numa clara tentativa de não chamar a atenção de ladrões. Uma de suas clientes fiéis era a primeira-dama, dona Sarah, esposa de Juscelino Kubitschek. A lista também incluía socialites do porte de Lily Marinho. No leilão de joias da viúva de Roberto Marinho, o dono da Rede Globo, promovido pela Sotheby’s em 2010, constavam duas peças da marca brasileira: um bracelete com 25 diamantes e um anel com três diamantes, cada um deles estimado na época em R$ 400 mil. O fechamento das últimas lojas marca o início de mais um capítulo na vida do empreendedor que, aos 90 anos e já debilitado fisicamente, busca, agora, investidores interessados em assumir sua marca e, com isso, quitar as dívidas.
Alto quilate: a joalheria carioca era conhecida pela elegância
de toda a sua linha de joias e relógios. Algumas
peças eram avaliadas em até R$ 400 mil
A lista de credores é extensa e inclui bancos, fornecedores, donos de imóveis e ex-funcionários. “Ainda não desistimos de salvar o negócio, mas o pedido de falência não está descartado”, afirma André Alves de Almeida Chame, advogado da Natan Joias. Antes de sair de cena, o velho combatente foi buscar um alívio na recuperação judicial da empresa. Mas não obteve os resultados necessários para evitar o fim. Antes de recorrer à Justiça, Kimelblat chegou a contratar consultorias para salvar o negócio. Uma delas foi a carioca Comatrix, que esteve à frente da operação de janeiro de 2007 a abril de 2010, período em que o faturamento da companhia saltou de R$ 37 milhões para R$ 53 milhões.
“Focamos na tradição da marca e em uma estratégia comercial sólida”, afirma Carlos Vaisman, ex-diretor da Comatrix e atual sócio da consultoria Oficina de Gestão, no Rio de Janeiro. “O problema é que todos os cargos importantes eram ocupados por familiares e havia uma discrepância muito grande de ideias.” Para um empresário que privava da intimidade de Natan, a gestão familiar foi a ruína do negócio. “Os filhos sacavam mais dividendos que a rede conseguia gerar,” disse a fonte que pediu anonimato. “Natan confiou na mística de sua marca e não modernizou a gestão.” Infelizmente, para ele e seus clientes, a mina de ouro e diamantes, decididamente, secou.