Fundada em 1668, no centro-oeste da Alemanha, a Merck é a mais antiga empresa farmacêutica do mundo ainda em operação. Supera a japonesa e também multicentenária Takeda em 113 anos. Com uma operação tão antiga, que no Brasil já atinge as nove décadas, não era de se estranhar que, nos últimos anos, a companhia parecesse um pouco fora de sintonia com o mercado brasileiro. Quando as grandes multinacionais farmacêuticas buscavam se posicionar no segmento de genéricos, que cresceu a taxas acima de 20% ao ano, entre 2003 e 2011, a Merck parecia estar fora do jogo principal, protagonizado também por laboratórios nacionais, como a EMS e a Euroforma.

A francesa Sanofi-Aventis comprou a fabricante brasileira de genéricos Medley. A americana Pfizer adquiriu a Teuto. Além de marcar a entrada em um mercado de crescimento mais acelerado do que o de medicamentos de marca, esses movimentos representavam também uma forma de compensar o vencimento de patentes bilionárias que afetava todas as grandes empresas globais do setor. Mas, desde então, o encanto pelo setor de genéricos se arrefeceu. A forte disputa no setor fez as margens se tornarem extremamente apertadas, e começou a prejudicar os resultados de quem apostou nos genéricos.

Agora, a moda da vez são os medicamentos biológicos e a Merck resolveu apostar neles. Os biológicos são remédios sofisticados que não possuem composição química possível de ser copiada de forma idêntica por um genérico. No Brasil, 46% das vendas da empresa são relacionadas a essa classe de remédios, na qual possui o Erbitux, para câncer colorretal, de cabeça e pescoço, e o Rebif, para esclerose múltipla. E, num momento em que a economia brasileira dá sinais de fadiga, a empresa promete crescimento. “O Brasil é o pior lugar para quem deseja lucros de curto prazo”, diz o americano Lawrence Ganti, CEO da Merck para a América Latina, desde maio do ano passado.

“Mas é um grande mercado para ganhos de longo prazo, e, junto com EUA e China, faz parte dos nossos mercados de maior potencial de crescimento.” Nos últimos dois anos, a Merck – que fatura US$ 9,3 bilhões globalmente e US$ 400 milhões no Brasil – cresceu 10% ao ano, no País. A meta é manter esse ritmo. “Para isso, precisaremos vender mais com o portfólio atual e trazer novos produtos”, afirma Ganti. “Começaremos também a exportação para outras partes da América Latina, a partir da unidade no Brasil, o que significa que precisamos investir em mais capacidades e em pessoas.”

A força de trabalho local, composta por 1,2 mil pessoas, deve crescer em até 10%, com esse projeto. Ganti assumiu o comando na América Latina exatamente para colocar esse plano em prática. Antes de desembarcar em São Paulo, há dez meses, ele dirigiu as operações na Índia, onde ampliou as vendas em 60%, em três anos. Ganti é um autêntico executivo multicultural. Nascido nos EUA, de pai indiano e mãe chinesa, já viveu em quatro continentes. Com essa experiência, a direção da Merck considerou que seria a pessoa certa para tocar os negócios no Brasil. O foco nos biológicos vai continuar.

Seis novos medicamentos devem chegar ao mercado nos próximos meses. O País também vai se tornar campo de testes clínicos para a parceria que a companhia alemã fechou com a americana Pfizer, para desenvolver, em todo o mundo, remédios biológicos. O grande foco está nos remédios oncológicos, em especial, para tipos de câncer que são menos atendidos pela indústria. Outras áreas que devem receber atenção são as de dispositivos para aplicação de remédios e medicamentos para tratamentos de fertilidade. Ganti avalia que há até 20 remédios da empresa que podem chegar ao mercado brasileiro a partir de 2017.

Mas a iniciativa que deve chamar mais atenção é a parceria para a transferência de tecnologia para a Bionovis, joint venture formada pelas brasileiras EMS, Aché, Hypermarcas e União Química para produzir biossimilares. Essa classe de medicamentos está para os remédios biológicos como os genéricos estão para os medicamentos químicos de marca, e é um campo ainda em desenvolvimento. “Viajamos o mundo todo, visitamos várias empresas e tínhamos várias opções de parcerias”, diz Odnir Finotti, presidente da Bionovis. Segundo ele, o que pesou a favor da Merck foi a experiência em pesquisa de biofármacos de alta complexidade e seu programa de desenvolvimento de novos medicamentos. “Queremos aprender com os mestres”, afirma Finotti.