Elaborar estudos sobre medicamentos que já existem no mercado é uma prática comum no mundo científico. Além de bilhões de dólares, a tarefa mobiliza um batalhão de cientistas, que invariavelmente tem a missão de desvendar efeitos colaterais e descobrir usos diferentes para um mesmo remédio. Mas esse time de PhDs, com microscópios de última geração e tecnologia de ponta sempre à mão, parece ter eleito a centenária Aspirina como alvo preferencial. O carro-chefe da alemã Bayer já esteve na mira de nada menos que 10 mil estudos até hoje, o que fez dele um dos medicamentos mais pesquisados da história. Sem falar no efeito colateral: a Aspirina, descoberta por acaso em 1897, quando um químico da Bayer procurava aliviar as dores e as inflamações de seu pai, virou uma mina de ouro. O produto ainda é o campeão de vendas do grupo no Brasil e no mundo, com um faturamento global estimado em US$ 625 milhões, algo como 5% da receita da Divisão Saúde da empre-
sa. Por aqui, a efervescência da Aspirina é ainda maior. Representa 17% das vendas da Divisão Saúde, o que significa US$ 25 milhões ao ano, segundo dados do IMS-Health, que audita a indústria farmacêutica no País. É justamente essa potência que acaba de ser colocada em xeque. A revista científica britânica Nature Neuroscience publica este mês um estudo que relaciona o comportamento sexual de ratos e o ácido acetilsalicílico, o princípio ativo da Aspirina. Em fase inicial, a pesquisa mostra uma diminuição suave na libido dos pequenos roedores. Em outras palavras: Aspirina pode diminuir o apetite sexual. Para Bayer, que ironicamente também disputa o bilionário mercado de remédios para impotência com o Levitra, não podia haver notícia pior.

Daniel Wainstein

DE BIASE E SIUMARA, DA BAYER: Executivos não descartam que estudo
tenha ?o dedo? de rivais
A pesquisa da Nature pegou o grupo alemão de surpresa, embora a companhia já tenha, na Alemanha, uma estrutura para lidar com crises ? um departamento bem utilizado no caso Lipobay, o redutor de colesterol que em 2001 matou 52 pessoas nos Estados Unidos e deflagrou um escândalo que custou US$ 1 bilhão para ser contornado. Dessa vez, a Bayer levou uma semana para colher informações e traçar uma estratégia de resposta. Inicialmente, a empresa não descartou a possibilidade de o estudo ter saído da cabeça de companhias rivais. Depois, com o conhecimento do material a ser publicado na Nature, Humberto De Biase, gerente de marketing do laboratório no Brasil, disse: ?A pesquisa ainda é muito primária. Está em fase inicial?. ?São testes pré-clínicos (ainda não envolvem seres humanos)?, endossa Siumara Pancotti, diretora médica.

O balanço dos estudos, no entanto, é positivo para a Aspi-
rina. A partir do início da década de 70, diversos estudos vêm demonstrando que o produto pode ser eficiente no tratamento de Mal de Alzheimer e diabetes, e na prevenção de derrames, câncer de boca e ovário. Para completar, na mesma semana em que apareceu o estudo dos ratinhos sem libido, a Universidade de Columbia, dos EUA, anunciou outro possível uso para o produto da Bayer: ele pode ajudar na pre-
venção do câncer de mama, um mal que pode acometer uma em cada dez mulheres só nos EUA. Estaria aí mais um bilionário mercado para a empresa alemã?

10 bilhões de comprimidos são vendidos por ano, no mundo
NO BRASIL…
…são comercializadas 400 milhões de unidades

US$ 625 milhões é a venda estimada de Aspirina em todo o planeta
NO BRASIL…
o medicamento rende cerca de US$ 25 milhões anualmente

10 mil estudos sobre o remédio já foram realizados
ELE PODE AJUDAR…
Na prevenção de derrames, câncer de boca e de mama